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Este texto, postado originalmente
em 22/12/2012, deveria estar alinhado em duas colunas, formando contrapontos. Por
problemas de diagramação, tal não foi possível.
Muitas e
muitas vezes, eu questiono se vale a pena a vida do ser humano aqui neste
planeta, se não teria sido melhor tudo ter permanecido como no tempo em que a
Terra era informe e vazia, com as trevas cobrindo o abismo e apenas o Espírito
do Deus pairava sobre as águas. Eu não estaria aqui, neste momento, escrevendo
estas palavras, o relógio não estaria aqui na minha frente, arrastando os
minutos e as horas para o fim, enquanto lá fora, no mundo, uma imensidão de coisas
explode a cada segundo e se derrama em cores e tons por sobre países e
continentes, matando, provocando a destruição e o caos.
Muitas e muitas
vezes, eu me vejo pensando sobre a vida, seu encantamento, sua beleza. Mesmo
entendendo quase nada sobre seu sentido, penso que Deus tinha toda a razão
quando, depois de ter criado as coisas, contemplou sua obra e viu que tudo era
muito bom. Aqui estou, neste momento, escrevendo estas palavras, o relógio está
aqui na minha frente, registrando a passagem do tempo, enquanto que lá fora, no
mundo, a vida explode em cores e sons, sob os reflexos do Sol.
Eu não sei,
mas – às vezes – gostaria de que tudo não passasse de um sonho. Poderia ser um
sonho meu, estando em outra dimensão. Poderia ser até que eu não existisse, não
passasse da fantasia de um sonho de outra pessoa, do próprio Deus, quem sabe,
entediado do próprio poder ou no exercício de suas infinitas habilidades.
É a vida um sonho?
Prefiro entendê-la como um mistério. A aceitação do mistério não significa fechar
as portas do entendimento, decretar o fracasso da razão. Significa reconhecer
que a vida vai sempre mais além da percepção de momento, que há um mundo de
revelações logo ali, após a curva do caminho. Aceitar a dimensão de mistério é
ter a humildade de reconhecer que a vida nos surpreende a cada momento com
novas manifestações de beleza e sentido.
Eu não sei,
mas acho atraente a ideia do vazio, da ausência, do nada. Porque, se tudo fosse
reduzido a nada, a maioria das pessoas estaria ganhando, lucrando. Porque essas
pessoas só levam da vida o prejuízo: dor, sofrimento, lágrimas, decepções,
tristeza, desilusão. Se tudo fosse reduzido a nada, não haveria alguma coisa de
bom, mas também não existiria nada de mau, de ruim, de errado, estaria tudo em
equilíbrio, em paz, em silêncio, na imobilidade do vazio, do nada.
Eu nada sei, já disse
e posso repetir mil vezes. Não tenho a pretensão de ser dono da verdade.
Observo e vejo pessoas que, apesar de tudo conspirar contra, sempre encontram
um motivo para viver, para construir seus sonhos. Para elas, o sofrimento é
fortaleza, meio de eliminar falsas ilusões a fim de alcançar os verdadeiros
objetivos. É preciso tirar essa conotação negativa das dificuldades, pois são
elas que nos ajudam a crescer e a nos tornarmos pessoas melhores.
Eu não sei se
o que está aí e denominamos vida é fantasia, projeção ou realidade verdadeira.
Sei que se trata de manifestação de um princípio só. Parece que as pessoas não
nasceram para compartilhar, respeitar e fazer valer os direitos dos outros.
Elas nasceram marcadas pelo estigma desse pecado original chamado egoísmo. Os
mais injuriados diante dessas palavras são justamente os mais falsos, pois se
escondem atrás da hipocrisia, tentando passar despercebido seu egocentrismo. Se
não, como calar e tapar os olhos diante da perversão do trabalho, da inversão
de valores – onde o ter se sobrepõe ao ser, da demagogia, corrupção, da
exploração dos mais fracos, da fome e falta de moradia, da pobreza e miséria,
tudo isso num quadro de guerra e violência?
Eu não sei se o que
está aí e denominamos vida é fantasia, projeção ou realidade verdadeira.
Poderia ficar lamentando os erros cometidos pelos humanos. Eles estão em todo
lugar, como a lama na terra após um momento de chuva. Eu sei, porque meus olhos
não estão fechados e nem meus ouvidos estão vedados. No entanto, esses erros
são menores, valem menos que os acertos. O ser humano não é, por natureza,
ruim. O seu egoísmo resulta de uma má educação, que pode ser reparada. O amor é
uma força superior, embora seja muitas vezes abafado, como na trágica história
de Orfeu e Eurídice, porque – infelizmente - as coisas ruins conseguem falar
mais alto, aparecem mais. Por isso, quase passa a ser estranho falar do sorriso
de uma criança, da beleza da Natureza, dos cuidados de uma mãe e seu amor
incondicional, dos sonhos que se realizam, das palavras amigas, do perdão, da
beleza de uma pintura ou de uma música, das pessoas que fazem o bem e trabalham
pela Paz.
Enfim, tem
razão o Jó das Escrituras, quando diz: “Por
que não saí num aborto escondido? A vida do homem sobre a Terra é uma guerra. A
minha carne está coberta de podridão e imundície do pó. A minha pele está seca
e enrugada. A minha fortaleza não é como a das pedras. Nem minha carne é de
bronze.”
Enfim, tem razão o
Eclesiastes, quando, refletindo sobre a vida, chega à seguinte resposta e
conselho: “Vai e come teu pão com
alegria, bebe teu vinho com o coração alegre, pois tuas ações já foram há muito
aprovadas por Deus... Tudo que possas fazer, faze com todas as forças.”
Etelvaldo Vieira de Melo
1 comentários:
Acabei de ler seu texto. As referências bíblicas dão-lhe um tom solene, reflexivo. Mas sempre percebemos certa ironia. As repetições iniciais dos parágrafos criam um ritmo interessante. E, no final, com as citações do livro de Jó e do Eclesiastes, permanece a alternância de sofrimento e prazer, tristeza e alegria, matérias primas de nossa existência na Terra.
Paulo Sérgio dos Santos
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