ISSO NÃO ESTÁ CERTO

1987. Durante os preparativos para as disputas dos Jogos Panamericanos de Indianápolis nos Estados Unidos, a delegação brasileira fica hospedada numa pequena cidade próxima à cidade-sede. Naqueles jogos, o time de basquete do Brasil ganha a medalha de ouro, derrotando os donos da casa, os Estados Unidos, por 120 X 115, um feito histórico. Foi “a primeira vez que a seleção norte-americana masculina de basquete perdeu um jogo em casa, a primeira vez que foi derrotada em finais e a primeira vez que sofreu mais de cem pontos diante de seus torcedores” (Wikipédia). A soberba dos americanos era tanta que os organizadores dos jogos nem dispunham da gravação do hino brasileiro para ser tocado na hora da premiação.

Acompanhando o noticiário sobre os jogos, um detalhe me chama logo a atenção: o enorme gasto que a prefeitura da cidadezinha onde o Brasil está hospedado tem com a segurança, quando comparado com o dispendido com educação e saúde.

Penso comigo: - Isso está certo, essa inversão de prioridades? Depois, considero que o capitalismo nos Estados Unidos pode permitir esse tipo de coisas, os cuidados com saúde e educação ficando por conta da iniciativa privada.

Mais depois, penso: - Será que o Brasil não vai caminhar para isso, os gastos com segurança “engolindo” quase toda a verba do orçamento?

1988. Com Oscar Schmidt, Marcel e companhia ainda saboreando o título de campeões dos jogos de Indianápolis, temos Jair Bolsonaro indo para a reserva do Exército, depois de ali “ter prestado serviço” por 12 anos. Neste ano, também dá início à sua brilhante carreira política, primeiro como vereador no Rio de janeiro e, logo depois, como deputado federal. Gostou tanto que logo tratou de iniciar os filhos, o 01, o 02 e o 03, na carreira, dentro da máxima “o que é bom para mim, também é para os meus filhos”.

2019. Eleito presidente da República, Bolsonaro – a exemplo do que acontece na Venezuela, que militarizou o governo – procura se cercar de militares da reserva e da ativa, empregando-os em postos variados. Com isso, tais militares veem seus saldos bancários engordarem, com seus soldos mais que dobrando. E eu pergunto pra mim mesmo: - Isso está certo?

2022. Leio no jornal Folha de São Paulo, 26/12/2021, reportagem cuja manchete é: 

DEFESA GASTA VERBA DA COVID PARA COMPRAR FILÉ MIGNON E PICANHA, DIZ TCU."

O subtítulo diz: “Pasta gasta R$535 mil com itens de luxo”.

A reportagem detalha, segundo dados do TCU (Tribunal de Contas da União): Em 2020, parte do dinheiro usado para compra de itens não essenciais foi obtida da ação orçamentária “21CO – Enfrentamento da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional decorrente do coronavírus”. Ou seja, trocando em miúdos: recursos destinados ao combate à pandemia covid-19 foram usados indevidamente para aquisição de itens não essenciais, sendo o Ministério da Defesa responsável por 96% dos recursos dispendidos (R$535 mil), utilizados para compra de filé mignon, picanha, bacalhau, salmão, camarão e bebidas alcóolicas. Enquanto isso, milhares de pessoas morriam infectadas pelo vírus...

Sem entrar em detalhes, a reportagem termina, mostrando um quadro com os gastos governamentais com alimentação no período de 2017 a 2021:

Ministério da Defesa: 4 bilhões

Ministério da Educação: 2 bilhões

Ministério as Saúde: 567 milhões.

Tirando por base o que esses três ministérios gastam só com o item “alimentação”, acredito que aquela pergunta que eu fazia em 1987 já foi suficientemente respondida: assistimos hoje a uma total inversão de prioridades e valores, com investimentos em aparelhos (digestivos) de segurança lá nas alturas, enquanto educação e saúde ficam jogadas às traças.

Coitados do Brasil e seu povo!

Colocando uma cereja neste bolo noticioso: Segundo leitor, em “Comentários” (não será fake news?), um militar próximo a Bolsonaro disse: “No fundo, estamos pensando no povo, quanto mais picanha e filé mignon comermos, mais bois são mortos e desossados. Logo, mais ossos estarão sobrando para a população se fartar.”

Definitivamente, isso não está certo.

Nota: Para quem acha ruim o que estou falando, é só fazer o que é certo. Aí, não vou dizer que não está certo.

Etelvaldo Vieira de Melo

 


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