QUANDO EXPLODE O PALAVRÃO (Fundamentos Teóricos Da Disseminação Do Palavrão Na Sociedade Brasileira)

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Imagem: maringapost.com.br

O palavrão é assim chamado não pelo tamanho (ele pode ser pequenininho), mas por ser ofensivo e feio, já que mexe com a moral e, frequentemente, com a sexualidade. Quando é feio demais, é tido também como cabeludo.
O palavrão não frequentava o cotidiano das pessoas, era usado com parcimônia, já que seu conteúdo é explosivo, de consequências imprevisíveis. Isso até surgir aquela operação chamada Lava Jato (Lava PaTo, seria melhor dizer). Ouso afirmar que a proliferação do palavrão no país é uma consequência da Lava Jato e seus vazamentos.
Como não sou de acusar e condenar baseado em suposições, vou arrolar uma série de razões que fundamentam minha tese. Ao final, quero ver você dizer se estou mentindo, se tudo que afirmo não passa de absoluta verdade.
No início, os vazamentos da Lava Jato eram seletivos, pois pretendiam colocar “lenha na fogueira”, inflamar os ânimos de parcela da classe média raivosa, fornecer subsídios para denúncias da chamada “grande” imprensa e abrir caminho para ações do Judiciário e do Congresso.
Os vazamentos logo deixaram de ser seletivos, não por vontade do meritíssimo e dos procuradores que respondiam pela operação, mas em decorrência de extrema pressão (leia-se: denúncias de corrupção), fazendo a mangueira espirrar para quase todos os lados. Só não espirou pros lados do PSDB porque juízes e promotores cuidaram de tapar os buracos com os dedos (eu me pergunto: aonde foi parar a delação do “fim do mundo” da Odebrecht, aquela que deixava todo mundo morrendo de medo?). Lá em São Paulo, por exemplo, tem um afrodescendente que, se jogasse noutro time, teria provocado um enorme número de prisões.
Mas não estou aqui, agora, para fazer esse tipo de acusação. Só quero observar que, com o vazamento, passamos a ouvir gravações de políticos e afins reclamando de propinas. O vocabulário desses, na intimidade, revelou-se  uma coisa horrorosa, cheia de palavrões. Como exemplo, veja a compilação que fiz de uma fala de determinado político:
- P*, fala praquele fdp* arrumar o dinheiro logo, senão eu vou f* com ele. C*!
Depois que essas gravações se espalharam qual tiririca (não estou me referindo ao palhaço, mas a uma planta da família das ciperáceas), todo mundo passou a se achar no direito de também soltar suas baboseiras. Conclusão daí: os jornais e as redes sociais ficaram entupidos de palavrões, cada qual mais cabeludo. Estou inventando?
Quem mais se achou no direito de aproveitar da situação foi a extrema direita. Ela, que vivia no armário até a eclosão do golpe de 2016, acabou se sentindo livre e solta para falar do jeito que era capaz: com truculência, agressividade, cinismo, e vocabulário pobre. Também pudera. Se formos arrolar suas lideranças, quem haveremos de encontrar? Uma delas, por nada, atuava como ator de filme pornô.
Quero dizer, e este é o sentido de minha tese, que a atuação da Lava Jato, especialmente quando espalhou as gravações, tornou possível juntar “a fome com a vontade de comer” de uma parcela significativa da população brasileira. O Brasil se tornou um país impróprio para menores de 16 anos. Onde está o Conselho de Censura para afastar nossas crianças e adolescentes de tanto vocabulário chulo?
Confesso que me sinto incomodado, pois não gosto de pronunciar e de ouvir palavrões. Com orgulho, ainda carrego comigo muito de inocência. Este texto, além de refletir sobre o que está aí, também é uma forma de protesto contra o vocabulário que as pessoas empregam.
O tempo de vida me pedia um texto leve, solto, bem-humorado. Isso não foi possível, pois acabei me dando conta de que vivemos um momento perigoso: o Brasil está montado sobre uma farsa, com mentiras sendo plantadas e espalhadas irresponsavelmente. As pessoas não se dão conta de avaliar as consequências de palavras mal ditas, já que nem querem saber da verdade. O pior de tudo é que, por trás da onda de palavrões, está algo mais explosivo: o ódio. A pergunta que fica é: até onde ele poderá nos levar?

Etelvaldo Vieira de Melo

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