As palavras têm o encanto da
magia, das surpresas, do mistério. Quando num texto, elas estão ali, falando
uma coisa; de repente, como num caleidoscópio, elas passam a falar coisas bem
diferentes.
Estou desnorteado com a morte
súbita e, aparentemente, absurda e sem sentido de um grande amigo, o Cleber.
Nossa amizade foi construída há pouco, numa fase de nossas vidas em que já não
abrimos mão da sinceridade. Por isso, apesar de tão recente, com pouco mais de
dois anos, ela se mostrava inabalável frente aos tempos e aos contratempos dos
acontecimentos.
Não vou me alongar descrevendo
a percepção que fazia de sua pessoa. Ele está por inteiro nas páginas de seu
blog (uma de suas paixões): wwwcleber2010.blogspot.com, nos seus dois livros
(“Ceci e Chico Sete-Boias & Outros Casos”, “Contos, Encontros e &
Reencontros”) e no Facebook, enquanto suas falas não forem deletadas.
Não vou me alongar, mesmo
porque ele sempre implicava com meu jeito de descrever as coisas, com as ideias
perdidas no meio de textos longos e enrolados. Apesar dessa sua crítica, sei
que ele gostava do que eu escrevia, tudo porque eram textos carregados de
humor. E uma das coisas que o Cleber cultivava era o humor, o bom humor,
principalmente quando temperado com pitadas de saudáveis ironia e malícia.
A bem da verdade, o Cleber era
terrível, dentro de sua pequena estatura física, com seus olhos curiosos por
detrás das fortes lentes dos óculos, acompanhados de um sorriso constante.
Era uma pessoa sincera. Quando
fui submetido a uma angioplastia e ele foi me visitar no hospital, quis saber
se eu tivera mesmo um infarto, se não estava enrolando, como fazia com os
textos.
Cleber tinha um grande
coração. O cuidado com que realizava suas pesquisas para as postagens do blog
tinha um único propósito: ser útil às pessoas, trazendo-lhes textos que possibilitassem
uma melhor percepção da vida.
De vez em quando, nossos
pontos de vista entravam em colisão, quando um ou outro falava sobre o sentido
da vida ou questões de religiosidade. Eu sempre fiquei com as perguntas, quando
eram esses os assuntos; Cleber tinha opinião formada.
Assim, numa de suas últimas
postagens, no dia 04/04/2015, ele transcreveu o depoimento de um físico inglês,
Stephen Hawking, falando que a crença na vida após a morte é uma fantasia
incutida na mente das pessoas pelas religiões, para reconfortá-las.
Neste dia, postei um
comentário no blog, dizendo que concordava com Stephen quando ele dizia: “Não tenho medo da morte, mas não tenho
pressa em morrer “; no entanto, confessei não haver entendido a declaração
de que o sentido da vida estaria em “procurar
os maiores valores de nossas próprias ações”. Cleber, em resposta, disse
que haveríamos de discutir o assunto.
Estou dizendo isto lembrando o
que documentei no início do texto: o encantamento, a magia e o mistério das
palavras, elas que também ajudam a extravasar sentimentos reprimidos, aliviar o
vazio de uma perda, as dores do coração.
Creio que esta foi a última
postagem gerenciada por ele mesmo, aquela em que falava da morte e da vida após
a morte. Quem haveria de imaginar que, nem uma semana depois, estaria ele,
Cleber, de partida? Por que ele não levou a sério as palavras de que “não tenho
pressa em morrer”?
Na capa de seu blog, há fortes
indícios do que pensava da vida. Lá está escrito: “Me desculpem amigos, não tenho tempo a perder. Vivo e deixo quem quiser
viver. Viver é correr perigo, a vida está por um triz. Tenho tempo só pra ser feliz”.
Hoje, Cleber, segunda-feira,
13 de abril, fazendo uma caminhada por um parque da cidade, cruzei com várias
pessoas: havia um rapaz equipado com monitor cardíaco, havia dois senhores
conversando animadamente, tinha um outro falando ao telefone, passei até mesmo
por uma senhora com um rosário na mão. Vi ali, Cleber, uma simbologia da vida,
onde todos caminham procurando aquilo que você dizia: a felicidade. Numa certa
altura da trilha, o sol cortava a sombra das árvores formando uma clareira.
Aquela luz me revelou alguma coisa, de que a vida pode fazer sentido, não
importando a maneira como cada um caminha (você, por exemplo, acreditava que o
sentido da vida estava nos nossos próprios atos). Confesso que estou um pouco
atrasado com isso, mas caminho com a esperança.
Você foi embora, Cleber. Que
as pessoas que partilharam de sua convivência tenham aprendido pelo menos um
pouco de suas lições de vida. Acho que assim o mundo pode se tornar um pouco
mais colorido de alegria, honestidade, sinceridade e amor.
Adeus, grande amigo, fico lhe
devendo uma barra de chocolate suíço.
Etelvaldo
1 comentários:
As pessoas se vão levando um pouco de nós e deixando uma eterna saudade dos valores embutidos em suas ações e na forma que demonstram de se impor a vida.
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