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ei que este texto irá provocar
a indignação de um analista, amigo meu, e de todos os outros profissionais do
ramo, mas fazer o quê? Entre outros objetivos menores, minha missão aqui é a de
ajudar as pessoas, aliviando-lhes, no que me for possível, as tensões do dia a
dia. Nesse propósito, poderia começar falando da dança como exercício
terapêutico. Quando estava no maior sufoco,
Zorba, o Grego, costumava apelar para a dança. E isso o aliviava. Tenho comigo
que uma das mais belas passagens da literatura mundial é aquela em que Zorba
relata a morte de seu pequeno filho. Diante de sua extrema dor, ele extravasa
todo seu sofrimento dançando diante do corpo do filho. Pode ser que funcione
para você, esse exercício de dança, mas trata-se de uma coisa que não daria
certo para mim. Simplesmente, não sei dançar e não adianta os terapeutas ocupacionais
tomarem meu tempo, dizendo que a dança é um gesto de humildade, que – aquele
que não dança – é um reprimido sexualmente. Fico aborrecido ao ouvir uma coisa
assim, esse tipo de ofensa gratuita. Pode até ser que eu aprenda a dançar,
agora que ganhei outro videogame de presente no dia dos pais. Esse dispõe de um
sensor que lê o movimento corporal enviado pelo jogador. Sei que existem games
de dança e pode ser que eu venha a adquirir um. Só acho esse sensor muito
chato, pois, assim que ligo o videogame, ele pede para que eu lhe abane a mão.
Quando não tem alguém por perto, até que me submeto a essa brincadeira de
retardado mental. O problema é quando existem pessoas nas proximidades: o que
elas vão pensar ao me virem agitando as mãos para uma máquina? Sei que, na vida, a gente tem que engolir muitos
desaforos. Se formos contabilizar, existe pelo menos um a cada dia. Como
engolir desaforo não faz bem, seja para nosso sistema digestivo, seja para
nossa autoestima, seja para o psiquismo, estou repassando a quem interessa, a
custo zero, um tipo de exercício que possibilita descarregar tensões,
frustrações, tropeções e safanões. O invento se chama “terapia do grito”. Não
tem nada a ver com o Grito de Independência proferido por Dom Pedro I. Aliás,
segundo as más línguas, ele estava vivenciando uma situação de emergência,
quando foi notificado das pretensões de Portugal de aumentar a alíquota sobre a
produção de minério do Brasil. Portugal não aprende mesmo; se tivesse um pouco
de atenção para os quebra-quebras aprontados pelos tupiniquins diante do aumento
das tarifas de transporte, teria refreado um pouco sua ganância. Mas, mesmo
assim, a solução empreendida por Pedro não convence até hoje. E tudo por causa
de suas condições físicas de momento. Estaria ele com indisposição intestinal
(uma maneira sutil de dizer dor de barriga)? A questão é saber se ele já tinha
“obrado” (um termo usado por uma senhora que, durante certo tempo, trabalhou em
minha residência). Gritar: “Independência ou Morte”, no aperto, é uma coisa;
aliviado, outra. De qualquer modo, nos dois casos, a Independência fica
comprometida. O Brasil teria se dado melhor caso sua Independência fosse
proclamada num momento de fome de Dom Pedro. A fome provoca raiva, que leva à
luta. Nossa miscigenação étnica e cultural, somada a esses pequenos deslizes,
moldou a índole de um povo tido por muito tempo como pacato, bonzinho. Juntando
o arroz com feijão, tenho um parente que me confessou não estar suportando nem
ele mesmo. Por qualquer contrariedade, lá está ele rosnando para as pessoas,
querendo brigar, xingando até com palavras de baixo calão. (Engraçado esse
termo “baixo calão”. Vou deixar anotado aqui esse adendo para, mais tarde,
consultar o Dr. Google sobre sua origem. Quanto ao significado, não tenho
nenhuma dúvida: quer dizer palavra chula, imprópria, indecente.) Falei pro meu
parente para ele conter seu instinto assassino, moderar seu ímpeto de esganar
as pessoas, relevar as ofensas menores. Já uma amiga experimenta o reverso do
que sente meu parente: diante de uma ofensa qualquer, ela se trava, fica sem
palavras, acaba engolindo o desaforo. E ela se sente muito mal por não
encontrar os termos adequados para dar um revide e nocautear o adversário, jogando-o
na lona. No meu modo de entender o psiquismo humano, considero as duas atitudes
incorretas. O destempero e a passividade promovem mais estragos em quem os
pratica do que em seus alvos. Assim, quero deixar para quem possa interessar um
aplicativo gratuito e que ocupa pouco espaço de memória. A Terapia do Grito é
inspirada naquele famoso grito proferido por Tarzan (Oooooooh!), conforme vídeo
baixo.
Para que não se torne um hábito
desgastante e inócuo, você poderá praticá-lo uma vez por semana. Siga os
procedimentos relacionados a seguir: 1º) Escolha uma moita ou região de
arvoredos próxima de sua residência; 2º) Verifique atentamente se existe alguém
nas proximidades. Em caso afirmativo, espere que a pessoa se afaste; 3º) Inspire
profundamente, batendo com as duas mãos fechadas no peito e solte o grito
(Oooooooh!) (procure alongá-lo de 30 segundos a 1 minuto). O grito deverá
conter toda a carga de raiva e mágoa que esteja carregando. O efeito benéfico
de tal terapia você irá observar logo nas primeiras aplicações.
PS: Caso apareça alguém durante
seu exercício, há o risco de que ele queira interná-lo num hospício. Caso seu
grito chame a macaca Cheeta, se for de seu interesse, poderá lhe explicar que,
além da semelhança gutural, você não tem nada mais a ver com o Tarzan, paixão
de sua vida.
Etelvaldo Vieira de Melo
2 comentários:
Bela sugestão, embora seja difícil a sua execução.
Prof. Marcos Soares
Não se assuste então se eu começar a gritar aqui em casa! Julia
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