ESCOLHA O SEU SONHO

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Bedroon ar Arts - Roy Lichteinstein
Perguntei à Dora, filha pequena da faxineira, o que sonhava ganhar no próximo ano. Imaginei mil planos mirins: unicórnio falante, roupa top, roblux/roblox de 100 dólares, videogame com Just Dance, perfume e cremes Bebê Mamãe. Baseei-me em minha neta, recém-chegada do exterior.
- Então, Isadora, qual é o seu desejo no Ano Novo?
A menina sorriu triste. Olhou-me rápido, baixou a cabeça. Ficou muito calada, como se o quesito fosse absurdo, falta de bom senso. A seguir, procurou pela mãe na cozinha, onde forte lavava o teto. Pareceu-me ansiosa, querendo saber se haveria resposta plausível para minha curiosidade naquele momento. Em silêncio, esticou o beiço, coçou a carapinha.
 - Te conheço quando faz essa cara doida, sá. Quer água? Aí na pia tem pão com manteiga.
Pegou o copo, encheu-o na torneira. Veio indo para a copa, mastigando o quê. Senti assim uma espécie de vergonha por ter acabado de quebrar uma xícara do jogo de porcelana.
- Esqueça, Dora. Vou ligar A Galinha Pintadinha. Pode se assentar lá no escritório.
Ao invés de se dirigir ao computador, encolheu-se na porta de saída, segurando a boneca de pano desbotada. Notei que, apesar da retração física, os lábios apontavam para a cópia do Bedroom at Arles, de Roy Lichtenstein, pendurada na parede da sala principal.
Por que admiraria escondido uma releitura de Van Gogh em 1992?
Súbito, encarou deveras um objeto na gravura.
- A senhora disse o que eu quero mais melhor no ano que vem?
- Pois é, querida, mas para que sou tão bisbilhoteira e boba, não é?
- Está vendo aquela cama amarela com a colcha perto da janela?
- Sim. Você também pinta quadros na sua casa?
- Se o Papai Noel viesse outra vez em janeiro, eu ia fazer uma carta.
- E iria pedir-lhe...
- ...uma cama, mesmo pobre. Nunca tive uma caminha com colcha vermelha só para mim.
Graça Rios

VIVA O VERÃO!

Ivani Cunha

LEITURINO OUSANDO ESCREVER

Imagem: acegif.com
Recorremos, nesta crônica de passagem de ano, ao talento, sobriedade, competência e profundo sentimento de humanidade do amigo Marcos Geraldo. Com seu olhar crítico, mas carregado de esperança e de fé, ele nos ajuda a entender o ano que termina, ao tempo que projeta luz para o novo que descortina. Seu apelo é para que deixemos de lado o individualismo, que sejamos vigilantes, fortes e atuantes na construção de um Brasil melhor para todos.
Como Leiturino das crônicas de meu amigo Etelvaldo e a convite do mesmo, tentarei ser ousado em escrever sobre as lembranças do ano que se encerra e traçar novas perspectivas para o vindouro. Sei que não é fácil, mas ouso ousar...
De 2018, é bom lembrar, tivemos a oportunidade de ler belíssimas crônicas do amigo, animando-nos e incentivando-nos a sermos melhores cidadãos, coisa que apenas as redes sociais e mídia conseguem fazer com maior facilidade, muito embora de uma forma às vezes deturpada.
Embora não nascemos para ser massificados, constantemente somos assolados com verdades inverídicas que nos confundem e, às vezes, nos levam a delinear um futuro que, a princípio, não nos trará grandes realizações pessoais e coletivas. Assim pensam os pessimistas. À parte os escândalos proporcionados e revelados de pessoas públicas, estamos diante de um cenário que, ao meu ver, irá nos levar a sermos mais incrédulos em relação à política. Gostaria de salientar que qualquer posição que assumimos é política, pois o homem é um animal político, age e vive de política, mesmo que não seja a dos profissionais dessa área, que visam só a promoção pessoal e poder, utilizando-se de artifícios mais diversos para ludibriar o povo, independente da ideologia partidária, se é que têm alguma.
Para 2019, torço para que sejamos engajados nas questões que envolvem a coletividade, que sejamos menos individualistas. O poder é do povo, que sofridamente é usado para interesses espúrios. Sejamos vigilantes e que 2019 nos revele com mais clareza a nossa força de mudar aquilo que parece imutável. Juntos, somos capazes de acabar com essa podridão que assola o país.
Viva e cobre intensamente aquilo que nos é de direito! Esperança é o que devemos ter, tudo pode melhorar.
Obrigado, amigo, pela oportunidade. Continue firme no seu propósito!
Feliz Ano Novo!
Marcos Geraldo Soares

criatiVAIDADE

Recordo aos leitores uma história de Rubem Alves. O coelho se matriculou no Curso Intensivo de Férias para o Reino da Bicharada. Queria aperfeiçoar certas habilidades coelhais meio deficitárias. Aliás, encontrava-se entusiasmadíssimo com as possibilidades de êxito. O Curriculum da escola oferecia vasta aprendizagem de voo, mergulho, escalada. Marquem um X na opção correta: 1. O roedor aprendeu tudo rapidamente. 2. Teve um poucochito de dificuldade ao voar. 3. Gostou mais das aulas de nado Crawl Nele. 4. Teve duas faltas na escalagem de tronco de árvore.
Durante este ano, estive às voltas com o doutorado em Literatura Comparada. O último problema tratou de uma prova sobre Tradução (meu projeto entra nessa linha de pesquisa). Li três tristes tigres-textículos onde os autores falavam da atual radical mudança tradutória. Nesse caso, o escrevente se apresentaria hoje participante daquele processo com suas próprias ideias, vocábulos, elocução.
Bastante cunicular, iniciei o discurso. Convoquei Jorge Luis Borges ao suado serviço de capina com Pierre Menard, Autor do Quixote. Irônico, Luisinho ali nos conta que Pipi copiou ipsis litteris o texto de Cervantes em glória: Sou o autor do Quixote. Não resistindo ao tentador apelo do sim, pus-me a inventar um estilo diferente do antigo Ensaio. Bancando a coelheira, desfiei as diferenças de tempo, espaço, costumes, tipo de tradução lá e cá. Perguntei: O que faz o novo texto tão diverso dudu século XV? Arrebatada, pedi ao maestro que tocasse um tango argentino dedicado a Borges. Quick quick slow slow, falei aos bailarinos vermelhos de tanga (tonga tonga na milonga!) sobre nunca pisar nos calos das damas, jamais anulá-las nos passos, inventar modos de expressão tipo Carlos Gardel, cruzar gentis pés e coxas, ouvindo Por una Cabeza. Os amigos do blog sabem que a tradução volteia feliz no Frenetic Dancing Days. Não se deve anular o traduzido - auribus teneo lupum! Apareceu por perto Heráclito ensinando: Quem mergulha nas torrentes do rio por duas vezes, forever and never será o mesmo. Citei Camões: Mudam-se os tempos /mudam-se as vontades. /Só a mudança não muda mais como soía. Relacionei A lógica do Sentido em Deleuze, O Demônio da Teoria em Compagnion, A Tarefa do Tradutor em Benjamin etc. Ri sozinha ao falar do maníaco depressivo de Foucault, assíduo leitor de Freud, discutindo com Lacan o processo kafkiano da semântica menardiana. Concluí citando in La Recherche du Temps Perdu, a personagem Oddete de Crécy, depois Madamme de Swann, seduzindo Proust num déshabileé de crepe chinês dos tempos de cortesã. Ora, quem traduziu quem: a criatura ou o criador? Aí, agradeci aos escritores propostos no teste pelo grande apoio no show. The End: Gerem uma pergunta para esta resposta: O orientador considerou-me mamaluca de jogar pedra.
Uai, Fai no sistema. Achei que era para estabelecer mudanças no gênero Ensaio.
Graça Rios

CARTA PRO VELHINHO

Sempre haverá o momento do grito, do desafogo -- e isso pode ocorrer agora mesmo, neste pós-meado de dezembro.
Ivani Cunha

ENTÃO, É NATAL


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Imagem: luasingular.blogspot.com
Vai Anatalino Reguete passar o Natal no sítio de uma das irmãs de sua esposa, Dozolina Tazinasso. Já é uma tradição, antes bancada pelos mais velhos e agora assumida pelas filhas e noras.
O entusiasmo com o evento é quase generalizado, especialmente por parte de casais que têm crianças novas em casa. Os preparativos começam com dois meses de antecedência, em grupo de rede social, onde tudo é planejado de maneira meticulosa.
 Dozolina não é fã de Natal: sua experiência está carregada de fatos traumáticos, muitos deles proporcionados pelo irmão mais velho. Na noite de Natal, ela e suas irmãs tinham o costume de colocar calçados nas janelas dos quartos. No dia seguinte, bem cedo, iam verificar os “presentes”. Ingenuamente, Dozolina abria uma caixa e lá de dentro saltava um sapo; um embrulho pesado era um tijolo; outro embrulho de presente, amarrado com fita, escondia um cocô de vaca. O irmão ria às “bandeiras despregadas”, enquanto a futura esposa de Anatalino, ainda menina, ia ficando cada vez mais traumatizada. Hoje, ela sonha com o dia em que não haverá mais celebração desse tipo de Natal.
Da parte de Anatalino, o sentimento é menos radical: olha com simpatia tudo o que acontece, mesmo porque na sua casa não havia Natal assim. Seus pais eram muito pobres, o máximo de presente possível era uma sacolinha de papel com algumas balas, castanhas e nozes. No dia seguinte, ele e seus irmãos tinham que tolerar as crianças vizinhas, que iam cedo para a rua exibir bicicletas, velocípedes, carros, bonecas, casinhas de brinquedo. Já naquele tempo, onde o capitalismo não era tão selvagem, exibir era melhor do que ter.
Na noite deste Natal, alguns parentes pedem para Anatalino colocar a fantasia de Papai Noel. Ele recusa delicadamente, mesmo porque se considera um péssimo ator, não estando à altura das expectativas das crianças.
Quando alguém resolve assumir o papel, a atenção de todos é desviada para um ponto em frente à casa. Com lanternas, o escuro é vasculhado. Alguém pergunta: “- Será que Papai Noel está aqui?”. Enquanto isso, “Papai Noel” ajunta os presentes no fundo do quintal (da casa, para bem dizer, não da banda de pagode). Quando tudo fica pronto, as crianças são encaminhadas para o local, a tempo de ver o “Papai Noel” saindo correndo.
Muitos meninos demonstram admiração e espanto, enquanto outros mostram ar de ceticismo.
Olhando tudo aquilo, Anatalino pensa:
- Não entendo por que as crianças vão abandonando a lenda de Papai Noel. Acho isso uma bobagem sem tamanho. Se esse bom velhinho tivesse feito parte de minha infância e sido meu amigo, iria querer que me visitasse todos os anos até o fim de meus dias.
PS1: Em tempo: o irmão mais velho de Dozolina não participou dessa celebração. Se ali estivesse, Anatalino jura que seria capaz de lhe preparar um embrulho de presente, onde estariam cocô de vaca, cavalo, lagartixa e galinha, com direito a cobertura de bostinha de cabrito. Assim, ele iria ver o que “é bom pra tosse”, com a amada Dozolina encontrando um antídoto para seu trauma infantil.
PS2: Este texto está aqui mais como um pretexto, pretexto para lhe desejar, amável Leiturino, um Feliz Natal. Que ele, Natal, possa renovar em seu coração um mundo de esperanças: de saúde, amor, paz e muitas alegrias, agora nas celebrações e no ano novo que se aproxima.

Etelvaldo Vieira de Melo

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UMA MORTE ANUNCIADA

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Imagem: Wikipédia
Fabiane Maria de Jesus, aos 3 de maio de 2014, vinha bicicletando ao encontro dos parentes. Retornou a casa para buscar a Bíblia de capa preta utilizada na Igreja onde era assídua, em Morrinhos IV, periferia do luxuoso bairro Guarujá, São Paulo, onde residia.
Parou num boteco, pois tinha sede. Um menino lhe pediu comida, recebendo por resposta uma banana.
Ora, circulava nos meios de comunicação a notícia sobre uma feiticeira que sequestrava crianças, arrancando-lhes o coração e os olhos em rituais de magia negra. Nesses canais, a imagem surgia acompanhada de promessas de estupro, dilaceramento etc etc.
De acordo com o boato nas redes sociais, sob retrato falado, Fabiane, mãe de duas filhas de um e doze anos, casada, correspondia à imagem.
Alguém passou pelo local da fruta oferecida, vendo o gesto de “sedução infantil” com o livro negro entre os dedos. Chamou a população, cerca de duzentas pessoas, e a moça de trinta e dois anos foi sumariamente linchada a pau e pedra. Ainda viva, jogaram-na num colchão, impedindo que fosse levada ao hospital até a chegada da Reportagem.
Dois anos depois de morta Inês, a verdadeira bruxa foi presa. A jovem torturada nada tinha a ver com o fato, ótima dona de casa, mãe, esposa que fora. Somente quatro envolvidos no crime sofreram processo. Um deles passara inúmeras vezes de bicicleta sobre a cabeça de Fabiane.
Pesquisando no Google histórias de mulheres, conforme Pablo Neruda, confesso que chorei. Coloco hoje em pauta a trágica ocorrência, esperançosa de que os autos da justiça ressuscitem de seu falecimento nas gavetas da Lei. Peço vênia aos leitores do texto.
Graça Rios

NO AR

Não perca tempo: se for de graça, por que deixar para o próximo?
Ivani Cunha

ABRINDO OS PORTOS, AS PORTAS E AS COMPORTAS

Imagem: qualviagem.com.br
No seu romance “Recordações de Amar em Cuba”, Oswaldo França Júnior cita um engenheiro holandês, que assim se referia aos brasileiros:
- Vocês com tantos recursos naturais e a maioria da população continua nesta miséria? Só existe uma explicação: burrice.
Num primeiro momento, ao ouvir tal declaração, nosso sentimento pode ser um misto de dor e de raiva. Afinal, machuca ser chamado de “burro”, ainda mais quando você acha que a “carapuça” (ainda dá pra usar tal expressão?) deve ser colocada em outra cabeça, e não na sua. Daí, também o sentimento de raiva. Você se justifica, dizendo: - Eu não tenho nada a ver com isso!
Um compositor antigo já dizia: “Moro num país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza”. De fato, o Brasil é rico em recursos naturais, possui fauna e flora variadíssimas e uma terra onde, “se plantando”, tudo dá.
No meio de tanta bondade, cabe a pergunta: - Por que não dá certo? Não dá certo por uma questão de burrice, como quer o holandês?
O que noto entre compatriotas é um certo sentimento de inveja para com outros povos. Às vezes vejo pessoas lamentando o país não sofrer com terremotos, furacões e outras calamidades. O brasileiro parece não gostar de ser tão “abençoado por Deus”, que isso parece ser mais castigo do que uma bênção. A bem da verdade, tanta riqueza natural nunca esteve a serviço dos brasileiros como um todo. No período colonial, ela foi usada para enriquecer portugueses e ingleses; depois, tivemos as capitanias hereditárias, os latifúndios. Ao olharmos para a realidade atual, veremos como tudo continua como dantes: um país que continua rico, enquanto que o povo continua como sempre marginalizado e pobre.
Em épocas de crise, como a que vivenciamos agora, sempre volta a cantilena de que privatizar é preciso, de que o estado brasileiro não tem competência e habilidade para gerir empresas, que as estatais são deficitárias e cabides de emprego, que tudo haveria de ficar melhor nas mãos da iniciativa privada, aquele blábláblá de sempre.
Quando vejo pessoas falando assim, fico pensando no holandês de Oswaldo, tenho vontade de retrucar: - Mas isso não é uma questão de burrice?
Quando vejo os resultados das privatizações promovidas durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, pergunto: - Elas reverteram em benefícios reais para a população?
Você poderá citar o caso da Vale do Rio Doce como exemplo de privatização virtuosa: uma empresa que, de deficitária, passou a ter lucros extraordinários. Mas eu pergunto: - Lucros para quem? Foi lucro para a população do vale do rio Doce, ele que foi contaminado com um vazamento de rejeitos criminoso, população que até hoje não foi indenizada com justiça? Foi lucro para o país sofrer o maior desastre ambiental desse tipo em toda a história do planeta, cujo impacto ecológico, social e econômico até hoje é difícil mensurar?
Falam da privatização do sistema de telefonia como se tivesse sido um grande negócio. Pode até ter sido, mas não para os consumidores, que arcam com tarifas altíssimas, entre as mais caras do mundo, e com prestação de serviço que deixa a desejar. Enquanto isso, operadoras mal administradas, sugam dinheiro público, dinheiro desviado de bens como saúde e educação.
E, assim, os governos vão gastando milhões superfaturados na construção de rodovias que, depois, são oferecidas graciosamente para a inciativa privada administrar com seus pedágios. E, assim, depois de serem gastos b-i-l-h-õ-e-s em pesquisas, está agora o pré-sal sendo oferecido de “mão beijada” (preciso ver a origem disso, dessa expressão) para as gananciosas indústrias petrolíferas.

ABRINDO OS PORTOS, AS PORTAS E AS COMPORTAS

(EPÍLOGO)  

Imagem: viagem.uol.com.br
Se querem privatizar, que privatizem tudo: a Petrobras, a Eletrobras, o SUS, o MEC; privatizem os meios de transporte, os mananciais e a distribuição de água. Quem sabe dá pra privatizar os poderes da república? Por que não privatizar o Legislativo, o Executivo e o Judiciário?
Se acharem que é complicado tudo isso, por que não privatizar o país como um todo ou oferecê-lo como presente para outra nação? Quem sabe Portugal queira de volta sua antiga colônia? Não haveriam de querer os Estados Unidos mais um território com 8,5 milhões de quilômetros quadrados?
Já existem muitos fatores que corroboram a ideia de se anexar o Brasil  aos Estados Unidos: - Existe um sentimento enraizado em nossa cultura que diz: o que é bom para os Estados Unidos também é bom para o Brasil; as escolas aqui há muito trabalham para a aculturação (já substituímos, por exemplo, o Dia do Folclore: de 22 de agosto para 31 de outubro, o Halloween, ou Dia das Bruxas – saíram Saci-Pererê, Mula-Sem-Cabeça e outros, dando lugar ao Bigfoot, ou Pé Grande, e companheiros); as crianças escolarizadas, além dos termos empregados na Internet e na moda, são capazes de pronunciar pelo menos duas frases em inglês: The book is on the table e Open the door.
Se não bastasse tanto incentivo, podemos pensar na possibilidade de remover o Cristo Redentor lá do Corcovado, no Rio de Janeiro. Em seu lugar, poderemos colocar a Estátua da Liberdade. O dono de uma rede de lojas aqui do país não achará inconveniente ceder uma réplica da mesma. Assim, aquela estátua estará voltada para a baía de Guanabara, mostrando a todos que o Brasil passou a ser de fato e de direito Brazil.
Com o Brasil sendo incorporado pelos Estados Unidos, alguns dividendos irão sobrar para mim: já não desgostarei tanto dos filmes de violência e de guerra, onde os mocinhos são agentes do FBI ou da CIA. Mais importante: com a moeda sendo o dólar, e não mais o famigerado real, poderei adquirir, finalmente, um novo videogame, projeto que tenho adiado nos últimos anos de governo “temeroso”.
E aí, United States, topam?
Etelvaldo Vieira de Melo

CLARA GEME

Olhem a clara Clara
Com um galo na cara.

- Papai, vem cá!
 Ui, ui, ui.
Vem cá, papai!
 Ai, ai, ai.

Clara geme geme.
Geme geme a cara Clara
Com o galo na cara.
Parece pintinho novo
Saído do ovo.

Canta o galo na cara da clara Clara.

 - Papai, que dor, vem cá!
 Ui, ui, ui.
Vem cá, que dor, papai!
Ai, ai, ai.
Graça Rios

FEIJÃO COM ARROZ

De repente, pedir aumento de salário pode ser considerado ofensa ao patrão.
Ivani Cunha

POLÍTICA É ASSIM: UMA MÃO LAVA A OUTRA, MAS A CARA FICA SUJA

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Imagem: areah.com.br
Se existe uma coisa que deixa Ingenaldo indignado é ele ouvir alguém falar mal do caráter do brasileiro. Pode até ser um general de exército, um vice-presidente da república, destratando a herança do negro e do índio, dizendo que ela contribuiu para uma índole preguiçosa e de malandragem do povo. Para Ingenaldo, o povo não merece esse tipo de ofensa; o que ele precisa é ser educado através de exemplos, bons exemplos. Sendo assim, ele é o último sobre quem devemos atirar pedras. As pedras devem ser atiradas, primeiro, nas elites atrasadas, nos governantes, e nas autoridades, quando não passam bons exemplos. No presente texto, Ingenaldo fala sobre isso e faz uma premonição: antecipa algo que pode acontecer e que irá jogar por terra o discurso de combate à corrupção, mostrando que ele não passa de um blefe, uma deslavada mentira.
Apesar da pouca idade, Ingenaldo parece carregar nas costas todas as dores do mundo. Os astrólogos (genuínos, não aqueles metidos a “filósofos”) diriam que esse sentimento é por causa de seu signo zodiacal, Peixes, mas ele quer crer que tudo seja por causa do fato de ter nascido brasileiro.
Enquanto brasileiro, ele está sujeito a muitos aborrecimentos, muitas contrariedades, especialmente aquelas provocadas pela classe política. Ainda agora, ficou sabendo que pretendem blindar Michel Temer, quando este deixar a presidência da república, oferecendo-lhe uma embaixada, talvez em Portugal, já que é monoglota – segundo as más línguas.
- É o fim da picada! – monologa Ingenaldo. – Aquele que é tido, havido, declarado, documentado, gravado, juramentado e com firma reconhecida em cartório como chefe da mais perigosa quadrilha de ladrões do país recebe como castigo um prêmio, em vez de apodrecer na cadeia, onde é seu lugar – segundo as boas línguas!
Ingenaldo, antes do fato ser consumado, pergunta:
- E aí, meritíssimos juízes, estão lembrados que Temer fez com o “Gatinho Angorá” o mesmo que vocês não permitiram que a Dilma fizesse com o Lula? E aí, só sabem cantar samba de uma nota só? E aí, vão ficar calados, como se isso não fosse pertinente, como se não viesse ao caso?
Nosso amigo sabe que esta tem sido uma estratégia amplamente empregada nos últimos tempos: solta-se uma bomba (boato, sacanagem, besteira) e, se colar, colou. Como elas, as bombas, têm vindo com frequência, umas e outras passam despercebidas; quando a gente vai ver, o mal já está feito.
Ingenaldo deixa o alerta, para que o choro não venha quando a vaca atolar de vez no brejo. E quer deixar aqui registrado, neste espaço cibernético, entre “nuvens”, para que, depois, não venha um juiz metido a besta dizer que o indulto de Temer não foi uma aberração, uma injustiça, uma sacanagem, um acinte, uma bofetada no caráter e na vergonha do povo brasileiro, mas tão somente um “movimento” compreensível e justificável das forças políticas.
Ingenaldo está indignado, sofrendo por antecipação, você está vendo (se o indulto ocorrer, será em janeiro). Por enquanto, ele pressente a fabricação da bomba. Os 16,35% de reajuste salarial dos ministros do STF é um sintoma; a “ideia” de uma embaixada é outro. Discutindo o assunto com um vizinho, o Lucinildo Pretextado, este lhe propôs uma aposta: uma caixa de cerveja (puro malte) – Ingenaldo ganha, se Temer receber o indulto; perde, se for preso.
Esse é o tipo de aposta que agrada ao Ingenaldo. Se perder, estará ganhando como cidadão; se ganhar a aposta, poderá afogar a mágoa na cerveja. Tudo pode ser ainda melhor, se formos dar crédito aos ditos populares. Um deles fala assim: “Dinheiro não compra felicidade, mas compra cerveja – que é quase a mesma coisa.
Nota: E aí, estimado Leiturino, quer entrar nesta aposta com Ingenaldo?
    Etelvaldo Vieira de Melo
  


























                                                                                                                                                                                








PIPI NO VASO

O xixi vem e vai
Vai e vem para o vaso.

Mamã pinica o neném.
- Pinico, pinico, voou.
Penico, penico,
Vazou!

Neném chia, chia.
Tico-tico pia, pia.

- Alô, alô! Por favor,

Cocô ou xixi, vai tudo para o vaso.
Xô, xô.
Tiau, cocô!
Graça Rios

TUDO PASSA

Convém não levar ao pé da letra alguns adjetivos.
Ivani Cunha

BOAS LEMBRANÇAS, NÃO FOSSE O GUARDA-CHUVA

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Imagem: escolasnarede.seec.m.gov.br

Belderagas Piruegas, vira e mexe, está se lembrando de seus tempos de infância. Tudo era regado e regrado a muita pobreza e dificuldade. Mas nem por isso aquele tempo é tido na conta de ruim, muito pelo contrário. Como se esquecer, por exemplo, daquela cama cujo colchão era enchido com palhas de milho? Na hora de arrumá-la, sua mãe tinha o cuidado de espalhar bem as palhas, de modo que o colchão ficava todo estufado. Não tinha coisa melhor. Belderagas, mais conhecido pelo apelido de Biriba, se jogava ali em cima, afundando no meio das palhas. Sua mãe vinha, então, cobri-lo com cobertores (?), que chegavam a cinco em épocas de frio. Nesses tempos, Biriba mal conseguia virar o corpo em meio das cobertas.
Está certo, aquele colchão tinha um inconveniente: o de juntar muita pulga. Mas nada que uma borrifada de inseticida, Neocid, não desse jeito.
Junto com o colchão, havia muitas outras pequenas alegrias: os jogos de “finco”, de “queimada”, de “cinuquinha”, de “tampão”, de “bolinha de gude”; as brincadeiras de fazer barquinhos para jogar na enxurrada, de “casinha” (com as primas) e de “circo”; as pescarias e as armações de “arapucas” para pegar tico-tico e tizil.
Para uma criança, que vive hoje confinada frente a um aparelho de TV, ou de videogame, ou de computador, fica até difícil entender tal variedade de brinquedos. Eles não só eram variados, como exercitavam a imaginação. Assim, como num passe de mágica, um sabugo de milho se transformava num potente fenemê e uma folha de cafezal se tornava um dinheiro, para comprar um copo de suco de faz de conta numa lanchonete de brincadeira.
Quando tomado por essas lembranças, Belderagas Piruegas, que há muito deixou o apelido de Biriba para trás, sente que seus dias de infância eram coloridos, apesar da pobreza em que vivia.
Se você lhe perguntar, a bem da verdade, se não havia nada que o aborrecesse, ele dirá que havia, sim, uma coisa que o aborrecia, deveras.
Quando saía à tarde para ir até a praça da cidade, duas recomendações eram feitas pela mãe:
- Biriba, não se esqueça da blusa e do guarda-chuva.
O tempo podia estar ameno e o céu coberto de estrelas.
- Mas, mãe, não vai chover!
- Pode chover, meu filho, e pode esfriar.
O que Belderagas tinha era aversão, vergonha do guarda-chuva, verdadeira peça de museu, mais remendado que as lonas dos circos que passavam pela cidade.
Normalmente, obedecia à mãe, saindo de blusa e carregando debaixo do braço um monstrengo que não tinha como passar despercebido. O resultado de tudo é que raramente chovia. Quando inventava de contrariar os conselhos maternos, aí chovia torrencialmente. Ao voltar para casa, todo molhado, ainda tinha que ouvir a reprimenda:
- Não disse, Biriba, que ia chover?
Até hoje Belderagas carrega esse trauma de infância. Quando sai de casa, parece ouvir sua mãe falando no seu subconsciente: “- Não se esqueça do guarda-chuva!”. Assim, esteja um sol de “rebentar mamona”, ou um céu entulhado de estrelas, lá está ele carregando o cujo, o guarda-chuva.
O amigo Fridolino Xexeo contemporiza:
- Um homem prevenido vale por dez!
Mas o que Belderagas quer mesmo é superar seu trauma. Para isso, está pensando em recorrer aos serviços profissionais de sua sobrinha, a terapeuta Dri (*). Através de um processo de regressão, poderá se encontrar com sua mãe. Além do abraço cheio de saudades, irá lhe pedir para suspender a obrigatoriedade do guarda-chuva. Aproveitando a viagem, quer ver se dá tempo de disputar um torneio de bolinha de gude com o Toninho da Biba, além de brincar um pouco de casinha com a prima Dedé, a Desolina Fufucas.
Belderagas vai para essa aventura de regressão cheio de entusiasmo. No fundo, seu projeto tem pouco a ver com o trauma do guarda-chuva. O que ele quer saber é em que parte do caminho deixou a admiração, o encantamento e a simplicidade, valores que perdeu no tempo e que andam fazendo muita, muita falta em sua vida.
(*) Quem quiser conhecer um pouco do trabalho da Dri, poderá visitá-la no site www.vinculosdeafeto.com.br. Lá ela trata especialmente do tema “família e adoção”, apresentando notícias e orientações para aqueles que querem adotar ou que já adotaram, assim como para todos os que se interessam por esse apaixonante tema.

Etelvaldo Vieira de Melo