SER JOVEM, SER VELHO

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Quando estudante, ouvi certo professor dizer:
- Jovem é aquele que caminha com as ideias; velho é aquele que se estrutura. Neste sentido, ser “jovem” ou ser “velho” não é uma questão de idade, mas de disposição de vida.
E arrematava o mestre:
- Numa tendência natural, acontece das pessoas mais velhas se estruturarem. Só amamos o que construímos; portanto, é compreensível um idoso se estruturar em defesa daquilo que construiu. Afinal, trata-se de seu patrimônio, seja ele financeiro, psicológico ou moral.
A Filosofia, não enquanto corpo doutrinário mas disposição de vida, é, essencialmente, jovem. Melhor dizendo: ela é infantil, porque brota do espanto, do encantamento, da curiosidade, da vontade de saber.
Com o tempo, essa admiração vai se desfazendo, e nos tornamos pretensiosos, julgando que já sabemos de tudo. É nesse processo que nos tornamos “velhos”, nos estruturamos. E é justamente aí que mora o perigo.
Então, é assim: as pessoas se estruturam em defesa do que elas construíram e do que elas são. Qualquer ameaça a essa estrutura torna-se algo perigoso e que deve ser combatido.
Isto que estou falando é facilmente verificável quando analisamos a questão da ideologia.
Iniciamos 2018 sob intensa guerra ideológica, que se arrasta por dois anos, com a perspectiva do quadro ir se agravando cada vez mais.
Nessa guerra, e porque se trata justamente de uma guerra, razão e busca da verdade são deixadas de lado para aflorarem as armas de defesa e de ataque. Então, passa a valer tudo (alusão à música “Vale Tudo”, de Tim Maia), já que as partes envolvidas quase sempre acreditam na máxima de que os fins justificam os meios.
Numa análise maniqueísta e muito simplista, temos, de um lado, os “demônios” e, de outro, temos os “santos".
Estes termos, “demônios” e “santos”, não configuram os tipos ideológicos. Sendo assim, o demônio é tão somente aquele que tem uma postura cínica; santo é aquele descrito como dogmático. Numa ordem natural, acontece dos cínicos tenderem mais para a ‘direita’, enquanto os dogmáticos ficam mais à ‘esquerda’. Mas isso não ocorre necessariamente. O que destaco é que o comportamento do cínico é destrutivo, corrosivo. Em geral, não sabe argumentar; logo apela para a ofensa, a agressão. Já os dogmáticos se escondem por detrás de uma fé inabalável em verdades incontestáveis, seus dogmas.
Num confronto de agressões entre essas partes, estabelece-se, então, o que chamamos “diálogo de surdos”: ninguém ouve ninguém, ninguém dá razão a ninguém, todo mundo quer impor seu ponto de vista.
Entretanto, entre essas partes, surge por vezes aquele que podemos chamar de irônico. Enquanto cínicos e dogmáticos se fecham em suas posições, o irônico busca, através do diálogo, uma aproximação com a verdade. Isso porque a Ironia é dialógica, como tão bem a empregou Sócrates em sua Maiêutica. Ela não é corrosiva como o cinismo, nem sectária, como é próprio do dogmático. O bom da ironia é que não teme a verdade, vai atrás dela, esteja onde estiver. (É bom notar que o irônico se serve e pode ser encontrado com frequência em textos de humor.)
Esta análise nos mostra que muito pouco se salva dessa guerra ideológica que vivemos hoje. Vivemos um conflito de “gente velha” em defesa de estruturas. Como ninguém reconhece os próprios erros, acabam as pessoas se apegando a pedaços de verdade e se arvorando como donas da verdade inteira.
O Brasil se tornou um país “velho”, está tomado de velhice: velho é o judiciário, velhíssima é a política, caindo de velhos estão as classes dos empresários e dos banqueiros (embora eu desconfie de que esses serão sempre velhos); velhos são os “demônios” e os “santos”, os “cínicos” e os “dogmáticos” em seus diálogos de surdos – eles que tanto aparecem nas redes sociais.
Para quebrar tanta caduquice, pessoas “jovens” estão fazendo falta, muita falta.
Etelvaldo Vieira de Melo

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