SO-CORRER


A vida assim eu vejo

Feito o cão que caça um gato

Que corre atrás de um rato

Que quer abocanhar um queijo.

 

A vida também é assim:

eu corro atrás dela

enquanto algo sombrio

corre atrás de mim.

 

É a morte?

Pode até ser

mas nessa correria

nem tenho tempo pra ver

 

se é minha sombra

se é a felicidade

a se oferecer.

 

Com tamanha desdita

a nos atormentar

melhor ser o queijo

que nada tem a procurar.

 

Ou terá?

Teria

se pudesse do rato correr.

 

Corre o queijo do rato

que corre do gato

que corre do cão.

 

Corro da morte

corro da sombra

corro da sorte

 

corre a vida em ilusão.

 

Etelvaldo Vieira de Melo



VERDADE PARA SER LIVRE, SABEDORIA PARA SER FELIZ


A pedido de Percilina Predillecta

Considerando a Liberdade como possibilidade de fazer escolhas, podemos dizer que todo ser humano é livre, uma vez que sempre está fazendo escolhas, tomando decisões. Até mesmo quando deixa nas mãos de outro o poder de decidir, ele está fazendo uma escolha, a de não escolher.

Nesse sentido, a Liberdade é algo inerente à natureza humana, de modo que existir é ser livre. Assim, ela parece mais condenação do que um bem, um castigo que cobra preço elevado: o de sermos culpados, responsáveis sempre por nossas escolhas.

No plano da Política, uma máxima parece dar razão a essa teoria, quando diz que “o povo tem o governo que merece”. Se a classe política é sinônimo de imundície, se os dirigentes são imprestáveis, a culpa em última análise é daqueles que os elegeram.

Em outro sentido, nem toda escolha decorre da Liberdade. É o que se depreende da citação bíblica (João 8:32): “Conhecereis a Verdade, e a Verdade vos libertará”. Assim sendo, “não alcançamos a Liberdade buscando a Liberdade, mas sim a Verdade; a Liberdade não é um fim, mas uma consequência” – no dizer de Leon Tolstói, concordando com o texto bíblico.

Mas o que é a Verdade? Verdade é a ideia que está em conformidade com os fatos, é o certo, correto, exato, autêntico. Sabendo o que é verdadeiro, o indivíduo poderá tomar atitudes conscientes, responsáveis, livres.

Como contraponto à Verdade, temos a Mentira, que é a negação do correto, a falsidade, a trapaça, o engodo, a inverdade.

O conhecimento da Verdade leva, pois, à Liberdade. Pessoas livres são aquelas capazes de dispor de si mesmas, tomar decisões e assumir as consequências de suas atitudes. Elas conhecem, aceitam e sabem conviver com a Verdade. Já aqueles que cultivam a Mentira irão propagar o erro e a falsidade, contribuir para a escravidão (que é a negação da Liberdade). Os regimes totalitários, de escravidão, de ditadura, buscam destruir a essência do viver, que é a Liberdade. Sem Liberdade, as pessoas perdem o espaço da felicidade. Para destruir a Liberdade, procuram sufocar a Verdade.

Ainda em João (14,6), Jesus falou: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”.  É muito reconfortante para aquele que crê ter a convicção de qual Caminho seguir, de qual Verdade abraçar e qual Vida viver. Richard Bach lembra, a propósito: “Quando você chega ao limite de toda luz que conhece, e está a ponto de dar um passo na escuridão, FÉ é saber que uma dessas coisas vai acontecer: vai haver chão, ou você vai ser ensinado voar.”

É essa dimensão de fé que acaba se constituindo uma vantagem do religioso sobre o ateu, que irá se servir tão somente de sua frágil e limitada razão, que nem sempre lhe garante chão ou asas para voar.

Evitando, enquanto possível, os terrenos pantanosos da Metafísica e da Teologia, quis, através deste texto, fazer um confronto entre Verdade e Mentira, mostrando que a Razão (a fé, para o religioso) é que possibilita encontrar a Verdade, que a Liberdade é consequência da Verdade e berço do Amor. Por fim, é o Amor que nos permite viver com Sabedoria (vida com sabor) e é a Sabedoria que nos torna felizes. De modo que não há felicidade sem Sabedoria e não há sabedoria sem Amor. O amor, por sua vez, depende da Liberdade, ela que só é possível através da Verdade. Somos livres na medida em que conhecemos a Verdade, amamos na medida em que somos livres, somos sábios na medida em que amamos, felizes na medida de nossa sabedoria.

Assistimos hoje a um uso sistemático e perverso da Mentira com o propósito de desestabilizar as instituições democráticas do país, instituir o caos e implantar um regime de força, uma ditadura, com as pessoas confinadas em rebanhos. Muitas já vivem assim, em suas bolhas das redes sociais ou nos ‘cercadinhos’ de suas ‘igrejas’.

Sabemos bem como a Mentira é maligna, demoníaca: “uma mentira pode dar seis voltas pelo mundo antes que a verdade tenha tempo de vestir as calças” (Mark Twain); “uma mentira estraga mil verdades” (provérbio africano).

Benjamin Franklin disse que “onde mora a Liberdade, ali está a minha pátria”. Precisamos ter cuidado com aqueles que, usando de mentiras, buscam sufocar a Verdade, amordaçar a Liberdade, esses bens supremos da vida, berços e moradas do Amor, da Sabedoria e da própria Felicidade.

Etelvaldo Vieira de Melo


MOR CANTATA DE VÓ CAMBINDA

 


MOR CANTATA DE VÓ CAMBINDA                                       

 Andamento (

Ao pé das estrelas acesas,

Preta Véia/Guiné-Bissau

desfia esta lenda

pelo céu fiada.

 

As sete filhas de Atlas

- Plêiades vestais -

(menos uma, gorada),

restolham vagas relíquias

pombas-gira, castiçais.

       ) Bridge                                                                          

- Mara maré, Três Marias.

Apolo titã zizania

tal desafio

à irmã:

‘Diana, a frecha aponta.

Uns amantes diamantes olhos,

fecha. E o grão da voz.

Pelágicas asas o albatroz, enfaixa. D’Orion.’

(Chorus

Tu, fraturo amor

- frágua aziago dom -

deste furto ao Caçador

fruto-filho

do deus Poseidon.

) Melisma          

Ai, uiva vovó.

Aiyê, Onilé, feita

das águas emerge:

-  Soçobra, marino escorpião!

Aí, avia-se

 

Aboia, gigante negro andante,

sobre o cimo da onda

Diana, Midas no arco.

Abarca-lhe a traição.

Tange de Pã sonora flauta.

Agasalha na lã tua alta gazela.

Ela e tu ora transmudem-se

âncora,

numa só constelação.

 Da Capo (

GRAÇA RIOS


ATÉ ONDE ATÉ QUANDO


 

Até onde for possível

ao acordar toda manhã

e ver o Sol ou a chuva a cair

quero dar graças pela possibilidade

de viver mais um dia feliz

 

e ao me ver no espelho

quero rir, rir de mim mesmo

que a vida não é de se levar tão a sério

pois há de se ter leveza

até onde for possível.

 

Até onde for possível

quero continuar com minha insensatez

ter medo de bicho assombração

olhar debaixo da cama temendo um ladrão

testar a fechadura da porta um tanto de vez

 

quero me desocupar de coisas demasiado sérias

ter animadas conversas com o cão lá de casa

tomar sorvete sem sentimento de culpa

e abrir a geladeira para pensar o que fazer

 

continuar com essa mania de pensar demais

e agir de menos

viver no mundo da lua

e esquecer das coisas que não deveria

até onde for possível.

 

Até onde for possível

quero ser simples

correr das coisas complicadas

das pessoas frias e arrogantes

cultivar as alegrias do dia a dia

 

quero crer na honestidade

ser autêntico, ser eu mesmo

ter respeito pelo outro

até onde for possível

quero ser livre

até quando for possível.

 

Até onde for possível

quero acreditar no meu país

ter esperança nos políticos e dirigentes

que a prosperidade e a paz venham para todos

e o povo todo possa ser feliz

 

ainda irei acreditar no amor

na possibilidade de amar e de ser amado

sabendo ser ele uma força poderosa

 esperança do mundo novo

até onde for possível.

 

Até onde for possível

isso que faz parte de meu viver

irá um dia acabar, vai desaparecer

e quando esse dia chegar

- eu bem sei –

deixarei de ser possível

já não terei a possibilidade

de tornar tudo possível.

Etelvaldo Vieira de Melo

UM NOVO JEITO DE SER FELIZ


Dizem as más línguas que sou um crítico ferrenho do Capitalismo por puro despeito, por não ter conseguido subir na escala social. Não conseguindo apanhar a uva, arranjei a esfarrapada desculpa de que ela estava bichada.

Tentando resgatar a verdade da História, devo dizer o seguinte:

Quando fui jogado na valeta do mercado da luta pela sobrevivência, por volta dos vinte anos de idade, vi logo que não dava jeito para a coisa, de ganhar o pão com o suor do meu rosto. A redoma em que vivera até então havia castrado todo senso de iniciativa para correr atrás de trabalho. Não tendo uma árvore para parasitar, acabei sobrevivendo à base de ‘bicos’ arranjados por almas piedosas, que se compadeciam de minha penúria.

Lamentando minha desdita para um amigo, ele me dirigiu estas sábias palavras:

- Eleutério, ser pobre e feio (e você é muito feio) não é tão ruim assim não: quando alguém gostar de você é porque gosta mesmo.

Desde então, nas vezes em que pensava no assunto, passei a acreditar que era mesmo um feio fracassado. Dizia para mim mesmo: - A vida é assim mesmo. Num dia, a gente perde; no outro, ganham da gente.

Quando reclamava a falta de dinheiro para algum conhecido, era comum ele dizer:

- Eleutério, dinheiro não é tudo.

Ao que eu respondia:

- Mas eu não quero tudo, só quero dinheiro!

O gosto amargo da pobreza se acentuou, quando tomei conhecimento de algumas considerações de Millôr Fernandes sobre dinheiro e riqueza. Entre outras preciosidades, dizia meu guru intelectual:

- “O dinheiro realmente não é tudo. Tudo é a falta de dinheiro.”

- “Se o dinheiro não traz felicidade, pelo menos não acrescenta à infelicidade a infelicidade de não ter dinheiro.”

- “Sem dinheiro você não tem absolutamente nada. Nem amor você consegue sem dinheiro. E com ele você compra até amor verdadeiro.”

- “O dinheiro compra o cão, o canil e o abanar do rabo.”

- “O dinheiro fala. E também manda calar a boca.”

- “O dinheiro é tudo. Ele é a fonte de todo o bem. Faz dentes mais claros, olho mais azul, amplia a dignidade individual, aumenta a popularidade, produz amor e paz espiritual e, quando tudo falha, paga o psicanalista.”

Tais considerações, vindas de alguém que eu tinha na conta de uma pessoa extraordinária, fizeram minha autoestima abaixar ao extremo e eu passei a viver feito Erasmo, sentado à beira do caminho da vida, sem que nenhum Karnal, Pondé ou Cortella pudesse elevá-la (a autoestima). Até que um dia, pesquisando sobre a origem da citação “nenhum vento ajuda a quem não sabe para que porto velejar”, percebi que havia uma maneira menos dolorosa de ver a vida. Foi quando comecei a me familiarizar com o pensamento de Lucius Annaeus SENECA, humanista, poeta e filósofo romano, que viveu no início da era cristã. São seus os pensamentos abaixo:

- “Para a nossa avareza, o muito é pouco; para a nossa necessidade, o pouco é muito.”

- “O pobre carece de muita coisa, mas o avarento carece de tudo.”

- “Pobre não é aquele que tem pouco, mas antes aquele que muito deseja.”

- “É muito comum acontecer de justamente quem viveu muito ter vivido pouco.”

- “Se vives de acordo com as leis da natureza, nunca serás pobre; se vives de acordo com as opiniões alheias, nunca serás rico.”

Sêneca era um filósofo da Escola chamada Estoicismo, corrente filosófica criada na Grécia no início do século III a/C. O Estoicismo prega que devemos viver de acordo com a natureza, praticar a virtude, ter temperança, com o autocontrole e a firmeza como meios de superar emoções destrutivas.

Ainda segundo o Estoicismo, a vontade pessoal deve se adequar ao mundo, de modo que posso estar “doente e ainda feliz, em perigo e ainda assim feliz, morrendo e ainda assim feliz, no exílio e feliz, na desgraça e feliz”, isso de acordo com as palavras de Epicteto, um dos expoentes dessa filosofia.

Parece que encontrei, finalmente, nesta altura da vida, uma filosofia que, sem cobrar nada, está me ensinando o caminho da felicidade. Como bem diz Epicteto:  "Se devo morrer, morrerei quando chegar a hora. Como, ao que me parece, ainda não é a hora, vou comer porque estou com fome". Adeus, Capitalismo! Adeus, Millôr Fernandes! Vale!

Eleuterius Estoicum Simplicius

Etelvaldo Vieira de Melo


SAGRAÇÃO DA NATUREZA

(De Ígor Stravinsky)

Teci, incerto dia, comentário deveras auspicioso, direcionado ao escritor Etelvaldo Melo, vulgo ‘Meu caro Tico-Tico’.

Ei-lo: ‘Ser original é saber o sabor de quem sabe copiar. Urra!’.

Baseei-me no lema dilema emblema simulacro da mor modernidade literária.

🎵 E daí, e daí?🎶

Daí,

proibiram que eu falasse 🎵 que construo escritos vestindo-os 🎶 lis de lã luminosa mente com o áureo colar da Cecília o boné de Baudelaire o luxurioso broche de lenço lacaniano.

🎶 E daí, e daí?🎵

    Daí, por mais cruel deboche seu, 🎵eu continuo a imitar limitando ampliando a dura letra alheia.

Roubo chavão chave chapéu bordão borda bordado estria estribo estribilho molde modelo elo elã soda solda sova sodad soledad solidez praxe axe axé botão bote bateia batente grota grilo gruta arroto matriz merda motriz mal mel meleca moleque leque pé-de-moça triz atriz meretriz de todo elegante chiante porreta poeta na reta  dândi Y por aí.

🔎 Queira o ferido leitor acessar o Google por ver mirandolendo lento lente

o Art Pop

🎴Andy Warhol. 🈹

Tal posante presente pintor repete à exaustão o retrato de Marilyn Monroe.

Produz lato sensu peidos soluçantes sócio-econômico-intelectuais. Também, advêm orgasmos psico-somáticos múltiplos, sob partos pathos abundantes.

Antecipa fortes tremores tônico-clônicos. Hemoptise, rigidez do corpus são sintomas de estase diante de uma caixa de leite.

Tudo isso apreciaria o amanuense ao penetrar nas nuances da série ‘Latas de Sopa Campbell.’. Andyana. E otras cositas más menos morales: deliciosas bel beldades locus horrendus beliscos pardos obeliscos y sortidos excrementos brancos jumentos 100%.

(O Barroco conhecia o efeito magistral astral imagístico da harmonia ou dessimetria.).

‘Triste Bahia! Ó quão dessemelhante/ Estás e estou do nosso antigo estado/ … / Rica te vejo eu já, tu a mi abundante/ …/’ - de Gregório de Mattos Guerra.

     (Vide Aleijadinho):

‘Ah, cristos sangrantes /madonas gordas / porém, celestes seres.’.

E você, ente assustado?

Ousaria catar, no lixo ou infinito glamour, este clichê cultus vulgaris populalarum?

💽 📣

‘Ninguém é uma ilha’.

(Pilha empilha isso!)

ou

‘Ninguém é feliz sozinho’.

(Pegadinha, Nhazinha!).

Vá!

Desdenhe os códigos de conduta tipificada nos legais latrossignos:

Arrombe force profane estupre destrua os templários cofres da ignorância humana.

Pastiche

Simone Lispector

Conceição Evaristo

Carolina de Jesus.

Parodie subverta roa ria-se adapte, camaleão, 🎶

. sacrílegos dogmas.

. verdades seculares.

. simplórias certezas.

Quem tem medo de criticar os Clássicos:

Wittgenstein

Virginia Woolf

Catão, o Velho

AC Cesar?

(Felidae Felis Catus)  

Bricole remix decomponha o podre indistinto poder.

Levante Bandeira kiss Hortênsia Machado.

Ocupe o não-lugar da inumerável poltrona cinematográfica.

Dance toque arquitete cante com engenho e garra a xerocada paisagem brasileira. Salve!

‘Para quem não sabe que porto almeja, não há vento propício.’

Sêneca se expressou.

🎶

E daí e daí,

👁

Tel flechou a maçã.

Devorou-a, canibal.

Depois,

compôs na pauta

um som melhor

novo pensamento:

‘Nenhum vento ajuda a quem não sabe para que porto velejar.’

🙈🙉🙊🙉🐵🙈🙉🙊

Ulá, lá!

Graça Rios