FEDOR

Imagem: capricho.abril.com.br
Belô espera este sábado                   
Em grande expectativa.
Latinos vão empenhar-se:
Ô futebol, que motiva!

Chile vem com time vário
O Brasil não está nem aí.
Preferimos que o adversário
Apareça com menos xixi.

A BOLA AINDA ROLA




     
    Nesses tempos bicudos de Copa do Mundo, o mais sensato a fazer seria dar um tempo, colocar na página do blog um dizer, assim:
Se eu fosse dono de um ponto comercial, minha maior alegria seria colocar na porta do estabelecimento aquelas plaquinhas, que eu vejo em filmes americanos e que também pude observar nas lojas do sul do país: Aberto (Open), Fechado (Close), Fechado para almoço (um costume que ainda cultivam lá no sul).

Eu poderia fazer uma coisa assim, se não tivesse a intuição que escrever é como andar de bicicleta: se para de pedalar, você cai no chão. Vai que eu dê um tempo nas postagens e sento relaxado em frente a um aparelho de TV, com uma cerveja de um lado, um prato de petisco do outro. Vai ser uma maravilha. A questão é: e depois? E depois, José, que a festa acabou, o barco da Copa partiu? Vai que não haverá como ajuntar José e Carolina, com o blog indo à falência. Só espero que não surjam ações judiciais para se apossarem dessa massa falida. O que tenho a fazer é resistir enquanto posso, mesmo que os textos deixem a desejar em termos de conteúdo e qualidade técnica.

Falando em técnica, outro dia ouvi o técnico de nossa seleção, quando questionado sobre a qualidade das arbitragens na Copa, dizer que não é sua função se manifestar sobre o assunto, que isso é competência da comissão de arbitragem. Espertinho o cara, não é mesmo? Se o Brasil tivesse sido roubado, como foi a Croácia, estaria ele soltando destemperos verbais. Como foi favorecido, faz boca de siri. Não importa: tem uma máxima no futebol que diz que, ali, uma verdade não dura mais que vinte e quatro horas. Ainda tem muita água para passar debaixo da ponte e ainda vamos ver nosso brilhante técnico soltando os cachorros contra os árbitros (o que ele pode desconsiderar é que eu venha a lhe oferecer o Thor, para engrossar o coro canino com seus latidos).

Como ainda não fui contaminado com o vírus espalhado pela publicidade, tenho pouco conhecimento do que anda rolando pelos gramados e adjacências. Do pouco que chega aos meus olhos e ouvidos, destaco a lição de civilidade da torcida japonesa que, após o jogo, cuidava de recolher o lixo que ela produziu. Isso que é coisa bacana, um exemplo que deveria ser reprisado pelas emissoras de TV e espalhado através de outdoors. Quem sabe, assim, nossos vândalos não se toquem e deixem de lado as depredações e as pichações.

Caso isso ocorra, só por isso, a copa da FIFA terá deixado um grande legado para esse país, “bonito por natureza”, mas que pessoas ignorantes e mal educadas tratam de emporcalhar.

Etelvaldo Vieira de Melo 

TANGO

Imagem: www.portal2014.org.br


O gol quem fez?
O holandês.
De quem é o azar?
Neymar.
Quando é o fim da Copa?
Em Júlio.

Já chega de lero-lero
copa noves fora
zero.

ENQUANTO A BOLA ROLA, A GENTE ENROLA

D
esde que me entendo mais ou menos por gente (tem vez que eu me sinto um ET – daí, o meu nome), houve, primeiro, o Regime Militar, também chamado afetuosamente de Ditadura.

Tinham os militares uma maneira muito especial, restrita de entender as coisas e o mundo. Para eles, não havia o que Kafunga, ex-goleiro e ex-comentarista, chamava de “coré-coré”, era tudo oito ou oitenta. Foi deles que surgiu a máxima “quem não está comigo, está contra mim”.

(A propósito, se Kafunga estivesse comentando os jogos da Copa, haveria de dizer do gol sofrido pelo time russo frente a Coreia do Sul: “Peru! Peru, glu-glu!”  - e do gol de pênalti do Brasil contra a Croácia: “Gol barra suja!”).

Quanto aos militares, eles diziam estar honrando a bandeira, quando, por exemplo, batiam pesado.

- Ai, está doendo! – falava o coitado do preso.

- Não estou fazendo mais que meu dever – retrucava o soldado. – Olha o que está escrito lá no augusto símbolo da pátria: ORDEM!

E mais ele não sabia ou não queria ler. Foi um tempo em que a coisa andou feia pro brasileiro, mais feia que diabo chupando limão.

Depois, apareceu um que era para ser vice, mas que acabou se tornando presidente. Seu susto foi tamanho, que ele vive em estado de choque até hoje. Enquanto presidente, sentia-se mais perdido que cão que caiu do caminhão de mudança. A única coisa que ele fez e que perdurou foi ter mandado imprimir nas notas os dizeres “Deus seja louvado”, julgando estar fazendo suas preces noturnas.

Depois, apareceu um outro, que pensava: “Eu sou eu, o Brasil é meu e o resto é resto”. Pensando assim, voando mais baixo que marreca choca, seu governo durou pouco e ele foi logo abatido.

Depois, apareceu aquele que disse ter colocado o país nos trilhos do progresso. Em suas andanças pelo mundo, recebeu muitos títulos de doutor honoris causa, fato que o deixava mais contente que cão com dois rabos. Foi esse ex-presidente da República quem disse ter destravado o “Progresso” da bandeira nacional, promovendo uma onda de privatizações (algumas más línguas dizem que ele promoveu foi uma onda de privataria).

Sem entrar na questão e muito menos em seu mérito, só sei dizer que, como minha operadora de telefonia celular me possibilita falar grátis (!) para aparelhos com o mesmo código, estou regularmente jogando conversa fora com parentes distantes, com os quais eu falava uma vez na vida e outra na morte, isto é, muito raramente.

Foi um desses parentes, o Atheno, quem me repassou a tabela dos jogos da FIFA de hoje, eu que estou mais por fora e perdido do que cego em labirinto, em se tratando desse campeonato (por enquanto, ainda não fui contaminado pelo vírus espalhado pela publicidade no território nacional). Como esse parente assiste muito à TV, certamente ele foi um dos primeiros infectados. Talvez seja por isso que ele tenha voltado despudoradamente aos tempos de infância, colecionando o álbum de figurinhas da Copa.

Agora, com os jogos em andamento, está se equipando com os apetrechos de torcedor. Uma de suas primeiras aquisições foi uma camisa. Como não estava dando muito crédito à seleção nacional, não quis arriscar seu patrimônio e comprou uma por módicos R$14,99. A vitória do Brasil no primeiro jogo (mesmo contando com a ajuda decisiva do juiz japonês) fez com que ele se enchesse de brios. Foi até o shopping para comprar outra de melhor padrão. Como a oficial estava para mais de R$200, ele não quis jogar de cara ali todas suas fichas, preferindo uma de preço mais em conta, embora – e ele deixou isso bem claro – seja uma marca credenciada pela CBF, e que custou em torno de R$78. Ele me falou (coitada da operadora, não irá falir?), como ia dizendo, ele me falou que irá melhorando seu uniforme, à medida que a seleção avançar na competição. Achei sua estratégia sensata, embora tenha manifestado minha apreensão quanto à sua possível quebradeira.

- Que nada! – falou ele, todo entusiasmado, contando com o ovo ainda não botado, quer dizer... – Na próxima segunda-feira terei a restituição do Imposto de Renda. – E concluiu: - Depois a gente conversa mais, pois o jogo das 13 já está começando.

Então, ele me deixou com o telefone na mão e a boca aberta, que nem burro que comeu urtiga.

Transcrevendo a conversa, lembro-me de ter esse parente se confundido um pouco ao me repassar os jogos do dia, tendo que consultar várias tabelas. Faço uma dedução que ele tenha transformado a sala de sua coleção de corujas em uma central de imprensa. Fiquei deveras preocupado, pois, sem os devidos cuidados, as corujas irão definhar e até morrer. Vai que, ao final da Copa, o Brasil não acaba ganhando o torneio. Esse parente terá uma tripla perda: do título, das corujas e de seu suado dinheirinho. Ele não terá estrutura para tamanho impacto emocional.

Diante disso, não sei mais o que faço, sinto-me mais angustiado que barata de barriga para cima. Não sei se torço para que o Brasil seja logo eliminado, diminuindo as perdas e amenizando o impacto; não sei se entro nessa corrente de pensamento positivo para que o país levante o hexa. Minha esperança maior é que as mais de mil corujas espalhadas pela sala daquele apartamento permaneçam com os olhos bem arregalados, estejam vigilantes e atentas a qualquer ameaça fatal, girando seus pescoços em até 270 graus e usando de suas luminares inteligências na proteção desse parente, ele que mergulhou de forma apaixonada na aventura de um torcedor de futebol.
Etelvaldo Vieira de Melo  



O ASTRO DA COPA

Imagem: coisasdecriancas.com.br

Pegue um menino                                            
qualquer josé
que tenha a cabeça
no lugar do pé.

Dê-lhe uma bola
que então ela rola
faz cabriola
na marola
do olé.

Seja um moleque
de aonde se viu, 
vai tornar-se um herói
e dar no cowboy
de mil.

Pelé ou Mané
se chame esse tal
que dribla direitinho
o hino nacional.

E se acaso a esse crack
a sorte sorriu
vira logo candidato
a Senador
do Brasil.

A COPA NA CAPA

J
á em outra circunstância, comentei o medo de Chico Buarque de Hollanda com o sucesso da televisão. Em música homônima, ele diz que o homem da rua perdeu as companhias, pois as pessoas ficavam em casa, mudas em frente à televisão.
       
Estou comentando isso aqui, no momento em que o país se prepara para ficar em frente à TV, na expectativa das pessoas se esgoelarem feito loucas, acompanhando a trajetória de uma bola, chutada por homens barbados, em direção às redes de um gol. Caso aconteça o dito cujo, é goool, sendo a favor de um time de uniforme verde-amarelo, é bem provável que os complexos sejam liberados e a gritaria se espalhe, acompanhada por estouros de foguetes - Swooish! Fuiiim! Vuum! Zum!
       
Quando a televisão começou a fazer sucesso, era costume, lá na minha terra natal, as pessoas irem para as casas das famílias mais abonadas e se ajeitarem nas salas, frente aos aparelhos de TV, para acompanhar as desditas de Albertinho Limonta em “O Direito de Nascer”, o drama de um médico fugindo da polícia, procurando um homem sem um dedo (ou era um braço?), em “O Fugitivo”, as aventuras de uma série, “Rota 66”, ou o suspense de ver o mundo ser tomado por seres alienígenas, em “Os Invasores”. (Como podem deduzir, dei muito trabalho ao senhor Ubarto, indo todas as noites até sua residência. Esteja onde estiver, quero deixar de público meu agradecimento, Sô Barto, por ter proporcionado um pouco de alegria à infância sofrida de uma criança pobre).
       
As ruas da cidade ficavam desertas; os bares – antes tomados por sinuqueiros – ficavam jogados às moscas, que se aproveitavam ainda mais dos tira-gostos ajeitados nas vitrines; a praça da matriz, antes tomada por rapazes e moças em busca de acertos afetivos, ficava só com seus bancos vazios.
       
A cidade ficava tão deserta que, certa noite, Adegesto Dorico resolveu desfilar nuzinho pelas ruas, sem que uma vivalma viesse incomodá-lo. O que o fez correr adoidado para casa foi um cachorro que cismou atacá-lo.
       
Tantas referências e lembranças vêm a propósito do medo que experimento ao fazer a presente postagem: e se não tiver ninguém para ler, se todos estiverem grudados na TV, hipnotizados por uma bola rolando? Vou me sentir igualzinho ao homem da rua de Chico Buarque, só faltando disparar pelas ruas do bairro, nu feito o Adegesto Dorico!
       
Eu me pergunto, então: por que não aproveitar para destilar meu veneno, falando de coisas das quais não me atrevo por covardia?
       
Não. Vou preparar o tradicional arroz com feijão e mais salada, aquilo que chamamos de trivial simples.
       
Ontem estive assistindo ao pronunciamento da presidente sobre o iminente torneio de futebol que o país irá promover. O que ouvi foi muita desculpa, muito pedido de compreensão e até certa ameaça velada.
       
Todos dizem que não adianta chorar o leite derramado, que não é momento para crítica. Se o mal já está feito, temos mais é de aproveitar o bom que restou (uma ex-prefeita, e parece que atual ministra, haveria de usar outra expressão para dizer a mesma coisa).
       
Não estou aqui para fazer premonição, já que nem mesmo tenho vocação para astrólogo (no máximo, numa partida de futebol entre A e B, poderia prognosticar que A é favorito, mas que B pode surpreender, não sendo de todo impossível um empate). O que sempre fiz foi refletir e re-fletir significa voltar atrás, re-pensar, ver de novo. A reflexão, ao mesmo tempo em que olha o passado, projeta uma luz para o futuro, iluminando o caminho, criando novas alternativas, para que os erros não se repitam.
       
Quando do compromisso firmado de promover uma Copa do Mundo, o que assistimos foi a uma desenfreada corrida:
       
* de políticos megalomaníacos (das esferas federal, estadual e municipal, ou seja, ninguém está isento, todos têm culpa no cartório) em busca de dividendos eleitorais;
       
* de empresários, em busca de lucro fácil e superfaturamento (quem disse isso foi a filha de um ex-presidente da CBF: “O que tinha de ser roubado, já foi”);
       
* de celebridades, querendo mais holofotes;
       
* de dirigentes da FIFA (para quem não se pode pôr a mão no fogo), fixando exigências exorbitantes.
       
O que pode ser alegado é que o país não tem competência para organizar um torneio desse porte. Contra tal alegação, é corrente o ditado que diz “quem não tem competência, que não se estabeleça”.
       
Outra coisa errada foi o número exagerado de sedes, 12, num país de dimensões continentais, com todo um trabalho de infraestrutura a ser montado. A FIFA alega que a escolha das sedes se deu por razões técnicas. Ora, eu vejo que essas mesmas razões técnicas contribuíram para o atraso das obras, o aumento do custo e a herança de “elefantes brancos”, em cidades onde não existe a tradição do futebol. Estava aí uma falha de planejamento, com interesses financeiros e ambições políticas falando mais alto que as reais necessidades e o bom senso.
       
Transparece ao longo dessa novela que a Copa se tornou uma espécie de Casa de Mãe Joana, onde todos põem a mão, mas onde ninguém se responsabiliza por nada. A presidente falou que investigações serão feitas e, em caso de desvios e abusos, os responsáveis serão punidos. A questão é saber se atribuições e responsabilidades foram divididas adequadamente.
       
Poderia falar também da arrogância com que dirigentes da FIFA e a própria imprensa internacional trataram o Brasil e seu povo ao longo desses últimos anos. Os brasileiros se sentiram incomodados diante da arrogância de quem não possui qualidade para servir de exemplo (dói até hoje a indelicadeza daquele dirigente, mandando o Brasil levar um chute na bunda).
       
A bem da verdade, é a FIFA a responsável pela má organização, pelos atrasos e pelas obras inacabadas, enfim, pelas falhas desta Copa. Tudo porque ela exige do país que irá sediar o torneio um padrão, chamado de Padrão FIFA. Ora, se tal padrão é coisa de primeiro mundo, ela deveria ter descartado, por princípio, a pretensão do Brasil, um país de dimensões continentais, com muitas desigualdades regionais e que não pode atender a tanta exigência elitista. Assim como um bom técnico é aquele que sabe aproveitar o material humano em suas mãos, explorando o potencial de cada jogador, sem querer conformá-lo ao seu padrão, assim também a FIFA deveria moldar suas exigências às peculiaridades do país onde ocorrerá o torneio. Creio que, então, muita surpresa agradável iria aparecer.
       
Nesse palavrório todo, uma das falácias mais apontadas é a que o Brasil assinou uma Carta de Intenções. E daí? Todos nós sabemos que de boas intenções até o inferno anda cheio, pois uma coisa é querer e outra coisa é poder fazer.
       
Concluindo, um dos fatores que mais contribuíram para os desacertos na organização da Copa foi, sem dúvida, essa herança histórica de sempre buscar um jeitinho, de deixar para depois de amanhã o que deveria ser feito ontem. Nós sabemos que o COI (Comitê Olímpico Internacional) anda resmungando sobre o andamento das obras para as Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro. As dificuldades são parecidas, embora as Olimpíadas ocorrerão basicamente em uma só cidade, enquanto que a Copa terá doze cidades como sedes. Sendo assim, somando uma coisa com a outra, podemos dizer que, além dos problemas estruturais, a desorganização é uma questão endêmica no país, uma característica de nossa cultura. Se vamos tomar jeito, o tempo dirá. Por enquanto, é bom que as entidades internacionais, que queiram promover eventos por essas bandas, fiquem com as barbas de molho, tomadas de desconfiança. Aqui nós temos um ditado que diz: “Prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém”.
       
No mundo político é costume que as CPIs acabem em “pizza”, já que nenhum parlamentar quer prejudicar seu par, pois leva em consideração que poderá ser ele a próxima vítima. Eu acredito que a Copa da FIFA irá render bons dividendos - financeiros, sobretudo. É que eu vejo movimentando essa máquina grandes corporações, que não iriam dar um tiro no escuro, com o risco de atingir o próprio dedão do pé.
Etelvaldo Vieira de Melo 


RETRATO

como desenhar retratos realistas
Imagem: bocaberta.org/natasha kinaru

Olhei o meu semblante numa fonte,                 
dos anos ele já está cortado.
Se Marília me visse com certeza
outro semblante ameno havia amado.

Minhas mãos não são estas
tão vazias e frias.
Em que espelho terei perdido
o seu esmalte,
onde estão minhas mãos
de ontem às mãos?

Ah, Marília,
não queira o fado triste
pôr abaixo esta face
ainda em riste.

Não era assim o meu cabelo.
As cãs
não se outonizam com dignidade,
nem o corpo caindo
tem cuidados.

Ah, Marília,
não queira o longo inverno
descair nossos sonhos
mais etéreos.

Não era assim o meu gesto
doce mente
eu escrevia versos
lentamente.

Ah, Marília,
não queira o tempo amaro
desfalecer a poesia
sem amparo.

Eu olhei novamente numa fonte
e meu semblante já está cortado.
Ai, Marília,
teu estro canta e chora
o espaço que foi leite
derramado.


PORQUE O POVO ESTÁ GRITANDO

Quando  da criação deste blog, formei o compromisso de tornar este 
espaço um local leve e bem-humorado. Ao longo do tempo, acabei levando alguns escorregões e pisando na bola, especialmente quando o assunto tratado era a política. Nesse caso, não posso me sentir culpado, pois a política no Brasil carece de bom humor, tendendo mais para drama, suspense, ação policial e terror. Até cena aparentemente engraçada, sob o viés político, deixa de sê-lo (uma alusão a um ex-político que produziu uma frase lapidar, "fi-lo porque qui-lo", e jogou o país no caos).

Exemplos engraçados tornam-se dramáticos e horripilantes quando produzidos por políticos.

Vejamos: que tal você constatar que em sua conta bancária foi feito um depósito de R$50 mil? Quer saber quem foi o mecenas, aquele que lhe estendeu a mão, não é mesmo?

Pois um político negou qualquer tipo de conhecimento e de relação com um doleiro, preso pela Polícia Federal, que mantinha, entre seus pertences, comprovantes de depósitos bancários, tendo o referido político como beneficiário.Suas palavras: "Quanto ao Youssef (o doleiro), posso afirmar de modo categórico que não o conheço e jamais mantive com ele qualquer relacionamento de ordem pessoal e política". É pra rir ou pra chorar?

Em abril (24/04/2014), esse mesmo político foi absolvido pelo STF das acusações de peculato, corrupção passiva e falsidade ideológica, supostos crimes ocorridos quando presidente da República (entre 1990 e 1992), sendo que as duas últimas já haviam prescrito. As declarações do presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, falando a jornalistas, dizem tudo: "Isso é um retrato de como funciona a Justiça criminal brasileira. (...) Com tropeços, com mil dificuldades. É isso. Esse caso chegou aqui em 2007, ou seja, passados [quase] 15 anos... vocês é que tirem as suas conclusões". Segundo noticias.uol.com.br, de onde tirei a declaração do presidente, "os crimes teriam acontecido em 1991, segundo a acusação, e levaram 23 anos (!) até serem julgados".

Fechando as referências sobre esse político, gostaria de lembrar que foi ele o responsável por um plano econômico desastrado e que confiscou as poupanças de muitos brasileiros, levando muitos ao suicídio, enquanto outros adquiriram doenças irreversíveis.

Não quero ser inconsequente em afirmar coisas que não possam ser comprovadas, mas o que disse é do domínio público ou me foi repassado por pessoas próximas, vitimadas que foram pelo confisco de suas poupanças.  

E quem diz que não se ensina "Pai Nosso a vigário"? Pois foi isso que aconteceu outro dia mesmo, quando um afoito juiz do Supremo mandou soltar doze presos de uma operação chamada Lava jato. Foi outro juiz de mais baixa patente que o alertou do risco dos doze se exportarem, quais carros de luxo, com os bagageiros recheados de propina. Assim é o Sistema Judiciário, que sabe ser lerdo ou ágil, conforme as conveniências. 

Terminando esta série de exemplos: Num noticiário de TV, um ex-deputado, fundador de um famoso partido, dizia, orgulhoso, que, no início, os militantes tinham que vender buttons para que o partido se sustentasse. Naquele tempo, eles eram os paladinos da moralidade e donos da verdade; depois, apareceram o Poder e um ventilador. E o ventilador foi ligado a uma tomada, estando próximo a toneladas de farofa e outras coisas mais.

Já que o propósito de bom humor foi "pro vinagre", isto é, acabou azedando e tornando o texto um drama, vamos enterrar de vez o assunto, tentando relacionar o que foi dito com as manifestações que espocaram no país a partir de junho de 2013.

A história de nosso país, pelo que se vê, é sempre mal contada, deixando os cidadãos perplexos e desorientados. Para que uma pessoa faça um juízo de valor, é necessário que as informações cheguem a seu conhecimento de maneira ordenada, não na forma desse "samba do crioulo doido" que aparece na imprensa todo dia. 

O país vira uma bagunça quando a coisa pública não é tratada com seriedade e os dirigentes, notadamente os da classe política, não dão exemplo e o devido respeito. 

Essa desordem social, com as pessoas gritando pra tudo quanto é lado, é reflexo e consequência dos maus exemplos repassados. 

Observo que não existe comprometimento com a verdade; cada um quer se safar de supostos delitos atirando pedras, difamando, agredindo aqueles detratores. 

E assim caminha o Brasil. Fica no ar aquela pergunta de Carlos Drummond de Andrade: "E agora, José, pra onde?". 

Minha dor não é perceber que ainda somos os mesmos; o que dói é ter de reconhecer aquilo que sempre me diziam, mas que eu me recusava a aceitar: o poder corrompe, o poder do dinheiro compra consciências, a moralidade vai até onde o dinheiro está.

Está errado quem pensa que estou imprimindo um tom pessimista à minha fala. Se eu fosse pessimista, nem estaria me dando ao trabalho de escrever estas coisas. O otimismo é o propulsor do que estou dizendo; otimismo que chama à responsabilidade de estar junto com aqueles que têm vergonha na cara e se empenham por um Brasil civilizado e desenvolvido.
Etelvaldo Vieira de Melo
Imagem: mural.pt