SABEDORIA POPULAR EM TEMPOS DE PANDEMIA

Bahia Notícias cantava há tanto tempo e políticos nunca aprenderam - 31/03/2020
                                                                    Imagem: Bahia Notícias
        
        Penso que os chamados “ditados populares” são uma das maiores heranças culturais da humanidade. Muitos deles se tornam incompreensíveis ao passar dos anos, mas outros parecem ter um valor perene.

Ao transcrever alguns deles, pode ser que você, estimado Leiturino, tenha esta reação:

- Bah! Se conselho fosse bom, ele não seria dado de graça.

Por outro lado, minha esperança é que você seja igual o amigo Jaci, ele que já “bateu a cachuleta” (“esticou a canela”, “subiu no telhado”) já faz algum tempo. Dizia ele:

- Caraca! De graça, aceito até injeção na testa!

Estes ditados e estas citações foram selecionados tendo em vista o estado de confinamento em que grande parte da população está/estava sujeita, em decorrência da pandemia do coronavírus. O que vale aqui é a sabedoria universal acumulada ao longo dos séculos, mesmo para aqueles que já “chutaram o balde”, já “mandaram pra cucuia” esse tal de isolamento.

Cada macaco no seu galho: Esta é uma expressão que se aplica a diversas situações, como a de apelar para um militar não se meter em política. No caso, o apelo é no sentido de que cada pessoa fique no seu galho, ou seja, na sua casa, e que ninguém se atreva a ir pra outro galho e nem passear de moto se exibindo pra outros macacos.

De médico e louco, todo mundo tem um pouco. Tenho lido muitas receitas para essa tal covid-19: chá de cascas de alho, suplementos de vitamina D, uma mistura de mel, açafrão e outras ervas, Ginkgo Biloba, Gengibre, solução feita de prata, óleo de gergelim, chá de abacate com hortelã, chás de boldo e de jambu... Enfim, existe um receituário infindável de medicamentos ditos naturais. A esses se somam as simpatias e rezas bravas.  Nada mais natural do que tanta receita milagrosa, num país onde prevalece a automedicação. Só falta mesmo alguém mandar tomar sopa de capim marandu, misturada com caco de vidro triturado, arame farpado e angu. 

De grão em grão, a galinha enche o papo: É assim que pensa o tal do coronavírus, fiquei sabendo. Ele tem espírito mineiro, de ir comendo pelas beiradas, sabendo que devagar se vai ao longe, que ser apressado é correr o risco de comer cru. Danado.

Há males que vêm para bem: Eu sonho assim, penso que uma nova ordem mundial pode resultar dessa pandemia, com mais respeito ao meio ambiente, com as pessoas vivendo com mais justiça e fraternidade.

Mente vazia, oficina do diabo: Eu não acredito que as pessoas estejam dispondo de tanto tempo assim. Um vizinho, por exemplo, me falou, através de vídeo-chamada: - Eleutério, com essa pandemia, você não faz ideia do corrimento danado que estou passando! Agora, se você anda sem ter o que fazer, é bom recorrer a uma reserva de água benta pra afugentar os capetas, cruz credo!

Não deixe para amanhã aquilo que você pode fazer hoje: No início da pandemia (agora, a gente se acostumou), fomos tomados de ansiedade diante da urgência de ter que arrumar as coisas, face a uma fatalidade (de bater a cachuleta). De minha parte, pensei até na possibilidade de fazer um testamento. Depois, vi que não tinha nada mesmo, e o pouco que dispunha seria facilmente repartido entre os parentes próximos. O único entrave que preciso ainda resolver é o de explicar para as futuras gerações (em documento registrado em cartório) a história nebulosa de minha participação na Ditadura Militar, onde consta que fui denunciante e colaborador. Mas isso será tema de um futuro relato.

Quanto menos pessoas souberem de tua vida, mais feliz tu serás! Penso que o grande afetado pela pandemia foi o sistema capitalista, com os Estados Unidos sendo o país com maior número de pessoas contaminadas (o Brasil vem em segundo lugar, mais por culpa do nosso presidente que cismou: aonde o boi vai, a vaca tem que ir atrás, talkey?).  Com as pessoas ficando em casa, elas acabaram reduzindo drasticamente o consumo de bens supérfluos.

Pensando friamente, ficar confinado traz esta vantagem: você não tem que se expor à aprovação dos outros. Como dizia um filósofo: - O inferno são os outros! Sem eles, você pode ser muito mais feliz.

Aqui se faz, aqui se paga. Não acho isso não, mas, se for verdade, espero que aqueles responsáveis pelas queimadas na Amazônia contraiam todos o novo coronavírus. Depois, espero que sejam tratados pela técnica “ozonioterapia por via retal” e sejam curados. Penso que só assim aquele ministro do Meio Ambiente, um tal de Ricardo Salles, aquele que sugeriu aproveitar, que todos estão concentrados no combate à pandemia de covid-19, para ir “passando a boiada” de mudanças infralegais, só assim ele vai se preocupar com o buraco de ozônio, depois de ter passado pela aplicação de ozônio pelo ânus, essa nova técnica defendida pelo prefeito de Brusque, em Santa Catarina.

- Nunca reclame do que você permite.  Com o confinamento, você teve que conviver com pessoas próximas (marido, esposa, pais, filhos) “ad nauseam”, tendo oportunidade de conhecer tais pessoas até do lado do avesso. Não sei se ainda valem, mas aqui estão alguns conselhos dados pela sabedoria popular. O primeiro, você viu: se não concorda com alguma coisa, não fique calado. Agora, calado é bom nesta situação: - Calado não temos que repetir. Nem que explicar. Já, no dia a dia, é preciso agir com muito cuidado, pois: - Muitas vezes... gentileza gera gente folgada, enquanto que - Uma discussão prolongada significa que ambas as partes estão erradas.

- O difícil, como vocês sabem, não é fácil. Esta frase é de Vicente Matheus, ex-presidente do Corinthians, e está sendo incorporada, agora, aos Ditados Populares. Não, as pessoas nem sempre sabem que o difícil não é fácil. Dizendo: “como vocês sabem”, Matheus está convidando para que façamos um discernimento entre o que é fácil e o que é difícil. Se o difícil fosse fácil, ele não seria difícil; sendo difícil, ele não pode ser fácil. O problema da vida humana é que muitos tomam o fácil como difícil, tornando difícil aquilo que é fácil; de outro modo, outros acreditam que o difícil é fácil, facilitando aquilo que, por natureza, não é fácil, mas difícil. Uma frase, aparentemente simples, esconde toda a complexidade de ser e de não ser. Ela também desvela o cuidado que as pessoas e as autoridades tiveram com o coronavírus: enquanto uns levaram a sério a pandemia, outros julgaram se tratar de uma brincadeira fácil. Oscilando entre o difícil e o fácil, o país se perdeu, quando poderia ter tornado tudo fácil, sabendo que tudo era difícil.

 Finalmente, duas lições que você deve ter aprendido: - Come para viver, não vivas para comer. E, não poderia faltar: - Um mão lava a outra e as duas batem palmas.

Etelvaldo Vieira de Melo

3 comentários:

Geraldo Uzac disse...

Muito bom!Meu amigo Ethelvaldo cada vez mais nos brindando com textos que tratam de forma sutil o cotidiano, mas de forma ética, ou seja, sem citar nomes, no intuito de evitar um futuro processo....

Geraldo Uzac disse...

Complementando: Quando mencionei "sem citar nomes", na realidade eu fiz menção a um famoso Capitão do Exército Tupiniquim.

Geraldo Uzac disse...

Muito bom!Meu amigo Ethelvaldo cada vez mais nos brindando com textos que tratam de forma sutil o cotidiano, mas de forma ética, ou seja, sem citar nomes, no intuito de evitar um futuro processo....

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