|
Imagem: manualdohomemmoderno.com.br |
Ia
dizer que já estou “careca” de saber que as palavras são perigosas. Não o faço
porque as pessoas já estão “carecas” de saber disso, e também porque seria uma
ofensa gratuita para com uma categoria de pessoa, a dos “carecas”, que sofre
discriminação a vida inteira, tudo por causa da perda de míseros fios de
cabelo.
Crianças
e adolescentes receberam, nos últimos anos, a armadura protetora de uma
expressão importada, bullying, que funciona como espécie de água benta a
exorcizar a sanha de agressores físicos e verbais. E os carecas, pobres coitados,
que não podem contar com nenhuma espécie de proteção, como acontece com aqueles
com o seu Órgão de Proteção para a Infância e a Adolescência? Com tantos
cabides de emprego, nunca seria demais criar mais um, a Secretaria de Defesa
dos Carecas e Afins (SEDECA).
É
preciso considerar, no entanto, que não estou aqui para fazer, de momento,
campanha política em favor de determinada categoria. Resvalei no assunto quando
mencionava o perigo das palavras.
Embora
vá tratar de tema delicado, não pretendo “dourar a pílula”, temporizar com uma
espécie que sofre com uma doença chamada “depressão”.
Para
evitar mal-entendidos, vamos colocar pingos nos “is” e os acentos em assentos,
já que a maioria deles vive no ar ou dependurado. Para que não transpareça um
pingo de dúvida de que eu esteja trilhando os trilhos da chamada autoajuda,
desde já encaminho os interessados/necessitados para os especialistas. O que
você vai ler a seguir é tão somente o depoimento de alguém que se interessa
pelo assunto, e quer, de alguma maneira, ajudar aqueles que se sentem acometidos
por esse mal.
Pra início de conversa, é importante precisar
os conceitos. O que é a depressão?
Evidentemente,
não estou me referindo a um acidente geográfico, nem a um fenômeno econômico
ocorrido nos Estados Unidos e que foi denominado de “A Grande Depressão”.
Grosso modo, depressão é uma espécie de tristeza que, por sua vez, é encontrada
no quadro dos desconfortos. Os desconfortos podem ser de natureza física,
neurológica ou psíquica. Pode também aparecer em forma de análise combinatória
(exemplos: um desconforto neuro-psíquico, um outro físico-neuro-psíquico). No
quadro dos desconfortos psíquicos, a tristeza tem vários parentes, como a ira,
a ansiedade, o medo. Ela também se apresenta com várias gradações, de leve,
moderada a intensa.
A
melancolia é título de um filme e uma espécie de tristeza peculiar. Ela é essencialmente
feminina e crepuscular. Raramente você vê um homem tomado de melancolia, quase
impossível ela aparecer ao raiar do sol. É assim como vampiros, que odeiam
raios solares, ou a fêmea do mosquito aedes aegypti, que só tem hábitos diurnos
de ferroar as pessoas. A melancolia é feminina porque é uma tristeza sem muita
lógica, sem explicação, cujos fundamentos racionais são imperceptíveis.
Já a
depressão é uma tristeza de gradação intensa. Quando entra em depressão, o
indivíduo tem a sensação de estar atingindo o fundo do poço, estar num mato sem
cachorro ou se sente num túnel sem saída. A depressão é, portanto, de caráter
mais filosófico, mexendo e remexendo naquelas questões básicas que,
inconscientemente, incomodam o ser humano: - Qual o sentido da vida? Quanto
mais eu penso e procuro entender, mais eu vejo que tudo não passa de ilusão,
que tudo é uma merda – mais ou menos assim chega a pensar o deprimido, em
geral, indivíduo de arguta inteligência. Ele/ela não se contenta com meias verdades,
não se submete ao “engana, que eu gosto”.
É
por tudo isso, embora eu não tenha falado quase nada, que a depressão é tão
intensamente triste, algo que deixa aqueles-que-querem-prestar-uma- ajuda com
as mãos e os pés amarrados. O que é que eu posso fazer? – perguntam. – E a
resposta, amarga: Nada, ou quase nada!
Pensando
sobre o tema, vejo como palavras de entonações próximas, de sentidos opostos,
muitas vezes acabam esbarrando umas nas outras. Assim, um astuto pode se tornar
estulto, um esperto pode vir a se tornar um tolo. Isso ocorre com uma pessoa
tomada de depressão.
Quer
saber por que ela, de inteligente, acaba se tornando tola? Porque, no fundo e a
bem da verdade – como haveria de dizer um amigo – a vida é essa coisa sem sentido
mesmo, viver é esse permanente trocar de uma ilusão por outra, bem fazem aqueles
que aceitam a máxima do “engana, que eu gosto”. Eles, que estão errados, acabam
ficando certos.
Maiakovski
dizia que morrer é fácil, difícil é viver. Está bem, embora enterrar também
seja difícil (descobri esses dias, indo ao velório de um conhecido, com tanto
dinheiro sendo despendido). Mais recentemente, descobri que casar é dificílimo –
mas isso vai entrar em outras considerações.
Você
acha que não estou dizendo coisa com coisa? Pois vou complicar ainda mais:
creio que a vida não está aí pra ser levada tão a sério. É preciso tratá-la com
bom humor, rir das coisas, das pessoas e – principalmente – rir da gente mesmo.
Porque, no fundo, tudo é bobagem, tudo é futilidade.
Precisamos
de boias salva-vidas? Não tem problema; uma ilusão aqui e outra ali não fazem
mal algum. Quem sabe, entre umas e outras, podemos encontrar algo duradouro e
até definitivo? Um compositor já dizia que no fim do mundo tem um tesouro...
Pode ser que tenha mesmo, pode ser que não tenha nada.
Eu
quis brincar sobre o tema, tratá-lo de maneira amena. Respeitando sua seriedade,
sem querer ridicularizá-lo, pois não sou daqueles que consideram que pimenta
nos olhos dos outros seja colírio.
Lembro
também que existem medicamentos apropriados para tratamento da depressão, assim
como existem profissionais habilitados no ramo. Eles certamente serão de grande
valia para aqueles que atravessam momentos de crise.
De
minha parte, só quero deixar a consideração de que a vida não deve ser levada
tão a sério, que não faz mal recorrer, de vez em quando, ao uso de muletas. Como
não disse o Livro do Eclesiastes, em sua reflexão sobre a vida: Bobeira das bobeiras,
tudo não passa de uma grande bobagem!
Etelvaldo Vieira de Melo