VIRTUS IN MEDIUM EST

Tenho notado que, além de dores que se distribuem aleatoriamente pelo meu corpo, o tempo tem me proporcionado uma releitura da sabedoria popular, aquela que é traduzida em ditos ou chavões.
            “A virtude está no meio” é uma variante daquela outra, “nem tanto ao mar, nem tanto à terra”.
            Esta máxima foi incutida em minha mente de forma tão subliminar que, muitas vezes, eu não sabia qual atitude tomar diante de uma situação, onde me sentia “num mato sem cachorro”, percebendo que, “se corresse, o bicho ia pegar; se ficasse, ele iria comer”.
          Como sou uma pessoa muito influenciável, não por um defeito de caráter, mas por causa de meu signo zodiacal, acrescentei mais esse à minha coletânea de defeitos: tornei-me um indivíduo muito inseguro.
         Como tenho aquela doença diagnosticada como “prolapso de fim de curso”, essa releitura dos ditos populares talvez seja uma resposta “quae sera tamen”, ainda que tardia, a todos os desaforos que carreguei ao longo da vida.
             Inconscientemente, foi por causa desse “a virtude está no meio” que resolvi construir minha casa a meio caminho entre uma maternidade e um cemitério. Entretanto, tal dito contraria outro de meus estigmas, os ensinamentos religiosos, notadamente a passagem apocalíptica que diz: Porque “és morno e não és nem quente nem frio, vomitar-te-ei da minha boca”.
           Tem razão o vizinho, que sempre diz: “Está complicado!” Está mesmo. Olha o que disse o médico ortopedista, quando acusei um problema no menisco:
            - Vou prescrever algumas seções de fisioterapia. Quanto à hipótese de cirurgia, ela fica descartada, considerando a relação de custo e benefício, devido à sua idade.
              Eu não disse para o doutor, mas registro aqui. Foi por sua culpa que estou deixando o projeto de retornar ao catolicismo: como vou fazer para me ajoelhar, com o menisco estourado como está?
             Com tantos ditos contraditórios, creio que devo ordená-los num somatório, tirar a prova dos nove e chegar à conclusão de que a vida merece ser vivida com atenção, de que é preciso olhar com cuidado cada momento.
         Alguém me disse que, em sua cidade, existem os “maridos de aluguel”, aqueles profissionais que resolvem problemas urgentes que surgem numa moradia: um entupimento, um chuveiro com resistência queimada, uma chave que quebra, a troca de uma lâmpada, e por aí vai. Tudo bem que existam esses profissionais, mas – como disse anteriormente – é preciso ter cuidado ao lidar com essas situações.
   Veja você o que aconteceu com uma senhora que era tida e havida como pessoa séria e compenetrada. Certo dia, um desses maridos de aluguel foi fazer um serviço em sua casa. Como acabou se molhando todo, o marido verdadeiro ofereceu-lhe um short e uma camiseta. Estando ele de costas, o de aluguel, de repente, sentiu-se abraçado por uma mulher, aquela séria e compenetrada, que, levando as mãos até suas partes baixas, apertou-as levemente, enquanto dizia, carinhosa:
                 - De quem são essas duas bolinhas?

 Etelvaldo Vieira de Melo 

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