OS PEIXES

imagem: guiadospeixes.com


Na sala do apartamento,
           um aquário.
Os peixes aguardam.

O dono se aproxima
e semeia farelo
           na água.

Os peixinhos recebem o maná
e, em júbilo, proclamam:
“Eis aí o nosso dono,
Senhor dos céus e do mar!”

O HOMEM QUE NÃO TEMIA AS MULHERES



Uma das razões que me impedem de agarrar com unhas e dentes a doutrina espírita é a de acreditar que, em futuras encarnações, corro o risco de vir transmutado na figura de mulher.
Sinto-me bem na condição de homem, de homem com “h”. Para mim, a mente masculina é de uma simplicidade cartesiana (para os agnósticos), franciscana (para os religiosos). Assim, quando adicionamos “2 + 2”, o resultado é sempre “4”. O princípio matemático de que a ordem dos fatores não altera o produto é evidente para nossas mentes; nosso raciocínio é de base dedutiva, indo do todo para as partes. Simples, assim.
Quanto às mulheres, antes de falar qualquer coisa, eu deveria seguir a sábia recomendação de Tolstoi, você conhece?
Um grupo de homens falava sobre as mulheres. Em certo momento, diante de seu silêncio, quiseram saber o que Tolstoi tinha a dizer. Ele assim falou:
- Para manifestar o que penso sobre as mulheres é preciso que façam uma cova e me coloquem lá dentro. Assim que eu disser o que penso, vocês jogam terra sobre meu corpo até que eu fique totalmente soterrado.
Sei que deveria seguir tal recomendação, ficando calado, mas não tenho como conter meu fluxo verbal. Até parece que um espírito feminino baixou em mim.
Tal frase seria uma heresia para os espíritas, merecedora de uma reprimenda por parte do parente Vicentinho (para os espíritas, o espírito é assexuado). Então, que ela seja entendida como maneira de dizer que língua solta é atributo feminino, sendo eu a exceção masculina.
Como homem com “h” (e maiúsculo, por cima), tento ter toda consideração e respeito para com as mulheres. O poblema, probema, problema, é que – recorrendo a um exemplo da Física – estamos em polaridades opostas. Existe uma atração entre nós, como se fôssemos Sol e Terra. Engana quem pensa que o Sol seja a representação do homem; ele simboliza a mulher, enquanto que a Terra representa o homem. A mulher também pode ser simbolizada pela Lua, que nunca se mostra por inteiro, sempre esconde uma metade; já o homem aparece todo, com suas rotações, translações, flexões e injunções.
O homem se fixa no detalhe, por causa de sua natureza dedutiva; a mulher, com sua mente indutiva e intuitiva, capta o particular e, logo, tira uma conclusão generalizada. Em outras palavras: enquanto o homem vem com o milho, a mulher já está com o fubá, e até mesmo com o angu pronto.
Uma das coisas que admiro na mulher é sua prodigiosa memória, notadamente para guardar, por exemplo, a cor e o feitio de determinado vestido usado por uma conhecida há não sei quantos anos atrás. Um homem, por sua vez, mal sabe a cor da camisa que ele mesmo usou no dia anterior.
Assim caminha a humanidade. Conta Platão, numa de suas obras (O Banquete) que, no princípio, homem e mulher eram uma coisa só. Com o tempo, ele se tornou tão autossuficiente que, como castigo, Zeus os separou ao meio, chamando uma parte de homem e a outra de mulher. Desde então, procuram se unir novamente para restabelecer a unidade perdida. Com isso, deixaram de ameaçar a autoridade dos deuses.
Falando nisso, chego ao fim de minhas considerações. Numa outra oportunidade, falo de algumas coisas que me incomodam nas mulheres. Porque não sou desses que, a exemplo de Tolstoi, calam o bico, intimidados diante de possíveis revides. Para quem não sabe, sou daquele tipo que mata o pau e mostra a cobra.
Nota: Achei linguarudo e cheio de atrevimento o autor do relato acima. Sua conversa é também fiada, pois quem o conhece sabe muito bem que as pessoas mais importantes em sua vida são mulheres. Estou dizendo isto porque não devemos dar crédito para quem não merece; e mais: eu nada tenho a ver com a fala de quem disse não temer as mulheres. Eu temo.

Etelvaldo Vieira de Melo

O GATO

Imagem: gatomiando.com.br
Olhar sinuoso
(verdes olhares)
e a argúcia do pulo

Entre o ato e o rato
a destreza felina
de saltar o muro

Elétrico gesto
do deus egípcio
a engolir o escuro

DE AMOR E VERGONHA

Imagem: kakasp.wordpress.com

Estou triste estou triste / Estou desinfeliz / Ó maninha ó maninha – Manuel Bandeira.

Eu sou brasileiro, com amor – apesar de tudo; eu sou brasileiro, com vergonha - sobretudo.
Tenho vergonha de nossa deformação cultural, herança histórica que nos tornou seres menores, medíocres.
Tenho vergonha por enxergar, também agora, como nossas riquezas foram sempre usurpadas, confiscadas por ladrões e aventureiros, por detentores do poder, que nunca se preocuparam em reverter tanto bem em favor do povo do país.
Tenho vergonha de ver esse país, “bonito por natureza”, com sua fauna, sua flora e seus recursos naturais, ser explorado em favor da ganância e da irresponsabilidade ambiental (a Bacia do Rio Doce, um exemplo, está ferida e sangrando).
Tenho vergonha de ter estudado uma história de “faz de conta”, de mentiras deslavadas, e que impregnou minha mente (e a de muitos) de uma consciência ingênua, crédula, de boa fé, facilmente manipulável, facilmente usada como massa de manobra.
Tenho vergonha dessa história contada de maneira ridícula, com os fatos sendo distorcidos a troco de interesses menores.
Tenho vergonha desse país ter forjado uma elite financeira selvagem, desmedidamente gananciosa, sem escrúpulos para explorar e pisar sobre a cabeça dos menos favorecidos. Se você acha que estou exagerando, veja como a disparidade social no país é das maiores no mundo.
Tenho vergonha dessa elite rancorosa, que não compactua com o jogo democrático, com todas as classes tendo vez e voz. Através de seus porta-vozes, enche a boca para falar em meritocracia, mas o que ela pretende é instaurar uma oligarquia, uma aristocracia, uma plutocracia.
Tenho vergonha de ver a imprensa e os meios de comunicação como filhos entranhados dessa elite. Dá vontade de chorar de angústia e de medo, quando ficamos sabendo que os meios de comunicação em todo o país são basicamente controlados por meia dúzia de famílias. E é essa imprensa e essa TV que invadem lares, consultórios e locais públicos, fazendo parte do dia a dia das pessoas, fazendo lavagem cerebral nas cabeças dos ingênuos.
Tenho vergonha da classe política do país, de nossos sistemas político e eleitoral. Tais sistemas permitem legisladores se perpetuarem no poder, como castas e capitanias hereditárias (um deputado federal dispõe de uma verba adicional de 2 milhões de reais – 41.666,66 mensais - só para, ao longo de seu mandato, “fazer política”, isto é, visitar suas bases, seus currais eleitorais). A legislação faz com que os partidos proliferem e sejam em número absurdo; o Fundo Partidário faz com que muitos atuem como partidos de aluguel, vendendo-se a quem dá mais. A promiscuidade no mundo político é vergonhosa, todo político deveria cobrir-se de vergonha só de pensar que é político – parodiando uma antiga frase que detratava a mulher. A única coerência que vejo em um político é a do interesse próprio, nunca aquela estampada nos discursos carregados de demagogia.
Entre tantas vergonhas, tenho vergonha de ver a máxima de que “o poder corrompe” ser tão veraz entre nós. A ganância sufoca e mata idealismos e princípios, fazendo com que consciências se deixem corromper e vender. Pessoas incompetentes se agarram no Poder, buscando salvar suas vidas, enquanto o histérico mercado financeiro faz seu jogo de interesses e o desemprego alastra, os assalariados sofrem.
Em meio a tudo, tenho vergonha de ver a presidenta deposta ficar chorando qual bebê de quem foi roubada a mamadeira, agindo feito cachorro do qual foi tirado o osso. Eu gostaria que ela, ao invés de lamentar, desse uma lição de dignidade, reconhecendo suas falhas, seus erros; gostaria que ela esclarecesse os meandros do golpe que a vitimou, falasse das sujeiras que são varridas para debaixo do tapete, sem chegarem ao conhecimento público.
Uma reforma política se faz necessária e urgente nesse país que me envergonha, mas que eu amo. Uma reforma séria, que privilegia a competência, a probidade, o cuidado com a coisa pública e o bem comum. Não é possível uma reforma feita por esses políticos que estão aí, pois irão legislar em causa própria, procurando manter seus privilégios indecentes; não é possível uma reforma que deixe falar a voz do dinheiro, dos conchavos, os financiamentos espúrios. Precisamos de partidos fortes e enxutos, com identidade própria; precisamos de fidelidade partidária, de eleições de baixo custo financeiro e representativas, de política como serviço, nunca como profissão.
Em meio a tanta vergonha, quero reafirmar o meu amor pelo país. Aqui é minha terra, aqui é meu lugar. Aqui está a minha gente, aqui estão meus amigos. Aqui está o povo simples, trabalhador, honesto, assalariado, povo cheio de desencanto, povo machucado e sofrido, mas que carrega no coração uma esperança do tamanho do mundo. É esse povo a luz que vislumbro em meio a tantas trevas, trevas de puro egoísmo. Ele, povo, que está me ensinando uma lição de amor – apesar de tudo, uma lição de esperança – mesmo contra toda desesperança.
Etelvaldo Vieira de Melo
                 

PLANO BAIXO: OS DIREITOS ASSEGURADOS À EX-PRESIDANTA

Imagem: onordeste.com

Três dias sem PT!
No entanto, há muito por que lutar.
A Lava Jato desrenancalha
o Senado?

Moro namora agora
a cadeia de Delcídio,   
o xilindró para Maranhão,
o garanhão das cavalgaduras.

Lula vai para Cuba,
tentar perder o resto dos dedos?

Ainda é preciso cortar os juniores 
pela raiz,
para ver se a gente fica feliz.

Como o Brasil é colônia do (i) real
a etê da política
pode querer voltar a ocupar
o famigerado lugar.                                                      


UM MENINO, O MAR, UMA MENINA

Imagem: fatosdesconhecidos.com.br
          
           Já se tornou um clássico, daquelas citações edificantes que pululam nas redes sociais, a passagem do Livro dos Abraços, de Eduardo Galeano, onde o pequeno Diego, ao ver o mar pela primeira vez e tomado de emoção, segura a mão de seu pai Santiago e pede: - Pai, me ajuda a olhar!
            Por longos anos cultivei uma saudável inveja daquela criança e de sua intensa emoção.
            Somos tomados por emoções a todo instante, com exceção das pessoas tidas como fleumáticas, amorfas ou apáticas. Não sei se por defeito congênito, erro de fabricação, os reservatórios de lágrimas dessas pessoas parecem zerados ou em estado alarmante, como o de Cantareira em São Paulo, quando de seca prolongada.
            Ainda bem que posso ser classificado como um emotivo, já que a vida é formada de razão e emoção, com uma temperando a outra. Confesso que, no meu caso, a emoção tem uma dosagem maior do que a razão. É por isso que sou tido como uma “manteiga derretida”, um chorão. Não chego ao ponto daquele que “um beijo de novela faz chorar”, por duas razões: primeira, porque não assisto a novelas; segunda, beijo de novela, hoje em dia, dá mais que tiririca quando infesta um gramado (se tem outra analogia melhor, pode colocar aí). Quem chora com beijo de novela deve ser uma torneira estragada, que precisa trocar de bucha. Em TV e em cinema, sou mais daqueles beijos bem dados, que acontecem nos finalmentes e que despertam um sentimento parecido com o de Diego do Galeano.
            Estou fazendo este preâmbulo introdutório pra dizer que, finalmente, experimentei um sentimento que se aproximou, emparelhou e ultrapassou aquele do menino vendo o mar.
            A emoção que tomou conta de mim se deu recentemente quando, como é via de regra, estava dentro de um lotação e, estando o ônibus ainda no bairro, vi entrando pela porta de passageiro... uma garota.
            Ah, eu sou péssimo fisionomista, não sei reter a lembrança de uma imagem. Descrevê-la, então, torna o desastre completo. Neste ponto, sou igual aos índios inge-inge, cuja linguagem só consistia dessa expressão “inge-inge”.
            A garota, assim que entrou no ônibus, foi se sentar bem à minha frente. A visão que tive de seu rosto foi rápida; estando no banco de trás, o máximo que vislumbrava era um pouco de seu perfil.
            Ela estava usando um vestido de tecido tipo linho. Ele era comprido, indo até os tornozelos, seus pés eram pequenos e estavam acomodados num par de sandálias. Era uma adolescente, tendo entre quinze e dezesseis anos. Seu rosto era incrivelmente bem arredondado, sua pele era clara e seus cabelos, castanhos, estavam cortados bem curtos. Um par de brincos pretos perfurava suas orelhas. Assim que se assentou, ela colocou um fone de ouvidos, conectado a um aparelho celular.
            Assim transcorreu a viagem até o centro da cidade, ela ouvindo suas músicas e eu tentando ler alguma coisa num livro. Ela desceu um ponto antes do meu. Tive ímpetos de descer atrás. Juro que cheguei a pensar na ousadia de me aproximar e lhe dar os parabéns por ser uma menina tão linda.
            - Não me leve a mal – começaria eu a dizer...
            Antes de terminar este texto, andei trocando informações com uma amiga. Por exemplo, eu não sabia o nome desse brinco colado na orelha. Minha amiga disse que se chama “alargador” e as pessoas que o usam sentem necessidade de usar um cada vez maior. Ela quis saber o tipo de sandália que a menininha usava, daquelas sandálias da feira, o tipo de roupa. Depois de receber todas as informações, veio com o diagnóstico: “É o tipo de maconheira, que adora usar desse brinco. Vai ver que seu namoradinho é outro maconheiro”.
            As palavras de minha amiga me deixaram abalado. Não quis dar crédito, embora saiba que ela não diria aquilo a troco de nada. Tudo piorou quando veio com aquela recomendação fatal:
            - Se a vir de novo, por favor, não queira puxar conversa, dizendo que ela é bonita e coisa e tal. Ela vai se sentir intimidada, procurando chamar um policial, acusando você de pedofilia, de velho safado.
            Não tem jeito. Diego Galeano volta imbatível para o topo da parada de sucessos.

Etelvaldo Vieira de Melo

A ESPERADA DAS GENTES QUE ESCREVEM

Imagem: daliteratura.com.br

Quando a Inspiração chegar,
vai me encontrar trabalhando,
cultivando palavras
para o próximo verso.

A flauta da velha musa
soará tardia
no meu jardim,
repleto de escritos
e grilos diversos.

Quando madame chiar,
estará quase completo
o meu serviço.

Agradeço-lhe a atenção
e digo
que está atrasada para o encontro.
Que vem em boa hora
para retornar ao ninho
e adormecer os filhotes.

Sobre os canteiros,
os passarinhos dirão,
em alarido:
       as folhas mortas 
       as rimas
       o ritmo perfeito
 e tudo o que trouxe de letras,
 não nos serve para nada.
          
.Desculpe, senhora, mas esse romantismo,
 essa temporalidade,
 não caem bem em ninguém
que já nasceu na Pós-modernidade. 



MASTIGANDO O MUNDO E RUMINANDO

É de Rolando Boldrin o crédito do título acima. É ele quem diz em Vide, Vida Marvada: A baba do boi, ao mascar o capim, sempre foi santa e purificada; quem refuga o mundo resmungando passará berrando essa vida marvada. Ele diz todas essas coisas danadas de bonitas, pra concluir num arremate: Cumpadi meu que inveieceu cantando diz que ruminando dá pra ser feliz.
            No dia da votação do encaminhamento do processo de impeachment da presidenta do país pela Câmara dos Deputados, tive uma discussão com pessoa próxima.
            Numa discussão ninguém acaba tendo razão. Isso porque os argumentos são deixados de lado a troco de ofensas.
            Como meus reflexos andam um pouco enferrujados, acabei levando a pior: a palavra final ficou por conta do oponente. Ele era a favor do impeachment.
            - Já que você é a favor dos pobres, vá morar numa favela – arrematou ele.
            Eu havia dito que a elite brasileira é rancorosa, não admite que pobres tenham acesso ao ensino superior e possam, eventualmente, viajar de avião.
            Bom, não dei o troco na hora, por causa de minha lerdeza de boi que precisa ruminar; faço-o agora, escorado numa série de razões e exemplos.
            Na verdade, não quero morar numa favela. Quero que os favelados tenham condições de uma vida melhor. Todo ser humano merece a felicidade, merece viver com dignidade, tendo acesso à educação, à saúde, a uma vida decente. Os bens criados pela técnica devem ser disponibilizados para o maior número de pessoas.
            Eu penso que, quanto mais as pessoas viverem com dignidade e tendo alegrias, o mundo irá se tornar cada vez melhor. E isso não é bom?
Um dos componentes que tornam a vida difícil e perigosa hoje é a violência. Ela já está batendo à porta das casas, fazendo com que as pessoas se tornem paranoicas.  Quando estive no Sul-Maravilha, uma das vantagens que o guia apregoava era da segurança, com as pessoas podendo circular a qualquer hora pelas ruas do balneário.
Muitos fatores geram violência; entre eles, a desigualdade social.  A falta da educação é outro. No entanto, fica difícil a prática da educação quando as condições de vida são precárias. Eu vejo isso nas escolas, na ação dos governos que parece não enxergarem que suas iniciativas são paliativas, remendos tentando sustentar o arranjo social no limite do suportável.
É do tempo de Matusalém o ditado: em vez de dar o peixe, ensine a pescar. Tem razão os que reclamam que trabalham para sustentar vagabundos. Também acho que não faz sentido uns se sacrificarem para atender a outros, que não fazem por merecer. Não defendo medidas assistencialistas, paternalistas. O trabalho é que faz a grandeza da condição humana; trabalho digno, decente, justo. Como dizia Gonzaguinha, o trabalho é a honra do homem; sem ele, o homem é sem honra.
Não podemos nos esquecer de que existem os párias da sociedade, os que vivem nas sarjetas, dormindo sob marquises, disputando com gatos, cachorros vira-latas e ratos os restos de comida nos lixos. Como bem lembrou o poema “O Bicho”, de Manuel Bandeira. Para esses, os governos e as obras assistenciais devem ter um cuidado especial, já que não têm o mínimo de consciência de sua dignidade.
É isso que eu penso, é isso que fico ruminando, é isso que desejo para meu país. Todas as nações desenvolvidas conquistaram seu progresso à custa de investimentos em saúde, educação, saneamento básico, infraestrutura.
Uma sociedade estabelecida sob desigualdades gritantes, com uns tendo demais e outros tendo quase nada, não pode viver em paz e harmonia.
Infelizmente, o capitalismo entre nós apresenta uma dimensão perversa: ele diz que é bom que você tenha posses e possa consumir. Mas ele diz também que a felicidade só será perfeita se o outro não tiver acesso a esses bens. Não foi isso que disse uma professora, nas entrelinhas, ao ver um sujeito não tão bem vestido na sala de embarque de um aeroporto?
Foi isso que disse um amigo, comentando sobre alguém que prestava serviço para ele:
- Veja você que o bostinha tem até carro e moto!
Eu não culpo essa pessoa próxima, que mencionei no início do relato, e nem a esse amigo. Eles são o retrato de nossa cultura, essa herança que arrastamos desde a colonização. Só que ela nos torna seres menores, medíocres.
É isso que penso, sem ter a pretensão de ser dono da verdade. Você pode me acusar, dizendo que sou idealista, ingênuo. Mas penso que, no mínimo, falta bom senso ás pessoas. No mais, gosto de ruminar, porque acredito como Aristóteles que “a vida sem ruminação (reflexão) não merece ser vivida”. Depois, teve o filósofo Rolando Boldrin pra dizer: ruminando dá pra ser feliz... mesmo que o presente seja mais de choro e ranger de dentes.

Etelvaldo Vieira de Melo