Em
pago de sofrer tantas durezas,
Indago
ao longe amigo aonde anda, assim, silente.
Por mor surpresa, ouço-lhe poesia digna de Camões.
- Fico calado /
porque a chuva
impede-me escutar /
o revoar dos pássaros. /
Sou um deles, /
escondido /
sob trovões e relâmpagos.
Devolvo-lhe,
ora embora ousada, seu próprio pensar:
- Também apresento-me/ Condor,
/ frágil ave / debaixo da tormenta.
Quase me alongo
em entrelaces vãos: A pandemia, o confinamento, a máscara.
Sentimental, lhe dou um antigo coração feito ninho consolador.
E visto
vivamente o lume vivo luso, copio-lhe alguns versos.
“O
tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía”.
Muito prosa, tento a glosa:
Onde,
o verde manto? / Onde, a neve fria? / A penas,
/ bem te vejo, / apenas/ vil mudança. Desencanto silvestre: Que procuras,
ausente? Suspiras magoado. És acidente em si tão concertado? Pinta-me teu segredo delicado. Cronos, deus do
tempo, converte
em choro mil acalantos.
- Homens,
mulheres, crianças: Onde, o chão? Revoada de pássaros? Somente virtuais. Molde espanto,
ternura ainda existe. Ferida, temerosa, oculta, a musa insiste:
- Ei,
filho, neta, amante, namorada! Podes assistir-me (lato sensu) as iras, abrindo
a câmera? Viste? Cortei os cabelos. Sinto-me diferente: Homem de negócios, versejando
ao vento. Coberto, eu? Em termos: É o ar condicionado. Ai, tua imagem parece
muda. Semblante verde. Perdoa-me a doce branda lágrima. Este sozinho coração
sem ninho acolhe Dor. - Espanto-me, vovó, titia,
amigo, irmão, a cada dia. Queria falar melhor, mas tal manto cobre-nos a face,
a voz. Não posso sentir-te tanto já,
como soía. A tempestade, os trovões, os relâmpagos passados, atuais... Eu me
escondo neste peito além de ti.
E a
saudade, afora.
A SAUDADE?
Eu
cantarei de amor tão docemente,
Por uns termos em si tão concertados,
Que dois mil acidentes namorados
Faça sentir ao peito que não sente.
Farei que amor a todos avivente,
Pintando mil segredos delicados.
Brandas iras, suspiros magoados:
Temerosa ousadia e pena.
Fora, ausenta-te!
Nota:
Parafraseando, a autora busca alguma possível graça no lírico Luís Vaz de
Camões. Geralmente, em sua escritura,
ausenta-se qualquer título.
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