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Recolhi ontem
elementos importantes, querendo expressar ideias sobre duas películas recentemente
assistidas: O Gênio e o Louco (The Professor and the Madman) e O Tradutor. Para efeito onomástico,
chamarei às produções GL e T.
T gira em
torno de um professor cubano (Rodrigo Santoro) sob crise de identidade, ao ter
as aulas suspensas para, obrigado, traduzir do idioma russo mensagens de
crianças vítimas do desastre de Chernobyl (atual Ucrânia), recepcionadas por
Fidel Castro durante a Guerra Fria (1989). Falantes do espanhol, médicos e mães
no hospital, assim, entenderão os pequenos pacientes. Ascensão e queda na
economia da Ilha correspondem à ascensão e queda psicológica de Malin, Dramatis
Persona. Rodrigo e Sebastián Bariusso didaticamente preconizam: Fidel é fiel!
GL, por sua
vez, marca o encontro do Professor James Murray (Mel Gibson) com o Doutor W. C.
Minor John Boorman (Sean Penn), esse último louco, sábio, artista. Planejam, aquele
no ápice, este no calabouço, organizar pesquisando, mesmo condenados
judicialmente, o Dicionário Oxford, acrescentando-lhe dez mil novos étimos
desconhecidos na Inglaterra. Sanidade e loucura tornam-se equívoco social,
quando da obtenção do livro desejado. Permanece o espectador com a incumbência
de perguntar sobre o destino de ambos e suas famílias, sem conseguir prever o
que o Diretor Fahrad Safina encobrirá debaixo de cenas sombrias, chiaroscuras.
O imaginário viaja ao ritmo da obra de Simon Winchester.
“Todo mundo é um gênio. Mas se
você julgar um peixe por sua habilidade de escalar uma árvore, viverá sua vida
inteira acreditando que é estúpido.” Tais palavras de Einstein (1920)
teriam sua recíproca verdadeira na
palavra grega Phármakon, tão ao gosto de Platão. Ela significa ao mesmo tempo
remédio e veneno. Aproveito tais afirmativas, no intuito de conceber certa
visão dos objetos escolhidos. Parto, sim, da premissa do Professor
James
Murray: “Um de nós é o Gênio e o outro, o louco. Mas quem é quem?”.
Eis a indistinção
épica entre GL e T, quanto à narrativa
histórico-política. T parece surpreender
a plateia, através do entusiasmo e eloquência durante a chegada de Mikhail Gorbachev
a Havana. Crianças embandeiradas, flores, risos, comemoram a esperteza dos líderes
russo e cubano, na colorida cena inicial. Então, advém a sequência de
prosperidade do casal Malin/ Yoandra, junto ao filho Javi. A fartura no
supermercado, a felicidade da família, o conforto da residência, equivalem à elocução
do Castro. Porém, que inferno! O déficit comercial esvazia
progressivamente os cofres da União Soviética, conduzindo-a à eventual falência. A URSS
entra em colapso (1991) com a chegada de Boris Yeltsin ao poder, após um fracassado golpe que tentou derrubar Gorbachev,
revertendo-lhe as reformas.
Consequentemente, Malin embebeda-se, machuca o braço, cai
da bicicleta, consciente de não fazer o suficiente pelos internos de Chernobyl
(aquela explosão do reator quatrocentas vezes mais radioativo que a bomba de
Hiroshima). Idem, pela dor de nada ter a fazer, diante dos cânceres no
hospital, na sociedade, na família separada. Isso é revelado no silêncio e no
chiaroscuro utilizado na história sensível dos Bariusso. Somente a coadjuvante Gladys
ocupa maior tempo de tela, ao tempo da finalização interativa URSS/Cuba.
Sumarizando: Quanto clima de autocontrole, reação aos
problemas, sacrifício da classe média ilhada, faminta! Maricel/Gladys,
excelente atriz/personagem, enuncia a solução para o trauma maliniano: “Ora, procure
o Fidel!”. E o final? Beijos e abraços reconciliadores, imagens sonoras, conforme
o espectador sonolento/ maçado imaginava. Nada de Bicho de Sete Cabeças, Santoro. Comparado com GL, T redescobre o
caminho das Índias.
Loucura igual
genialidade continua até o derradeiro letreiro e número da realidade fictícia
do diretor Farhad Safima. Onde, quando, por que a incongruência reinante?
Persistem na luta, sempre: Minor (fantástico Penn)
enclausurado na letargia geral; James (fabuloso Gibson) às voltas com índices,
signos, termos enigmáticos, processos judiciais. Amor, apenas subsiste o
coletivo, sob a luz natural das tomadas de cenas, a maquiagem, o figurino da época.
Esplendor, somente saber que esse foi o pano de fundo para a construção de uma
ode à língua inglesa por entre homens e mulheres que viveram intensamente suas
vidas no tombar do século XIX.
Suspense: Ser ou não ser didático no Brasil, eis a
questão. Arremate: Politicamente, cubano/canadense versus inglês/mineiro, quem
é quem misturado?
Pois é! Escreveram ‘Lição’, eu li BERDADE.
Graça Rios
3 comentários:
Interessante! 👏👏👏👏
Parabéns Graça! É uma comparação muito inteligente, irônica e atual .
Como sempre vc arrasa nos seus textos. Parabéns!
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