CONCERTO EM CONSERTO


Imagem: Pinterest / Lubart Gallery / Orchestra

Às vezes, penso que tudo seria ótimo se a humanidade funcionasse feito uma orquestra, onde cada pessoa estivesse em seu local apropriado, tocando o instrumento para o qual teria habilidade. A música resultante daí seria maravilhosa, com os seres humanos em convívio harmonioso entre si e com os demais seres da natureza.

Isso seria possível? Acredito que sim, através da conjunção de três fatores: Justiça, Direito e Educação.

Na minha concepção, justiça é cada um ter o que lhe é de direito. O direito natural, por sua vez, depende da igualdade de condições, igualdade proporcionada por uma educação universal e inclusiva.

Como salta aos olhos, não temos uma justiça, um direito e uma educação nesses termos. Daí, vivermos numa sociedade extremamente injusta, onde o Direito atende aos interesses dos poderosos, e a Educação forma os quadros da elite, reforçando a marginalização dos menos favorecidos.

Essa desarmonia social vai desencadear tudo de ruim a que assistimos: uma disparidade cada vez maior entre ricos e pobres, uma onda cada vez mais crescente de guerras e de violência, uma depredação estúpida da própria Natureza.

É nesse contexto que surgem figuras ridículas e perigosas a tomarem o Poder, enquanto aqueles mais capacitados são colocados à margem. Na nossa analogia com uma orquestra, seria como um tocador de bombardino querer o papel de regente.

A fábula abaixo mostra como é danoso um indivíduo querer ocupar uma função para a qual não tem competência e vocação.


Certa vez, o rabo de uma cobra cismou que ele, sim, é quem deveria conduzir o ofídio, em vez de ser a cabeça. Ele se sentia cansado de ser jogado de cá para lá, sem poder decidir pra onde ir.  Às vezes, estava se deslocando tranquilo em reta quando, num repente, era empurrado para a esquerda; em outras, fazia bonito uma curva à direita e, sem mais e sem menos, era puxado pro centro. – Assim não dá – ele pensou; já não aguento mais! - Na condição de rabo, sobrava pra ele o restolho, tendo muitas vezes de só comer poeira. Dirigindo, pensou, posso escolher outras coisas para comer, além de sapos; posso, por exemplo, saborear um leite condensado ou um espetinho de camarão. – Os outros membros disseram que seu desejo era uma temeridade: por acaso tinha ele cabeça e olhos? tinha como se colocar à frente? Não houve meios de convencê-lo, e o bom senso foi derrotado. Assim, recorrendo a ameaças, superstições e muita mentira, assumiu o rabo o comando, passando a dirigir o corpo inteiro. Às cegas, andando para trás, foram trombando em tudo, até que acabaram caindo num precipício coberto de espinhos. A cobra foi toda ferida. Foi a partir daí que a cobra começou a fazer um barulho, como se estivesse balançando um chocalho, quando de verdade o barulho vinha da tornozeleira dependurada no pescoço do rabo.

Moral: Assim acontece, quando pessoas inabilitadas e impróprias assumem o governo de um país. Querem dirigir a orquestra, quando suas habilidades são para tocar tamborim; querem ser cabeça, quando deveriam se conformar com a condição de rabo.

Etelvaldo Vieira de Melo


3 comentários:

Luly disse...

Brilhante Etelvaldo!
E só saberemos escolher as melhores cabeças!
Para isso, a EDUCAÇÃO deve nos mostrar como funciona todo o corpo da cobra!
Por isso que os ricos, os dominantes dominam todo o sistema educacional como o sistema educacional e toda a mídia!
É com trabalhos como o seu que, aos poucos vamos furar essa bolha!

Anônimo disse...

Excelente texto. Um teto para ser lido, compartilhado e estudado. Parabéns, Etevaldo.

Anônimo disse...

Fiz o comentário acima: “Excelente texto…e não me identifiquei: Mauro Passos.

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