JESUSA ENTRE DOUTORES

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Respondendo ao agravo dos moradores, comparecemos ao BHTRANS quatro homens e eu, a fim de reverter o trânsito de nossa rua EUA. Faz dois meses, somos incomodados pelo barulho, poluição, perigo, no tráfego anteriormente justaposto aquém-logradouro.                                                                                                 Chegamos ao local. Somando, havia no recinto doze magistrados, e a mulher que vos fala. Iniciou-se logo intensa discussão a respeito do tema. Observei, entanto, que nenhum membro forte deu por nuestra feminina presença (malgrado minha face maquiagélica bem pintada.). Paixão, olhares caíam eloquentes sobre companheiros, solicitando adendos, provas, abaixo-assinados.
Vagava tempo escoava. A oportunidade de me acrescentar às sugestões sucedia alhures. Esperei, tomei água, calei o celular. Nada! Permaneci eumente meia hora e trinta entregue às curiosas baratas. Então, à frente do espelho, passamos dedo em batom manchado, visando a concertar Stella Matutina.
Ah, fera ferida! Referendei-me sob numerosos títulos acadêmicos, expliquei-me condômina do Edifício Amaralina, referi-me ao transtorno vital após tão relatado movimento (súbito, um déspota esclarecido lançou no ar polegar: Não podemos resolver problemas pessoais, cara senhora. Precisamos urgente consultar mapas, números, instituições.).
Narizinho empoado arrebitou-se: Data vênia, pedimos a palavra. Usamos metonímia. Discursamos em nome do todo. Sofrem conosco a Clínica de idosos, os apartamentos ausentes, as crianças cruzando o asfalto não sinalizado.
 Aproveitou vermelho o ensejo, surgiu fulgurante no celeste altar. Lembrei-os de Carlota Pereira de Queirós, primeira Deputada Federal Brasileira. Contemplei-os com dada pesquisa num retrato em 1933. Ostentava charmosa, pronunciei, florido chapéu com estampas competentes. Dobrava pregas do longo vestido, assentadinha entre duzentos colegas de fraque. Onde? Na Câmara Federativa. Natural que a foto seja, as melhores são, em preto e branco. Concluindo, raciocinei em cima, arraZoando: O que o segundo sexo colocaria em pauta naquela similar reunião? Certamente, esta nossa argumentação.
Após batidas na Estados Unidos mais conchavos na assembleia, aproximaram-se desta humilde Ginevra (It., Rom.), Guinève (Fr.), Ginebra (Port.), Gineva (Arpit., Ing., Hol.), Gineva (Pol.), Genf (Ted.) ou Gwenhwyfar (Gal.); repetindo: aproximaram-se de nós doze  cavaleiros da távola redonda. Eram eles: Rei Arthur Pendragón, Sir Lancelot del Lago, Sir Galahad, Sir Perceval de Gales, Sir Bors de Ganis, Sir Bevedere, Sir Tristan de Leonir, Sir Gawain, Sir Lmorak of Wales, Sir Gahedis, Sir Kay, o Stewart. Todos queriam - deixem disso, deixem disso! -  sem parar par o número de Vosso Iphone, Plano de Saúde, Escola de Música, Curso atual. Favor, favor, madame, esteja sempre nesta sua casa, leve consigo minha recolhida flor!
Por desaforo, mesmo porque o último clown funcionasse de bico no Gran Circo Stewart CIrkey, eu disse adeus às ilusões. Cantarolei saindo de lencinho PARA NÃO CHORAR DEPOIS/ EU DISSE ADEUS, tal qual Roberto Carlos César em alto-mar.
Graça Rios

ENGANANDO O GOLEIRO

O verbo tirar é muito útil em sua transitoriedade, mas o dicionário do futebolês o rebaixou a um mero e surreal intransitivo, utilizado apenas quando a bola engana o goleiro...
Ivani Cunha

PRIMEIRAS FAKE NEWS DA HISTÓRIA

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Imagem: galeria.colorir.com
Em passagem da Bíblia, no Livro de Gênesis, li: estavam Eva e Adão vivendo aparentemente tranquilos e felizes no Jardim do Éden, desfrutando de tudo de bom e do melhor.
Certo dia, caminhava sorrateiramente pela proximidade o Demo, o Tinhoso, quando pareceu ouvir um suspiro, “Ai, Ai”. Colocando a mão em concha, aguçou os ouvidos, prestando atenção. O suspiro se repetiu, com certeza: “Ai, Ai”. O Capeta olhou atento em volta até perceber a presença de Eva, sentada debaixo de um pé de goiaba.
Sabendo que sua aparência poderia assustá-la, o Coisa-Ruim tomou a forma de uma serpente. Deslizando sobre gramíneas e folhagens, aproximou-se da moça. Falou:
- Olá, minha pequena Eva! Como tem passado? – E acrescentou, confundindo-se um pouco com as palavras: - Bem, e Adão também está bem?
- Estamos bem – falou Eva, dando outro suspiro (“Ai, Ai”).
“Tem coelho nesse mato” (em espanhol: “haber gato encerrado”), pensou o Cramulhão, inventando a expressão. Arriscando um palpite, disse:
- Vocês devem levar uma vida nababesca (*) aí, cheia de divertimentos e novidades, não é?
[(*) Pelo vocabulário, dá para perceber que tal diálogo ocorreu há muito e muito tempo.]
- Até que você se engana, dona Serpente. Aqui eu não tenho tudo o que quero.
- Como assim?
- Eu não tolero essa rotina de ter de fazer tudo sempre igual, acordar às oito da manhã e, depois de um lanche frugal, ficar roendo uma romã (quando o que queria mesmo era devorar uma maçã).
- Como assim?
- Ora, o senhor Deus fez o favor de nos permitir tu-do, menos comer do fruto daquela árvore. – E Eva apontou para uma macieira carregada de frutos maduros.
A serpente olhou na direção da árvore, ao tempo em que uma aragem trazia até suas narinas o aroma inconfundível de maçã.
O Pé-de-Bode - ou seja, a serpente – arregalou os olhos, enquanto dizia:
- Mas está clara a razão pela qual Ele fez tal proibição: se comerem daquele fruto, vocês irão ter conhecimento de tudo, serão plenamente felizes. Serão como o Senhor Deus.
- Tem certeza do que está dizendo? – perguntou Eva, um tanto desconfiada.
- Absoluta – respondeu o Zarapelho. E falou mais: - Come! Come! Come!
(Tal expressão inspirou um propagandista de canal de TV, especializado em vendas, a criar o bordão: “Compra! Compra! Compra!”.)
- Mas o Senhor disse que, se comermos desse fruto, haveremos de morrer.
- Que nada! Quando o comerem, seus olhos se abrirão, serão como deuses, conhecedores do bem e do mal.
Convencida, Eva comeu do fruto, oferecendo um pedaço ao marido que, sem pestanejar, o engoliu. No entanto, ele o fez com tamanha sofreguidão que acabou se engasgando. Tanto tossiu que acabou formando uma saliência no pescoço, mais tarde chamada de pomo-de-adão, maçã-de-adão ou gogó.
Desse relato, algumas inferências podem ser feitas:
- Tivemos aí a invenção da roupa, ou vestuário, usada no início para cobrir a nudez. Adão (Adam d’Ève) tem o título de primeiro estilista de moda.
- Ali aconteceu também pela primeira vez uma prática que se tornou comum: o chamado “jogo do empurra” – Pressionado por Deus, Adão joga a culpa na Eva; esta acusa a serpente. E a serpente? – ela faz o papel do estagiário na história.
- A sociedade nascente se define como patriarcal e machista: “Seus desejos a impelirão para o seu marido, e você estará sob o seu domínio” (Deus dirigindo-se à mulher).
- Pero no mucho. Deus falando ao homem: “Porque você ouviu a voz de sua mulher...” Daí, os homens sensatos passaram a acreditar que deveriam se sujeitar ao comando das mulheres, fazendo valer o ditado “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. 
- “Porque ouviu a voz de sua mulher, comendo o fruto da árvore que eu lhe havia proibido de comer, maldita seja a terra por sua causa. Tirará dela com trabalhos penosos o seu sustento todos os dias de sua vida. Ela lhe produzirá espinhos e abrolhos, e você comerá a erva da terra, comerá o seu pão com o suor de seu rosto, até que volte à terra de que foi tirado, porque você é pó, e em pó se tornará.” Com essas palavras, o Senhor instituiu o trabalho, tal como é visto pelo comum dos mortais, tirando os políticos.
- Finalizando, ao mesmo tempo em que atendo ao título desta. Quando a serpente diz: “Oh, não! Vocês não morrerão. Mas Deus bem sabe que, no dia em que dele comerem, seus olhos irão se abrir, e serão como deuses, conhecedores do bem e do mal”, ela estava inventando o que mais tarde seria chamado de “fake news”. É por isso que se diz: - Quem usa deliberadamente de fake News é porque já vendeu sua alma ao capeta.
Etelvaldo Vieira de Melo

O XIS DO TEOREMA

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Imagem: revistacircuito.com
Recolhi ontem elementos importantes, querendo expressar ideias sobre duas películas recentemente assistidas: O Gênio e o Louco (The Professor and the Madman) e O Tradutor. Para efeito onomástico, chamarei às produções GL e T.

T gira em torno de um professor cubano (Rodrigo Santoro) sob crise de identidade, ao ter as aulas suspensas para, obrigado, traduzir do idioma russo mensagens de crianças vítimas do desastre de Chernobyl (atual Ucrânia), recepcionadas por Fidel Castro durante a Guerra Fria (1989). Falantes do espanhol, médicos e mães no hospital, assim, entenderão os pequenos pacientes. Ascensão e queda na economia da Ilha correspondem à ascensão e queda psicológica de Malin, Dramatis Persona. Rodrigo e Sebastián Bariusso didaticamente preconizam: Fidel é fiel!
GL, por sua vez, marca o encontro do Professor James Murray (Mel Gibson) com o Doutor W. C. Minor John Boorman (Sean Penn), esse último louco, sábio, artista. Planejam, aquele no ápice, este no calabouço, organizar pesquisando, mesmo condenados judicialmente, o Dicionário Oxford, acrescentando-lhe dez mil novos étimos desconhecidos na Inglaterra. Sanidade e loucura tornam-se equívoco social, quando da obtenção do livro desejado. Permanece o espectador com a incumbência de perguntar sobre o destino de ambos e suas famílias, sem conseguir prever o que o Diretor Fahrad Safina encobrirá debaixo de cenas sombrias, chiaroscuras. O imaginário viaja ao ritmo da obra de Simon Winchester.
 “Todo mundo é um gênio. Mas se você julgar um peixe por sua habilidade de escalar uma árvore, viverá sua vida inteira acreditando que é estúpido.” Tais palavras de Einstein (1920) teriam sua recíproca verdadeira na palavra grega Phármakon, tão ao gosto de Platão. Ela significa ao mesmo tempo remédio e veneno. Aproveito tais afirmativas, no intuito de conceber certa visão dos objetos escolhidos. Parto, sim, da premissa do Professor
James Murray: “Um de nós é o Gênio e o outro, o louco. Mas quem é quem?”.
Eis a indistinção épica entre GL e T, quanto à narrativa histórico-política. T parece surpreender a plateia, através do entusiasmo e eloquência durante a chegada de Mikhail Gorbachev a Havana. Crianças embandeiradas, flores, risos, comemoram a esperteza dos líderes russo e cubano, na colorida cena inicial. Então, advém a sequência de prosperidade do casal Malin/ Yoandra, junto ao filho Javi. A fartura no supermercado, a felicidade da família, o conforto da residência, equivalem à elocução do Castro. Porém, que inferno! O déficit comercial esvazia progressivamente os cofres da União Soviética, conduzindo-a à eventual falência. A URSS entra em colapso (1991) com a chegada de Boris Yeltsin ao poder, após um fracassado golpe que tentou derrubar Gorbachev, revertendo-lhe as reformas.
Consequentemente, Malin embebeda-se, machuca o braço, cai da bicicleta, consciente de não fazer o suficiente pelos internos de Chernobyl (aquela explosão do reator quatrocentas vezes mais radioativo que a bomba de Hiroshima). Idem, pela dor de nada ter a fazer, diante dos cânceres no hospital, na sociedade, na família separada. Isso é revelado no silêncio e no chiaroscuro utilizado na história sensível dos Bariusso. Somente a coadjuvante Gladys ocupa maior tempo de tela, ao tempo da finalização interativa URSS/Cuba.
Sumarizando: Quanto clima de autocontrole, reação aos problemas, sacrifício da classe média ilhada, faminta! Maricel/Gladys, excelente atriz/personagem, enuncia a solução para o trauma maliniano: “Ora, procure o Fidel!”. E o final? Beijos e abraços reconciliadores, imagens sonoras, conforme o espectador sonolento/ maçado imaginava. Nada de Bicho de Sete Cabeças, Santoro. Comparado com GL, T redescobre o caminho das Índias.
 Loucura igual genialidade continua até o derradeiro letreiro e número da realidade fictícia do diretor Farhad Safima. Onde, quando, por que a incongruência reinante?
Persistem na luta, sempre: Minor (fantástico Penn) enclausurado na letargia geral; James (fabuloso Gibson) às voltas com índices, signos, termos enigmáticos, processos judiciais. Amor, apenas subsiste o coletivo, sob a luz natural das tomadas de cenas, a maquiagem, o figurino da época. Esplendor, somente saber que esse foi o pano de fundo para a construção de uma ode à língua inglesa por entre homens e mulheres que viveram intensamente suas vidas no tombar do século XIX.
Suspense: Ser ou não ser didático no Brasil, eis a questão. Arremate: Politicamente, cubano/canadense versus inglês/mineiro, quem é quem misturado?
Pois é! Escreveram ‘Lição’, eu li BERDADE.
Graça Rios

MARCAÇÃO

Poucos jogadores de futebol entenderam que a "marcação alta" não consiste em subir com o beque adversário que tenta cabecear a bola e quebrá-lo lá em cima.
Ivani Cunha

NOVOS CHAVÕES PARA O BEM DA PÁTRIA AMADA BRASIL

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Regularmente uma vez por mês, nas manhãs de domingo, a campainha lá de casa toca. Pelo interfone, vejo que é alguém recolhendo donativos para a chamada “Campanha do Quilo”, iniciativa de associações espíritas que visa arrecadar alimentos para pessoas famintas e marginalizadas. Geralmente é um senhor – alto, usando óculos, de cabelos brancos e ascendência oriental – quem toca a campainha. Esses dois detalhes, ser alto e de ascendência oriental, chamam minha atenção. Dificilmente vejo um asiático alto; depois, penso que espiritismo kardecista não tem muito a ver com a cultura de lá.
Deixando de lado essas suposições, devo dizer que nem sempre atendo as chamadas. Muitas vezes, falta um macarrão ou coisa que o valha; outras vezes, sou tirado da cama e fico com preguiça de trocar o pijama e atender ao portão. Quando isso acontece, peço ao nosso cão, Thor, para avisar, através de latidos, que não tem gente em casa. Com aperto no coração, vejo pelo interfone o senhor caminhar para outra residência, com um embornal ao ombro.
Tempos atrás compartilhava a ideia de que “é preciso ensinar a pescar, em vez de dar o peixe”, ou seja, o assistencialismo não é um bom negócio, mais prejudica que ajuda. Hoje penso um pouco diferente, sei que não adianta dar a vara de pescar para pessoas para quem nem existe rio (e muito menos peixe), tal sua situação de miséria.
Tomado de compaixão dalailamática, aprendi a admirar os espíritas, eles que ajudam os mais necessitados sem a hipocrisia daqueles que só se lembram dos pobres por ocasião do Natal.
Geralmente, assim que faço a entrega da doação, recebo uma mensagem impressa, quase sempre de autoria de Francisco Cândido Xavier. A última se chama “Legenda” e diz assim:
Se nós pudéssemos colocar uma legenda na frente de cada conjunto residencial, de cada cidade, de cada aldeia, de cada metrópole, de cada grande capital do progresso humano, se nós pudéssemos e tivéssemos bastante autoridade para isso, escolheríamos aquela frase de Nosso Senhor Jesus Cristo, quando Ele nos disse:
“Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei”.
Como o Brasil está se tornando um país assumidamente religioso ((“Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”; “Brasil e Estados Unidos acima de tudo, Brasil e Es... acima de todos” – em novíssima versão), mesmo renegando o preceito do 5º mandamento (“Não Matar”), penso que seria interessante fixar legendas com preceitos bíblicos nas fachadas de instituições espalhadas pelo país. Desse modo, teríamos faixas dizendo assim:
Nas entradas das igrejas e dos templos: “Não amemos de palavras nem de boca, mas por ações e em verdade” (1 João 3:18).
Nós pórticos das agências bancárias: “Conservem-se livres do amor ao dinheiro e contentem-se com o que vocês têm” (Hebreus 13:5-6).
Nas Escolas: “A sabedoria deve ser prioridade em sua vida” (Provérbios 2), mas lembre-se: “A doçura no falar aumenta o saber” (Provérbios 16:23).
Nos tribunais de Justiça: “Quem semeia a injustiça colherá a desgraça” (Provérbios 22:8).
No Palácio do Planalto: “Seja forte e corajoso! Mãos ao trabalho! Não tenha medo nem desanime” (1 Crônicas 28:20).
Na fachada do Congresso Nacional: “Mas ponham à prova todas as coisas e fiquem com o que é bom. Afastem-se de toda forma de mal” (1 Tessalonicenses 5:21-22).
No Supremo Tribunal Federal: “Por que estão dormindo?” (Lucas 22:46).
Nas casas dos brasileiros: “Deus não é como eu penso. Ele é Amor” (1 João 4:8).
Etelvaldo Vieira de Melo

SÓ TRABALHO

Quando a situação econômica está desfavorável, o cidadão cabeça branca não deve parar
de trabalhar nem mesmo para ver o Sílvio Santos na TV.
Ivani Cunha
Área de anexos

DESESPERAR? JAMAIS

Eu sei, Freddy Krueger é o nome de um personagem de filmes de terror que, “após ser queimado por pais vingativos, passa a atacar adolescentes em seus sonhos, matando-os no mundo real por tabela” (informações da Dra. Wikipédia). Ao longo de horripilante série de 9 filmes, foi responsável pela perda de sono de muita gente. Inspirados na sua frase “é melhor você não dormir e dirigir”, publicitários brasileiros criaram esta outra: “se beber, não dirija”.
(Como se vê, no mundo na fantasia, nada se perde, tudo se copia).
Pois bem, longe de Springwood, Ohio, em plena selva amazônica, teve um bebê que, mais tarde, também iria receber o nome de Freddy Krueger. Já em seus primeiros dias de vida, foi esse Freddy tupiniquim arrancado dos pais e levado em cativeiro, junto com mais seis irmãos. Sua mãe reagiu bravamente, avançando contra os saqueadores, mas um tiro na cabeça a deixou arrebentada no chão.
Depois disso, as lembranças de Freddy se tornam imprecisas. Acha que foi jogado numa espécie de gaiola junto com os irmãos; em seguida, foram parar num lugar escuro. Ali, começou a sentir enjoo, com a sensação de que estavam num barco, com ondas balançando de lá para cá, de cá para lá.
Quando o balanço parou, viu a gaiola ser tampada por uma espécie de saco de aniagem. Daí para a frente, o sentimento que experimentou é que estavam rodando por estradas, ora de chão, ora de asfalto. Aí, perdeu a noção de tudo.
Quando voltou a si, viu que estava na cozinha de uma casa. Estava só, nem sinal de seus irmãos. Pessoas falavam aos gritos, com palavrões e risos. Um homem se aproximou de Freddy, seu hálito fedendo a cachaça.
- E aí, seu bebê chorão, espero que me devolva cada centavo que gastei com você – falou, enquanto jogava um prato de comida dentro da gaiola.
Freddy olhou para o prato com nojo. Era uma espécie de canjica. Mesmo com o estômago embrulhando, comeu aquela gororoba, pois se sentia faminto.
A partir desse dia, a vida de Freddy virou uma rotina de muitos sobressaltos. Seu “padrasto”, de nome Jasão, além de beberrão, traficava drogas. A casa era frequentada por toda espécie de gente: viciados, “mulas”, prostitutas. Ali o dia começava tarde, mas não tinha hora para acabar. Freddy, com uma corrente presa no tornozelo, ficava mais na área em frente à casa, ouvindo as conversas, os gritos, as risadas. Jasão tinha o costume de embriagá-lo para que ele “soltasse a língua”. E o que Freddy falava era só palavrão, o que fazia todo mundo rir. No entanto, de vez em quando o clima ficava alterado, com sopapos e até tiros.
Numa das frequentes confusões, apareceu a polícia. Houve intensa troca de tiros, um deles resvalando no rosto de Freddy. O resultado ele ficou sabendo depois: cego do olho direito e nariz deformado. Depois da batida, ele foi levado pela polícia até uma instituição.
Ali sua vida mudou para melhor. Mas as sequelas de sua história ainda o marcavam. Freddy continuou agressivo e violento. Só falava palavrão, quase igual aquele astrólogo, tido como guru de muitos políticos, como é o nome dele mesmo?
Em conversas, o diretor da instituição, que gosta muito de Freddy, costuma dizer:
- Esse aí é muito vida louca. Com tudo o que lhe aconteceu, não sei se é muito azarado ou muito sortudo.
O diretor começou a falar isso depois que a instituição foi invadida no dia 16 de abril, numa plena terça-feira. Três pessoas armadas “adentraram ao local” (segundo relato policial), renderam o guarda e sequestraram Freddy e um seu companheiro, além de roubarem um botijão de gás. Semana antes do roubo, Freddy havia apresentado um ferimento na perna. Ele não falou nada, mas funcionários da instituição desconfiaram que podia ter sido por uma mordida de cobra pequena, não peçonhenta.
Com tantas desavenças, não é que Freddy Krueger acabou voltando dois dias depois do sequestro?
Ao fim e ao cabo desta narrativa, é preciso dizer:
- Freddy Krueger é apelido; o nome verdadeiro do adolescente é Lourival Pittuco – o apelido decorre de seu gênio truculento, agressivo.
- Apesar da deformação no rosto - consequência do tiro, que o deixou cego do olho direito e lhe tirou um pedaço do nariz - Freddy se alimenta bem, “tem uma saúde de ferro”, comenta Ilair Dettoni, o tal diretor da “instituição”.
- Este texto se baseia em fatos, relatados pela Folha de São Paulo, do dia 29/04/2019. A reportagem é assinada por Raphael Hernandes. O título: “Papagaio que leva tiro, mordida de cobra e foi roubado volta sozinho para zoológico”.

- O zoológico é da cidade de Cascavel, na região Oeste do Paraná. Fiquei sabendo mais:  Em 2014, no mesmo zoológico, uma criança teve o braço arrancado por um tigre quando o pôs para dentro da grade - o pai do menino filmava a cena. Do mesmo zoológico já roubaram dois jacarés e araras. No último assalto, levaram um botijão de gás e dois papagaios - entre eles Freddy. Então, estou sabendo, com essa falta de assunto que anda me assaltando, é bom ficar bem atento às notícias do zoológico de Cascavel. Ali é um lugar de fortes emoções, Pittuco que o diga.
Etelvaldo Vieira de Melo

DARCY RIBEIRO, UM MINEIRO EM BUSCA DA IDENTIDADE NACIONAL


Maria da Graça Rios (1)
 “Darcy Ribeiro é um dos maiores intelectuais que o Brasil já teve. Não apenas pela alta qualidade do seu trabalho e da sua produção de antropólogo, de educador e de escritor, mas também pela incrível capacidade de viver muitas vidas numa só, enquanto a maioria de nós mal consegue viver uma.”
Antonio Candido, Folha de São Paulo

Falar sobre Darcy Ribeiro é sempre um desafio. Mineiro, de Montes Claros, foi um incansável estudioso, apaixonado pelo Brasil. De seu arrebatamento e inquietação com os problemas do povo brasileiro e fascínio pela antropologia social, proliferaram ideias e projetos que fizeram dele, mais do que um intelectual, um realizador, uma personalidade atuante na causa pela educação e cultura brasileiras.
Ele é um homem de causa. E causos. Daí o livro Maíra, pela salvação dos índios, escolarização das crianças, liberdade. Libertas quae sera tamen. Teve muitos fracassos, mais que vitórias. Pior seria ficar ao lado dos vencedores.
Um cruzado, com várias cruzadas na literatura, na etnologia, na humanidade do coração. Darcy das comunidades tribais, junto à natureza, aos pássaros, às matas e rios. Nesses mananciais, sonhou projetos de várias qualidades. Darcy Ribeiro, Uirá Sai à procura de Deus (74), anjo vestido com a Arte plumária dos índios Kaapor (57), O  conhecido  dos Urubus-Kaapor​ ​, em Diários índios​ ​ (96).
Grande Ribeiro, escrevedor de inglês of the American Peoples. Antropólogo tenaz, tentando entender o Dilema da América Latina (78). Como ficará a modernidade, com as Teorias sobre a Nação? Os processos de formação e as causas do desenvolvimento são apenas etapas da evolução sociocultural em 1968 ou em 2015. O jeito é resgatar o Sentido do Brasil​ ​ (95).
Os romances profundíssimos do autor focalizam o amor e o óbvio, mas vão Aos trancos e barrancos (85), por meio de Testemunho (90) e acabam transformando uma Utopia Selvagem (82) em esperança de paz e alegria.
O Mulo (81) e o Migo (88) relatam O problema do Brasil (95), e o escritor entende que o caminho venturoso só será encontrado quando o homem conseguir obter Noções de coisas (95).
O Brasil, todos sabem, é um dos países mais miscigenados do mundo. Essa diversidade é resultado da contribuição de diversos povos que formam sua identidade. O que define um povo não é só a demarcação territorial, mas a “Nova Roma”, expressão de Darcy Ribeiro, carismática e construtora.
Em sua obra, o cunhadismo, antiga prática indígena, relaciona os nascidos na Pátria num mesmo laço de sangue. Os homens e as mulheres, todos são iguais, na mestiçagem, na linguagem importada e local, na mamãe negra que alimentou e embalou as crianças e que constitui uma imagem sagrada para o patrimônio nacional. O nheengatu, o tupi, o banto, o iorubá ficam presentes no português ouvido e escrito pela narrativa do autor e pelos falantes- leitores de sua inolvidável obra.
Vasta prosa Kadiwéu (50) ensaia o saber, o azar, a beleza do que há no universo florido e perfumoso do Senhor.
Então surge, no horizonte de Brasília, a Capital do país, um Plano orientador de Universidade (62). Que seja um espaço caudaloso de ensino e aprendizagem, fruto de condições financeiras e de professores concursados pelo seu conhecimento e pesquisa. 
Segue o ribeirão a se dar com suas Propuestas acerca de la renovación (70) e vai viajando para o Peru, para as Ciências d’Alger, até abranger o conceito de que aqui a Nossa Escola é uma calamidade. ( 84)
Como chegar à Universidade do Terceiro Milênio (84)? Visitando e descrevendo O Norte Fluminense (93)? Andando pelo descaminho (78) até alcançar a Universidade Necessária (69)? Tudo vale a pena, se a alma não é pequena, como disse Fernando Pessoa. A finalidade maior é tomar, com o leitor, um ótimo Café com Sociologia.com (blog com 93.086 acessos).
Para o antropólogo, a contribuição da cultura negra estaria no plano ideológico de sua obra, na força física dos jovens e adultos, nas crenças religiosas dos Estados, na gastronomia e na sensibilidade adquiridas da civilização africana. Os índios igualmente compareceram no dicionário e nos costumes do Brasil.
No perseverante trabalho do escritor perpassa a música do vento, dos violinos, dos moinhos tocando milho, do encantamento auditivo de uma gente que orquestra sinfonias nas palavras de sua boca, mesmo estando na “ninguendade” dos caribocas, dos caboclos, dos mulatos, dos imigrantes alemães, portugueses, franceses e outras nacionalidades.
O Brasil crioulo (do litoral de São Luís do Maranhão ao Rio de Janeiro), o Brasil caboclo (da região Norte com a Amazônia e os índios), o Brasil sertanejo (do Nordeste, sertão, caatinga), o Brasil caipira (do Centro-Oeste, Sudeste, São Paulo) e o Brasil sulino (dos Pampas gaúchos) sempre estiveram na memória de Darcy, em busca da democracia social. Algum dia haverá o Paraíso?
E a estratificação de classes, e a diferença entre ricos e pobres, e a concentração da riqueza nas mãos de poucos, e a desumanização das relações de trabalho, como ficariam lá pelos anos 2016?
Afinal, o povo sempre se reinventa e crise é sinônimo de oportunidade, em grego. Porque a questão do país sempre passou pela capacidade criativa dos brasileiros.
Darcy pensava que o investimento na educação seria a quebra das correntes escravas, o verdadeiro descobrimento de qualquer nação. Anistiado em 1980, coordenou um Plano Especial de Educação, criou a Biblioteca Pública Estadual, a Casa França-Brasil. Imagine o leitor deste texto que Darcy chegou a implantar o Sambódromo, com duzentas salas de aula para fazê-lo funcionar como uma extensa rede primária.
Para tamanho esforço, pouca recompensa. Mas o que importa, é que o seu nome atravessará o tempo e já anuncia, no século passado, que as futuras gerações se lembrarão dele, o DR, doutor das letras e dos membros da sociedade brasileira.
Sua trajetória sempre esteve próxima às lideranças dos governos, sendo inevitável sua participação na vida política, fato que o tornou vulto da recente História do Brasil. 
Exilado, preso, nada impediu que continuasse sua luta pela educação no país e na América Latina. Influenciado por outro grande educador, o professor Anísio Teixeira, trabalhou incansavelmente para melhoria do ensino e para a sua universalização. 
Sua produção deixou marcas no país. Concebeu e executou projetos inovadores para a rede pública de ensino. Com uma nova proposta educativa criou os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), no Rio de Janeiro.
Também, para confirmar sua presença, foi um sábio maior, reitor da Universidade de Brasília. 
Para tão grande amor, tão curta a vida. O querubim subiu ao céu, muito doente, e foi ministrar aulas para os santos em tupi-guarani. Dizem os biógrafos que todos acham muita graça em suas narrativas e lhe cochicham rindo e sambando que ele nunca vai precisar pedir licença a São Pedro bonachão para começar suas infinitas pesquisas.
Numa ocasião, indagado por que, a despeito de todas as condições favoráveis, o Brasil ainda não dera certo, respondeu que “para superarmos o que nos amarra, é imperioso saber quem somos, qual a gênese de nossa formação e no que ela resultou.”
Darcy Ribeiro é como seu próprio nome: caminha na História, com as águas claras do saber.

Obras consultadas:

Arte Plumária dos índios Kaapor (1957).

Uirá Sai, à procura de Deus (1974).
O Dilema da América Latina (1978).
Kadiwéu – Ensaios etnológicos sobre o saber, o azar e a beleza (1950).
O Brasil como problema (1950).
Diários índios – os urubus-Kaapor (1996 – Companhia das Letras).

Nota: Os números entre parênteses se referem às datas em que os trabalhos foram publicados




[1] Mestre em Literatura Brasileira pela UFMG. Autora de 10 livros publicados. Professora aposentada do Centro Pedagógico da UFMG.

RÁDIO É PURA INVENÇÃO

Convém ficar atento ao rádio porque a cada instante você pode receber uma informação de fundamental importância.
Ivani Cunha

PÉS DESCALÇOS


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Imagem: eustaqiotolentino.espinosa.blogspot.com

Fátima Fonseca está lançando seu livro “Pés descalços: Infância na roça” pela Amazon, agora em formato digital. Através de poemas curtos, de mais pura poesia, a autora faz – assim mesmo, de pés descalços – uma visita aos tempos de infância na roça, com seus dias compridos, cheios de histórias e fantasias. Um livro primoroso, que indico vivamente. Através de suas páginas, ficamos sabendo como o ser humano desaprendeu de ser feliz, abrindo mão da simplicidade, das alegrias das pequenas coisas da vida.
Pedi a Fátima que indicasse um poema para ilustrar a publicidade do livro. Ela me respondeu: - Qualquer um, mas escolha um pequeno, que as pessoas hoje são preguiçosas.
Contrariando sua recomendação, escolhi dois dos maiores, que falam um pouco de sua visão do que é ser feliz.
O link de endereço está logo abaixo. O preço do livro também é baratinho como a própria felicidade: somente R$4,99.

A FELICIDADE ESTÁ NA SIMPLICIDADE
Quando eu morava numa casa velha, telhados com goteiras, quintal com árvores frutíferas, cacimba com águas brotando nos fundos e vários animais, sonhava com a cidade grande e desejava morar em um apartamento.
Quando eu tinha bonecas de pano, carinhas bordadas feitas pelas mãos de minha avó, sonhava com bonecas de louça com olhos de vidro.
Quando eu bebia água na bica com a concha de minhas mãos, achava “que bom seria tomar água em taças de cristal”.
Quando eu andava a cavalo e carro de boi, sonhava com os veículos motorizados, escadas rolantes e elevadores.
Quando eu tomava banhos em rios e cachoeiras, sonhava nadar em piscinas.
Perdi a conta dos “quandos”, acho-me perdida nesse tempo que vivi querendo partir, quando tudo era perfeito dentro das imperfeições do meu querer.
Hoje o cerrado não é mais o mesmo quando ouve os estalos dos meus passos ao regresso sobre as folhas secas.
A felicidade está na simplicidade, mas é em vão dizer isso: um dia a gente acaba por descobrir.


FELICIDADE
A menina acordava
com remela nos olhos,
cabelos espigados, vestes amarrotadas.

- Uai, menina, cê saiu de um borralho?
- Não! É que a felicidade é assim mesmo,
desalinhada,
moda derramada.

A menina era feliz,
acordava girassolada,
lá fora o dia a esperava
para ser poeira, vento, borboleta.
Correr como quem canta
até o poente cansar,
viver como se aquele dia
fosse tudo que tinha na vida.
Fátima Fonseca