ALIMENTANDO DESAFOROS


Imagem: uninorte.com.br

Para Adriana, psicóloga e sobrinha querida, esperando que não solte assertividades pra cima de mim.          
Tento ser tolerante comigo mesmo, embora saiba que não sou lá essas coisas. Sei que possuo uma lista infindável de defeitos, mas também sei que não posso ficar me culpando pelos desatinos que cometo, me policiando para não fazer nada de extremamente errado; afinal, tenho que estar de bem comigo para ir tocando a vida até onde ela puder chegar.
            Entre meus defeitos, certamente um tem a ver com a maneira desconfiada com que olho para uma classe de profissionais, a dos psicólogos.
            A Psicologia é “uma aventura sobre o psiquismo, tentando explicar os fundamentos motivacionais e herdados das ações e das inter-relações humanas” (definição extraída do meu subconsciente ou do inconsciente coletivo).  Isto dito, fica claro: ela vai lidar e dirimir (palavra da qual quase não sei o significado) conflitos. Como o psicólogo atende aos interesses de um cliente, advinha o que ele faz? Simplesmente municia seu afeto com todo tipo de desafeto para despejar nos adversários! Um deles se chama “assertividade”, ou seja, o paciente está proibido de levar “desaforo para casa”, é um “tomou,levou”. Com isso, quero dizer que andei ouvindo poucas e boas, tudo por causa das orientações técnicas desses profissionais. Como não sou de revidar, por causa de uma lerdeza de raciocínio, confesso que tenho apanhado muito nas minhas relações. Também, por ser uma pessoa sensível, acabo carregando um tanto de desaforo pela vida afora, todos guardados no fundo de meu coração.
            Só isto já seria motivo para me indispor com a classe dos psicólogos. Mas tem mais, e esse mais tem a ver com o guru de todos, e que é chamado de Sigmund Freud. Não sei, mas esse homem construiu uma teoria usando de termos como id, ego, superego, e adicionou um tanto de complexos; depois, acrescentou os temperos do desejo mais a pulsão sexual, julgando, com tudo isso, ter descoberto o caminho marítimo para as Índias. Ora, todos nós sabemos que foi um português que realizou tal façanha, aquele mesmo que corre risco de cair para a segunda divisão do campeonato brasileiro (como se vê, este texto já tem quase seis meses de vida – tempo médio para o que chamo de “reserva de combustível”).
            Em resumo, uma coisa que não aguento ouvir é a tirada “Freud explica isso”. Os psicólogos deveriam arejar suas mentes com outras leituras. Se se dessem a tal trabalho, haveriam de ouvir de um dramaturgo inglês, William Shakespeare, o reconhecimento de que “existem mais coisas entre o céu e a terra do que imagina a vã psicologia”.
            Eu achava, desdobrando o raciocínio, que seria a Psicologia a mais eficiente armadura com a qual o ser humano podia contar. Eu via que todos aqueles que passavam por aconselhamentos psicológicos se tornavam, ipso facto, cheios de frescuras, de não-me-toques, achando que tinham “o rei na barriga”.
            Achava, pois, que ninguém haveria de suplantar a Psicologia na defesa do individualismo. Até esbarrar com profissionais da área da medicina, chamados de otorrinolaringologistas.
            Foi consultando alguns deles que vi como colocam os psicólogos “no chinelo”. Consultei uma gama de otorrinos, para encontrar solução para uma ronqueira que tenho, e todos foram enfáticos: “Se o ronco está associado a uma apneia de sono, o problema é seu; se não, ele passa a ser dos outros” (dos que estão em meu entorno, quando durmo, inclusive meu cãozinho de estimação, o Thor).
            - Mas, doutor – ponderei com um deles, - a situação está grave lá em casa. Se meu ronco chega a me acordar assustado, imagina o que ele pode estar causando aos ouvidos e aos nervos de meus familiares!
            - Roncar todo mundo ronca – falou o distinto, tentando ser pedagógico. – Você não deve se sentir culpado por nada – acrescentou, dando uma de psicólogo. - Além disso, seu ronco é primário, isto é, trata-se de uma herança genética – arrematou, voltando às suas origens médicas.
            Pensa que saí do consultório reconfortado? Saí foi pensando: é isto que a ciência moderna está ocasionando, um aumento desenfreado do individualismo. É por isto que o mundo está assim, também por culpa da medicina. Acho melhor procurar um psicólogo e fazer algumas sessões de terapia para ver se conserto um pouco do estrago que esses médicos andaram fazendo na minha cabeça. Preciso recuperar um pouco do sentimento de humanidade. Pode me ajudar, Dri?
Etelvaldo Vieira de Melo
           
                 

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