MITO OU VERDADE?

Post - Almoço no Caraça
Imagem: sumidoiro.wordpress.com
Quando me veio (veio do verbo vir) a ideia de falar sobre este tema, enquanto refogava e quase afogava o arroz pro almoço do dia, tive também a clara percepção de que tal tema interessaria pouco, muito pouco, quase nada à maioria de meus eventuais leitores, maioria essa que existe mais no plano de minha imaginação do que na realidade de fato. No entanto, uma terceira ideia me ocorreu: o compromisso que firmei ao longo dos últimos anos foi o de resgatar a verdade dos fatos para análise e entendimento das gerações futuras. Nada é mais mutável do que a História, disse-o Napoleão? Pois que ele veja com quantos paus se faz uma canoa. Estou aqui, no alto de minha insignificância, mostrando que, para fazer a História, é preciso matar o pau e mostrar a cobra!
Outro ponto que corrobora (a língua portuguesa é incrível) minha tese tem a ver não com um possível descrédito para com sua opinião, estimado, iniludível leitor. Prezo-a em profusão (sua opinião), mas prezo ainda mais a verdade. Não foi aquele gregoriano quem disse “Amicus Plato, sed magis amica veritas”? Pois, então, vamos resgatar a verdade pros anais da História.
O tema em questão é: mito ou realidade? – quase havia me esquecido. Especificando: nos meus tempos de adolescência, anos que há muito se passaram, era corrente a versão de que se usava um pozinho em sucos e nos leites (fornecidos, os leites, pela Aliança para o Progresso – acordo de ajuda e de exploração entre Brazil e USA), com o objetivo de reprimir, os pós, a libido dos seminaristas, aqueles estudantes para padres. Todos sabem ou deveriam saber que, na adolescência, há uma explosão hormonal. João Mohama, sexólogo e escritor, dizia que era devido à produção da testosterona. Resumindo: é uma época de pensamentos estranhos, libidinosos (olha o português aí), sonhos eróticos e lençóis molhados (João Mohama esclarece: poluções noturnas).
Afinal, retomando o fio da meada, quase a ponto de arrebentar: usavam-se ou não os famosos pozinhos?
Procurei um amigo da época, ex-seminarista, para prestar o esclarecimento devido. Seu nome, para efeitos legais, permanece anônimo, e não vai ser nenhuma condução coercitiva que me forçará a nomeá-lo. No entanto, para facilitar a narrativa, vamos dizer que ele se chama Antônio Doroteia da Luz.
Doroteia diz que o tal pozinho é mito, boato. Não garante que seja 100% boato, pois considera a possibilidade de que existiu e de que sua data de validade estivesse vencida. Como todo ex-seminarista, não consegue discorrer á vontade sobre esse tema de sexo, fica vermelho feito pimentão maduro e se enrola com as palavras (para preservar a originalidade de sua declaração, vou usar dos recursos gráficos dos três pontinhos (...) e do asterisco (*), quando tiver de usar termos relativos a sexo).
Doroteia garante: - No meu tempo de Seminário, havia muito “troca-troca”, alguns colegas davam mais do que galinhas no cio. Como dormíamos em dormitórios, durante muito tempo, minha cama ficava ao lado da de um colega, Antônio Silvestre, que, toda noite, invariavelmente, se ajeitava sob os lençóis (como se estivesse armando um circo) e batia uma (*). Só faltava mesmo um serviço de alto-falante percorrer as fileiras de camas, anunciando: Hoje tem espetáculo? Tem, sim senhor! Eu ficava muito irritado, pois, querendo dormir, tinha que ouvir durante certo tempo um nhec-nhec-nhec.
            - Bom – falei, procurando dar um desfecho para seu depoimento, sem ter que levar meu amigo pra República de Curitiba, nem querendo abusar em demasia da paciência dos leitores. – Quer dizer, então, que a teoria do pozinho é lenda.
            - Como já falei, não tenho absoluta certeza para afirmar isso. Agora, é preciso considerar que existiam outros tipos de pressão, às vezes, de poder até mais coercitivo.
            - Como assim?
            - Ideias religiosas eram incutidas em nossas mentes, associadas a culpa, pecado, inferno, castigo eterno. Enquanto almoçávamos, talvez tomando sucos com aqueles famosos pozinhos, ouvíamos leituras “edificantes”, leituras que nos deixavam com “a pulga atrás da orelha”, ou estarrecidos, ou sujeitos a pesadelos. Uma das tais leituras dizia que, só pelo pensamento, um homem é capaz de engravidar uma mulher. Estou exagerando, mas o relato dizia que uma determinada mulher se engravidou, estando apenas deitada ao lado de um homem. Eles não tiveram (...). Fiquei pensando: Nossa! Eu não sabia que (*) podia sair voando! Esse danado é perigoso mesmo!
Outra leitura deixou na minha cabeça o sentimento de ser um verme desprezível. Um seminarista lia, enquanto nós outros “forrávamos o estômago”: Um santo mártir estava amarrado num poste, com as mãos às costas e completamente nu. Uma mulher, linda e também completamente nua, foi colocada à sua frente. Enquanto ouvia a narrativa, errei por diversas vezes o garfo em direção à boca; quando acertava, chegava a engasgar, pois engolia sem mastigar. E agora? – pensei, angustiado. – Vai o santo perder a virgindade? Comecei a torcer, vendo a narrativa caminhar perigosamente para a pornografia pura. Que nada! Quando a mulher foi se insinuando em direção ao santo, ele mordeu violentamente a própria língua e cuspiu um pedaço ensanguentado no rosto daquela enviada de Satanás! Ao final da leitura, pude notar em muitos colegas um olhar de beatitude, mas em outros o que havia era indisfarçável sentimento de frustração.
Etelvaldo Vieira de Melo

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