PODE TER, MAS TEM QUE SER ESCONDIDO
Já dizia um velho filósofo
do futebol que, no Brasil, o errado é que está certo, enquanto o certo passa
por errado. A propósito, veja bem, você constrói uma casa com todo o carinho,
cuidando de sua estética, rebocando e pintando as paredes, colocando um telhado
decente, finalizando com muro e passeio adequados. Está certo? Erradíssimo,
pois vem a Prefeitura, com sua gana arrecadatória, e taxa sua casa, que você
construiu à custa de tanto sacrifício, com um imposto lá nas alturas. Se ela
ficasse sem reboco e acabamento, com aparência desleixada, a Prefeitura a
estaria isentando das taxas, quiçá incluindo você em um programa social de
ajuda, uma dessas Bolsas que pululam pelo Brasil afora.
Se o país continuar nesse
ritmo, na próxima encarnação, sendo aqui novamente o meu destino, quero
construir uma casa subterrânea, com todo o conforto possível e imaginável. Na
superfície, entretanto, ela terá um arranjo de folhas de zinco. Desse modo,
irei “matar três coelhos com uma pedrada” (isso é força de expressão, pois
nunca, jamais, em tempo algum cometeria tal atrocidade, a de matar um coelho a
pedrada): além de pagar um imposto menos indigesto, estaria, assim, prestando
uma singela homenagem a um clássico da MPB, “Ave Maria do Morro”, de Herivelto
Martins, ao mesmo tempo que iria me prevenir para uma possível hecatombe
nuclear.
Tempos atrás, estava eu em
um ponto de ônibus, quando fui surpreendido por um grupo de pivetes. Um deles
arrancou um relógio que estava no meu pulso e saiu correndo, sendo acompanhado
pelos demais. Quando chegaram do outro lado da rua, um dos meninos falou para
aquele que havia me surrupiado o relógio:
- Cara, esse relógio não
vale nada, é coisa de camelô.
Com ar triste, o ladrãozinho
pegou o dito relógio e o colocou delicadamente no passeio, próximo ao meio-fio.
Olhou para mim, como a dizer: “Pode vir pegar seu relógio, pois vejo que você
está em situação pior que eu.”
As pessoas que estavam
próximas, usando daquela atribuição que eu chamo de “solidariedade mórbida”, vieram me perguntar:
- Roubaram mais alguma
coisa? Machucaram você? Tiraram algum pedaço? Deixaram você sangrando?
Como nada de excepcional
havia acontecido, elas se afastaram, desinteressadas.
Então, atravessei a rua,
peguei o relógio e o coloquei novamente no pulso.
Foi a partir dessa data que
os ladrões me deixaram em paz, eu que já havia sido assaltado por sete vezes. É
que eu me dava certos ares de importância, vestindo roupas um pouco
sofisticadas, embora, no fundo e a bem da verdade, pouco mais valiam que um
tostão furado.
Os ladrões me deixaram em
paz porque passei a usar artigos de terceira categoria. Qualquer meliante (que
palavra exótica!) ao olhar para mim, vai logo pensando: “Esse aí não está com
nada!” Com isso, não melhorei minha situação financeira, mas parei de levar
sustos ao andar pelas ruas da cidade.
Estou dizendo essas coisas
como uma espécie de conselho para aqueles mais abonados e que projetam compras
de artigos de luxo. Olha que já vi jovem sendo morto por causa de um par de tênis!
Tenha tenência, prudência –
para os desavisados, deixa de bobagem. Olha bem onde vai gastar seus milhões.
Existem coisas que você até pode ter, mas elas devem ficar escondidas em casa,
debaixo da cama. Quanto mais ostentação você mostrar, mais riscos de ser
roubado está correndo. Essas são as minhas palavras de sabedoria.
Etelvaldo
Vieira de Melo
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