Nem
sempre me tem sido possível atender ao propósito de levar a vida com leveza e
bom humor. Às vezes, por causa de minha condição de brasileiro, de estatura
mediana, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior,
chego a pensar ser de todo impossível atender a tal intenção. Nos últimos
tempos, por exemplo, tenho tratado, você sabe, estimado Leiturino, de temas bem
sombrios, tudo por conta das eleições que aconteceram no país. Por sua culpa,
queimei muitos neurônios, tive muitas gastrites e fiz não sei quantas
inimizades.
Agora,
tudo acabou, a poeira começa a assentar e meu coração volta a bater
compassadamente. Antes, porém, de retornar ao sonhado estado soft, preciso
fazer um rescaldo do que aconteceu e das lições que aprendi com tudo. Contudo,
será coisa rápida, assim espero.
Alguém
disse, suponho que tenha sido Einstein, que o ateu leva desvantagem em
comparação com o crente na questão de vida após a morte. Se ela não existe,
teremos empate, pois nenhum poderá cobrar vitória; agora, se ele existir, a
vida após a morte, o crente estará ganhando, pois apostou nisso.
De
maneira semelhante, estou me sentindo com relação às eleições próximas
passadas. Perdi, mas estou com um sentimento de vitória. Se tivesse ganho, o
outro lado iria jogar nas minhas costas um tanto de responsabilidade: por
exemplo, se alguém tivesse uma gripezinha qualquer, logo seria incriminado; se
o cachorrinho da madame amanhecesse com dor de barriga, ela iria até a TV e seu
Jornal Continental esbravejar ser eu culpado.
Agora,
não, posso respirar aliviado. Mas sei que nem tanto, porque o outro lado se
acostumou a dizer que sou responsável por tudo de errado que acontece no país,
se acostumou a me ver como bode expiatório. Ontem mesmo, durante o discurso –
inteligente e sensato – de meu candidato derrotado, logo já vieram as más
línguas dizer que ele deveria ter sido mais comedido, proclamando seu sentimento
de profundo amor para com o vitorioso. É querer demais, não é mesmo?
Vamos
navegar no terreno das hipóteses, projetando o que possa acontecer com o novo
governante. Vamos, imaginar, primeiro, que ele, conhecido como “O Mito”, faça
um bom governo. Levando em conta que se sabe muito pouco de suas propostas,
tirando os aspectos morais (“Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”),
podemos levantar algumas hipóteses do que seja um bom governo.
Para
mim, um bom governo significa: respeito à democracia e às liberdades; atenção,
cuidado e promoção daqueles menos favorecidos, os pobres; respeito com as ditas
minorias e com as mulheres; empenho em defender a soberania nacional,
promovendo um crescimento sustentável, de preservação e de respeito ao meio
ambiente, com o brasileiro, em geral, tendo condições de vida decentes, com
acesso à educação e à saúde. Se o mito atender a isso, terei cometido um erro
de avaliação, darei “o braço a torcer”. Não haverá de minha parte má vontade,
pois não sou dos que apostam no “quanto pior, melhor”. Será com alegria que
enviarei mensagens para meus desafetos, parabenizando-os pelo acerto de
votação. Se as condições financeiras permitirem, poderei mandar construir um
banco, com uma placa alusiva, para ser instalado numa das praças do bairro, com
dizeres em homenagem ao, agora, meu mito (os termos podem ser esses: “Ao Mito: nossa eterna gratidão”).
Pelos
outros lados, fica difícil dizer o que seria um “bom governo”.
Pergunto:
- O que é um bom governo para os milicianos bolsonaristas, muitos deles,
declarados fascistas? (Logo após o resultado das eleições, um deles quis saber:
“Já está liberado para matar petistas, negros, gays e baianos?”.) – O que é um
bom governo para o “Mercado”, ele que, afinal, dita as regras da economia e dos
negócios? – O que é um bom governo para os antipetistas, que preferiram uma
aposta no escuro, com risco de ver naufragar a democracia? – O que é um bom
governo para evangélicos e religiosos, seduzidos pela cantinela nem sempre
honesta de seus pastores e líderes?
Um bom
governo pode ser vários. Se ele respeita a democracia e não atropela a
Constituição, devemos acatá-lo, pois é fruto da decisão de uma maioria. Ao fim,
haverá sempre alguém rindo e batendo palmas, mesmo que a maioria fique chorando
e rangendo os dentes.
Ao fim
deste texto, construído mais em cima de perguntas e de suposições do que de
respostas e de verdades assentadas, quero dizer que tenho medo, muito medo, um
enorme medo, que só não é maior do que um sonho, o sonho de um futuro feliz
para minha pátria-mãe, o Brasil.
Etelvaldo Vieira de Melo
4 comentários:
Ótimo texto!!!
Agora é aguardar e ter esperança!!!
Abraço,tio querido!
O povo Brasileiro escolheu por mudança vejo principalmente aqui em Minas onde deputados atuantes e que mereciam ser eleitos não foram!Assim aconteceu com Governador e Presidente !
O povo Brasileiro escolheu por mudança vejo principalmente aqui em Minas onde deputados atuantes e que mereciam ser eleitos não foram!Assim aconteceu com Governador e Presidente !
Otimo texto. Compartilho com as suas preocupações quanto ao futuro do Brasil. Sobre a aposta é melhor pensar positivo.
Percebi que quando você supoos que foi Einstein que escreveu sobre a aposta, na verdade trata-se de Blaise Pascal. Parabéns!
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