O HOMEM QUE NÃO TEMIA AS MULHERES



Uma das razões que me impedem de agarrar com unhas e dentes a doutrina espírita é a de acreditar que, em futuras encarnações, corro o risco de vir transmutado na figura de mulher.
Sinto-me bem na condição de homem, de homem com “h”. Para mim, a mente masculina é de uma simplicidade cartesiana (para os agnósticos), franciscana (para os religiosos). Assim, quando adicionamos “2 + 2”, o resultado é sempre “4”. O princípio matemático de que a ordem dos fatores não altera o produto é evidente para nossas mentes; nosso raciocínio é de base dedutiva, indo do todo para as partes. Simples, assim.
Quanto às mulheres, antes de falar qualquer coisa, eu deveria seguir a sábia recomendação de Tolstoi, você conhece?
Um grupo de homens falava sobre as mulheres. Em certo momento, diante de seu silêncio, quiseram saber o que Tolstoi tinha a dizer. Ele assim falou:
- Para manifestar o que penso sobre as mulheres é preciso que façam uma cova e me coloquem lá dentro. Assim que eu disser o que penso, vocês jogam terra sobre meu corpo até que eu fique totalmente soterrado.
Sei que deveria seguir tal recomendação, ficando calado, mas não tenho como conter meu fluxo verbal. Até parece que um espírito feminino baixou em mim.
Tal frase seria uma heresia para os espíritas, merecedora de uma reprimenda por parte do parente Vicentinho (para os espíritas, o espírito é assexuado). Então, que ela seja entendida como maneira de dizer que língua solta é atributo feminino, sendo eu a exceção masculina.
Como homem com “h” (e maiúsculo, por cima), tento ter toda consideração e respeito para com as mulheres. O poblema, probema, problema, é que – recorrendo a um exemplo da Física – estamos em polaridades opostas. Existe uma atração entre nós, como se fôssemos Sol e Terra. Engana quem pensa que o Sol seja a representação do homem; ele simboliza a mulher, enquanto que a Terra representa o homem. A mulher também pode ser simbolizada pela Lua, que nunca se mostra por inteiro, sempre esconde uma metade; já o homem aparece todo, com suas rotações, translações, flexões e injunções.
O homem se fixa no detalhe, por causa de sua natureza dedutiva; a mulher, com sua mente indutiva e intuitiva, capta o particular e, logo, tira uma conclusão generalizada. Em outras palavras: enquanto o homem vem com o milho, a mulher já está com o fubá, e até mesmo com o angu pronto.
Uma das coisas que admiro na mulher é sua prodigiosa memória, notadamente para guardar, por exemplo, a cor e o feitio de determinado vestido usado por uma conhecida há não sei quantos anos atrás. Um homem, por sua vez, mal sabe a cor da camisa que ele mesmo usou no dia anterior.
Assim caminha a humanidade. Conta Platão, numa de suas obras (O Banquete) que, no princípio, homem e mulher eram uma coisa só. Com o tempo, ele se tornou tão autossuficiente que, como castigo, Zeus os separou ao meio, chamando uma parte de homem e a outra de mulher. Desde então, procuram se unir novamente para restabelecer a unidade perdida. Com isso, deixaram de ameaçar a autoridade dos deuses.
Falando nisso, chego ao fim de minhas considerações. Numa outra oportunidade, falo de algumas coisas que me incomodam nas mulheres. Porque não sou desses que, a exemplo de Tolstoi, calam o bico, intimidados diante de possíveis revides. Para quem não sabe, sou daquele tipo que mata o pau e mostra a cobra.
Nota: Achei linguarudo e cheio de atrevimento o autor do relato acima. Sua conversa é também fiada, pois quem o conhece sabe muito bem que as pessoas mais importantes em sua vida são mulheres. Estou dizendo isto porque não devemos dar crédito para quem não merece; e mais: eu nada tenho a ver com a fala de quem disse não temer as mulheres. Eu temo.

Etelvaldo Vieira de Melo

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