A temporada do ludopédio começa timidamente e não poderia ser diferente.Estão de volta, portanto, as expressões lugar comum, proferidas pelos narradores do rádio, da TV e a turma da mídia impressa. Enfim, é o Brasil.
Ivani Cunha
A temporada do ludopédio começa timidamente e não poderia ser diferente.Estão de volta, portanto, as expressões lugar comum, proferidas pelos narradores do rádio, da TV e a turma da mídia impressa. Enfim, é o Brasil.
Ivani Cunha
Entre
nuvens, voa suave o elefante
abanando
suas grandes orelhas
de lá
para cá, de cá para lá
(como
se estivesse a remar)
🐘
Entre
nuvens, voa delicado o elefante
movendo
suas enormes patas
para
frente e para trás, para trás e para frente
(como
se estivesse a nadar)
🐘
Entre
nuvens, voa sutil o elefante
torcendo
seu engraçado rabo
ora
pra direita, ora pra esquerda
(como
se estivesse a sinalizar)
🐘
Entre
nuvens, voa atento o elefante
balançando
seu enrugado nariz
para
cima e para baixo, para baixo e para cima
(como
se estivesse a farejar)
🐘
O que
faz o elefante tão cedo entre as nuvens?
Não vê
que o sol nem bem acordou ainda?
Por
que balança o nariz, torce o rabo
Move
as patas, abana as orelhas?
🐘
O elefante
suave
delicado
sutil
e
atento
voa
voa em busca da flor de gnaus
aquela
que sobre um floco de nuvem
acaba
de nascer.
Imagem: YouTube |
Imagem: YouTube |
Não é que
ele fosse uma pessoa extremamente corajosa, mas seu índice girava em torno de
85%, uma marca muito boa para quem morava em cidade em que as casas ainda eram
aluminadas por lamparinas abastecidas a querosene.
Certa
tarde, em que os últimos raios de sol se escondiam no horizonte e as primeiras
sombras da noite começavam a se espalhar pelo céu cinzento, estava ele
caminhando por uma trilha em meio a um cerrado quando, vindo de certa distância
à frente, pareceu ouvir um barulho assim:
- Toc,
toc, toc, toc. Xiii...
Achou que
era barulho de vento nas árvores da redondeza, seguiu tranquilo.
Poucos
passos à frente, o ruído se repetiu, agora de maneira irrecusável:
- Toc,
toc, toc, toc. Xiii...
Suas
pernas começaram a tremer, o coração disparou e ele, instintivamente e motivado
pelos 15% de covardia, começou a correr em sentido contrário ao som. No
entanto, 20 metros adiante, retomando a coragem, pensou, enquanto se benzia com
o Sinal da Cruz:
- Não
posso fugir desse jeito, como uma criança que teme assombração. Preciso saber o
que é isso.
Assim
pensando, retomou o caminho e, passo a passo, foi se aproximando daquele
barulho estranho:
- Toc,
toc, toc, toc. Xiii...
O ruído
foi aumentando cada vez mais, enquanto que o coração parecia não mais caber
dentro do peito.
- Toc,
toc, toc, toc. Xiii...
Foi aí que
avistou o lago, logo após a curva da trilha. Uma árvore estava tombada à sua
margem, com tronco e galhos boiando na água.
Forçando a
vista, avistou um pica-pau sobre o tronco. E lá estava ele a bicar:
toc-toc-toc-toc. Depois, enfiava o bico na água: Xiii...
Quem me contou
esse caso foi um vizinho, o Tonho da Flô. Tendo ele a tendência de exagerar as
coisas, pode ser que seja invenção sua ou que a história não é bem assim. Mas
isso não importa.
Estou me
lembrando dele, quando tento compreender certas coisas que acontecem na vida da
gente.
A vida
moderna, não só através da luz elétrica, conseguiu banalizar e jogar no
ridículo os mistérios que se escondiam na natureza. Tempos atrás, quando o
relógio na igreja tocava as badaladas da meia-noite, o mundo da normalidade ia
dormir para que reinasse o da fantasia e do mistério, cheio de suspense e
assombrações.
Viver é fazer confronto com o mistério,
que, em última análise, não passa de uma verdade adormecida. Aceitar o
mistério, isto é: não se dispor a acordar a verdade, pode representar o que um
filósofo chama de “salto da absurdidade” (“salto no escuro”), que vem a ser a
disposição de fé, expressão da religiosidade. Aí está implícito o risco do
fanatismo, uma vez que quanto menos a pessoa compreende uma coisa mais tende a
acreditar nela.
No plano psicológico, muitas vezes não
queremos confrontar o mistério porque ele nos assusta, porque ainda estamos no
tempo da lamparina a querosene em nossas dimensões psicológica e emocional.
Somos dominados pelo medo de correr riscos, de enfrentar o desconhecido;
preferimos fugir, porque a fuga nos dá uma fugaz sensação de tranquilidade. Por
isso não amadurecemos, porque não corremos riscos. Mas a tranquilidade é apenas
um sentimento passageiro, porque a fuga é filha do medo de enfrentar os
desafios da vida e mãe do mais vil dos sentimentos, a covardia (“covarde”: do
francês “couard”, “de cauda abaixada” – desistir da luta, estar com medo, não
ter coragem para enfrentar a situação).
De tudo, fica a ideia de que VIVER
requer coragem para enfrentar os desafios. Os desafios quase nunca escondem
lobisomens e assombrações; pelo contrário, na maioria das vezes, o que você
descortina logo após a curva do caminho é um lindo pássaro, pousado sobre o
galho de uma árvore, e uma flor, juntos a um regato de águas cristalinas.
Etelvaldo Vieira de Melo
Imagem: imagensanimadas.com |