Encontrei esta frase no meio de um texto de estudo.
A primeira ideia que me veio à cabeça foi: onde já se viu bicar um amor? O
pica-pau, no máximo, poderia se permitir dar umas bicotas, nunca bicadas no seu
objeto de afeto.
Depois, conjecturei: e se o amor do pica-pau for
uma árvore? Tomado de ansiedade, ele se põe a bicar, tanto e com tal furor, que
acaba quebrando o bico.
Neste caso, também reprovo sua conduta. Não sabia
ele que a pressa é inimiga da perfeição?
Por acaso, a escola da vida não lhe ensinou que, quem tudo quer, tudo perde?
E se a árvore em questão fosse daquelas de madeira
bem dura, que quebram brocas e só são perfuradas por pregos de aço?
Sendo assim, também estaria em desacordo com o
pica-pau. A gente não pode ir com muita
sede ao pote, pois cuidado e caldo de
galinha nunca fazem mal a alguém.
Mas, afinal, por que o pica-pau bica a madeira da
árvore? Talvez o pica-pau em questão tivesse pressa em arranjar um ninho, com
sua amada em estado avançado para gestação de uns ovos.
Também esta hipótese é possível, pode ser que a
frase esteja mal construída, com o autor se esquecendo de um termo. Talvez a
frase correta seja: “Pica-pau quebra o bico de tanto bicar por seu amor”.
Deste modo, eu não iria fazer nenhum reparo, a não
ser lamentar o terrível acidente que pode lhe trazer sequelas para o resto da
vida.
Existe também a possibilidade de que o pica-pau
bica o tronco da árvore em busca de lagartos e insetos que se escondem em seu
miolo.
Neste caso, teria o pica-pau minha reprovação. Será
que ele é tão infantil que não se dá conta de que o apressado come cru ou queima a língua?
Estou vendo que uma simples frase, como tudo na
vida, permite infindáveis leituras. Com este exemplo, eu poderia me alongar
indefinidamente, levantando hipóteses, tentando entender as razões que levam um
pica-pau a quebrar seu bico. E a lição que tiro daí é que nunca devemos nos
precipitar nos juízos de valor. Sem mais nem menos, eu não posso ficar dizendo
que uma coisa está certa ou está errada. A realidade pode ser bem diferente daquilo
que imaginamos.
Sobre este tema mesmo, estou agora recordando, eu
li em algum lugar que o pica-pau bica a madeira... com a língua, que é
extremamente dura. Sendo esse comentário verdadeiro, o autor da frase estaria
construindo uma figura literária, usando de uma simbologia? Neste caso, qual
seria seu propósito, sua intenção?
Pode também ser que estivesse fazendo uma
brincadeira com seus leitores.
Outra possibilidade é a de que tenha sido infeliz
e, por ignorância, acabou usando uma imagem despropositada.
Estou aqui, mais uma vez, perdido em meio a
explicações para o simples fato de um pica-pau ter quebrado seu bico.
Explicações que podem me levar a um caminho sem volta, chegando ao ponto de desmerecer
um pica-pau que quebra seu bico ao bicar seu amor. Um gesto que, afinal, pode
ter pode ter sido um acidente de trabalho, mas que também pode ter um sentido
poético, ou romântico. Ou erótico, sei lá.
PS: Para não ser tachado de mineiro, que gosta de
ficar em cima do muro, deixo minha explicação definitiva: O pica-pau, de nome
Petrônio, estava dormindo numa serralheria e sonhava com sua amada, a Berenice.
Durante o sono, trocavam longos e apaixonados beijos. Pela manhã, ao acordar, Petrônio
viu que estava abraçado a uma barra de ferro e, pior, no chão estavam pedaços
de seu bico. Pode parecer estranho, mas foi esta a explicação mais lógica que
consegui encontrar.
Etelvaldo
Vieira de Melo
2 comentários:
Que pica-pau danado,hein?!!!
Que pica-pau danado,hein?!!!
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