EXTRA! EXTRA! OPERAÇÃO FRANGO NO ESPETO

Imagem: nabrasacolumbia.com.br

Como bem diz o ditado, nada como um dia após o outro e uma noite espremida no meio.  Outro dia mesmo, estava alardeando aos quatro ventos (ventos Alísio, Elísio, Basílio e Heloísio – segundo internauta brincalhão; Bóreas, Notus, Eurus e Zéfiro – N, S, L e O – segundo a mitologia grega), estava, pois, dizendo de meu renovado sentimento de crença na salvação da humanidade, tudo porque uma mocinha havia me oferecido seu assento num lotação de transporte coletivo.
Pouco mais de uma semana depois de tão notável feito, estou aqui escorregando em casca de banana e dando com a cara no chão.
Existe uma fase na vida do ser humano em que ele se torna invisível. Só pode ser esta a explicação para o que aconteceu comigo, Anatalino Reguete.
No bairro onde moro tem um comércio chamado “Ponto do Frango”. Em certos dias, quando a preguiça em pilotar um fogão se alia ao desejo de digerir algo diferente, é lá que eu me abasteço com um frango assado e um feijão tropeiro. Assim, a preço módico, fica “salva a lavoura” e todos lá de casa podem sorrir felizes.
Como marco ponto com regularidade no Ponto do Frango, noto que o dono me trata com certa deferência, seja me atendendo pessoalmente, seja me entregando uma ficha de atendimento preferencial.
Sábado último, ele não estava presente, e o caixa era uma moça, que me deu uma ficha normal com a letra “F”. Resignado, fui para a fila, essa instituição sempre presente na vida dos brasileiros.
Uma mulher veio logo após, mas, ao invés de ficar atrás de mim, como manda o Manual de Orientações Básicas para se Enfrentar uma Fila (MOBEF), ficou ao meu lado. Quando o entregador de frango perguntou “quem é o próximo?”, ela, mais do que depressa, entregou sua ficha e indicou aquele frango que iria levar, um que estava bem no meio do espeto. Como sofro de certa lerdeza por causa da idade, além de passar por invisível, eu não disse nada na hora. Engoli o desaforo, não lhe chamei atenção para seu atrevimento e sua falta de educação.
Estou fazendo tudo isso agora, não para exercitar minha assertividade, nem pra fazer uma delação premiada nesta Operação Frango no Espeto, mas para refletir sobre como o sentido de justiça pode ser entendido nos pequenos gestos. (A propósito, eu acho que quem faz delação premiada não passa de um indivíduo sem caráter, hombridade, vergonha na cara; quem comete ato de corrupção e se arrepende pode fazer delação gratuita.)
Platão, em seu livro “A República”, dizia que justiça é cada um ter e fazer o que lhe é de direito. No meu caso, justiça era ter sido atendido preferencialmente. Platão adiantava que somente pela educação a justiça iria ser possível. Sem educação, a justiça padece, o egoísmo aflora, explode a corrupção.
Um simples fato, a compra de um frango assado, nos ajuda a entender os problemas maiores do país. É por isso que Fridolino Xexeo, sempre dado a tiradas pseudopoéticas e humorísticas, veio me apresentar este arremedo de Manoel Bandeira:
Vá embora pra Europa
Aqui não dá pra ficar
Se as mulheres daqui são mais belas
Mais inteligentes são as de lá.

Vai embora pra Europa
Pois aqui não dá pra ficar?
Sei: os políticos daqui são corruptos
Honestos são os de lá.

Vá embora pra Europa
Aqui não dá pra ficar
Os frangos assados de lá são os mesmos
E você não tem desaforo que aturar.

E mais Fridolino Xexeo não disse, pois sua mulher, Percilina Predilecta, veio lhe entregar uma lista de compras no sacolão e no supermercado.
            - Ah, antes que me esqueça – arrematou ela: - Não deixe de passar no “Ponto do Frango” e traz um bem passado, mais um tropeiro e um salpicão!
            PS: Assim que acabo de contar esta história, vem minha filha dizendo que já não tolera mais o cardápio de sábado, à base de frango assado e feijão tropeiro. Por acaso, estimado leitor, tem como me indicar um curso de culinária, um que seja compatível como meus desgastados neurônios?
Etelvaldo Vieira de Melo



1 comentários:

Maria Solange Amado Ladeira disse...

Delicioso, amigo!!! Ou amigo delicioso? Rsrsrs

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