“O comentário da lei é a eterna malícia“ – Machado de Assis .
Uma coisa que me tira do sério e bole com minha crença no
ser humano é encontrar alguém que não cumpre com a palavra dada.
Não que eu seja uma
pessoa dura, exigente, já que me vejo tão flexível quanto uma vara de marmelo.
Se a pessoa em questão arranja uma desculpa, esfarrapada que seja, eu aceito,
uma, duas, três vezes. Depois disso, coloco ponto final em minhas expectativas
e risco aquela pessoa do rol dos confiáveis.
É frequente encontrar
tais indivíduos no ramo dos prestadores de serviços, notadamente nas famílias
dos “eiros”: pedreiros, carpinteiros, serralheiros, lanterneiros, marceneiros,
bombeiros. Eles não são os únicos, pois poderia nomear outros, como os pintores
e os mecânicos.
Se, entre tais
profissionais, a palavra dada vale pouco, entre outros parece que ela não vale
nada.
Entre esses,
colocaria no rol da fama a categoria dos políticos. São eles que me tiram ainda
mais do sério, abalam meu sistema nervoso.
Uma coisa que um
político faz com a cara lavada e que é a maior sem-vergonhice ocorre em época
de eleições.
Temos, por exemplo, o
caso daquele que se elegeu vereador, prometendo trabalhar em favor da cidade.
Pelo que me consta, o mandato de um vereador é de quatro anos, mas, no segundo,
já está ele em campanha para deputado estadual.
Ele deveria
considerar que ninguém lhe deu o seu voto para meia legislatura. Por uma
questão de consciência, para que honrasse os seus compromissos, deveria
permanecer na vereança por quatro anos.
Quando ele tenta um
voo mais alto, está usando de faca e de queijo para atingir seus interesses,
nunca os de seus eleitores. Ele terá à sua disposição os recursos da máquina
administrativa e, não estando de licença, as benesses e os salários do cargo. Sem
contar o “empurrão” que o suplente de sua vaga estará lhe dando. Caso seja
eleito no pleito estadual, irá ganhar a sorte grande; caso perca, retornará à
função de vereador, julgando ter expandido seu nome junto a outros municípios,
deixando a semente para futuras empreitadas.
Não é à toa que,
desde sempre, estou batendo nesta tecla da necessidade de uma reforma política
e de uma reforma eleitoral. É um absurdo acontecer uma coisa assim em nosso
país.
Agora, se o político
que faz uma jogatina dessa, cospe no prato em que comeu, renega os compromissos
firmados com seus eleitores, até que poderia tomar essa deslavada atitude,
desde que abrisse mão dos salários e das bonificações, renunciando ao cargo
anterior, caso as eleições não lhe sejam favoráveis.
Eu nunca vi um
indivíduo dessa espécie fazer isso. Caso fizesse, pelo menos estaria
demonstrando um pouco de vergonha na cara, sem fazer essa coisa mal feita, essa
“cagada de jacu” – expressão usada pelo povo de Pernambuco e que estou
incorporando ao meu vocabulário.
Nota: Não faço
crítica endereçada a este ou àquele político em particular. Falo de forma generalizada,
já que deixar um mandato pela metade do caminho para ir em busca de outro é uma
prática de “fazer política”. Gostaria de estar enganado neste meu juízo, que
viesse alguém para me contestar, para dizer que estou sendo injusto, que estou
faltando com a verdade. Eu me sentiria reconfortado ao constatar que a política
em nosso país não é tão dramática como imagino. Já a expressão “cagada de jacu”
permite uma releitura: de coisa malfeita, pode se tornar uma coisa boa, como
acontece com alguns cafeicultores do Espírito Santo. É de lá o “Jacu Bird
Coffee”, produzido com sementes retiradas das fezes do jacu, quando esse se
alimenta de frutos maduros de café. Assim, a cagada de jacu rende ótimos
dividendos, com aquele exótico café vendido a preço astronômico. Quem sabe a
analogia não sirva para nosso quadro político e algo de bom (uma reforma) não
saia daí, dessa outra cagada. Esta é a minha esperança.
Etelvaldo Vieira de
Melo
1 comentários:
Excelente e oportuna crõnica. Presencio situações apontadas pelo cronista na cidade onde resido . Sentia-me incomodado, sem entender o por quê. Obrigado pelas dicas.
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