O BÊBADO E O BALCONISTA - UMA FÁBULA NEBULOSA
Em
homenagem a Millôr Fernandes (+27/03/2012) e Aldir Blanc (+04/05/2020)
Esta história é do tempo de
antigamente (você ainda se lembra?), quando as pessoas saíam de casa, andavam
pelas ruas e frequentavam os botecos...
Fridundino Pedroso era
alcoólatra e morador de um pequeno lugarejo chamado Rua Comprida. Tal nome se
deve ao fato da cidade ser constituída por uma única rua, formada por algumas
centenas de casas.
Você sabe como é um bêbado:
quando encontra alguém pela frente, logo vem com aquela conversa esquisita,
aquela fala arrastada, fica pegando no seu braço e cuspindo no seu rosto, com
aquele hálito de matar até defunto.
Felizmente, toda regra tem
suas exceções e Fridundino era uma delas: tratava-se de um cachaceiro manso,
voltado para si mesmo e que pouco incomodava as pessoas. Todos os dias, fazia
seu giro pelos botecos, iniciando e fechando sua rodada no chamado Bar do
Belderagas. Em todos os lugares, o ritual era simples e de poucas palavras:
retirava do bolso do paletó um copo (na verdade, uma cuia formada pela metade
de pequena cabaça), onde o dono do boteco despejava uma dose de cachaça. O
valor era debitado e depois pago pelos parentes, uma vez que Fridundino era de
família estribada – expressão nordestina, embora o caso acontecesse no interior
das Minas Gerais.
Parece que ele não era
pessoa religiosa, pois nunca foi visto despejando uma gota sequer de bebida
para os santos. De qualquer modo, lá ia tocando sua vida sem maiores sobressaltos,
a não ser por pequenos tropeços e uma ou outra queda pelas poeirentas ruas da
cidade.
Aconteceu, porém, o dia em
que Fridundino desapareceu de Rua Comprida, ficando ausente por quase dois
meses. Quando voltou, estava corado, bem disposto e até tendo engordado alguns
quilinhos. Todo mundo quis saber o motivo do sumiço. Foi justamente isso que
lhe perguntou Belderagas, quando Fridundino retornou ao seu bar.
- O que aconteceu foi que
comecei a me sentir muito mal – explicou nosso personagem, enquanto passava uma
vista d’olhos pelas placas decorativas espalhadas pelas paredes do boteco (uma
delas dizia: “Eu bebo pra ficar ruim, se
fosse pra ficar bom eu tomava remédio”; outra falava assim: "Evite a ressaca, mantenha-se bêbado”;
já uma terceira aparecia com destaque por detrás do balcão: “Promoção!!! Peça fiado e ganhe um Não!”).
– Imagina você – continuou
Fridundino: - estando sentado naquela cadeira ali – e apontou para uma cadeira
de plástico, junto a uma mesa – de repente, vi passando na minha frente um
tatu. Pensei comigo: Cara, você está ruim mesmo, está delirando, vendo
fantasmas. É bom ir para a capital e se tratar. Foi o que fiz, e este é o
motivo de minha ausência da cidade.
- Por que você não me disse
na hora? – foi logo interrompendo Belderagas, dando boas risadas. – Acontece
que eu tenho mesmo um tatu aqui em casa. - Dirigindo-se à sua mulher,
acrescentou: - Vai, Radigunda, traga o tatu para que o nosso amigo possa ver.
Saiu Radigunda, que voltou
daí a pouco, trazendo em seu colo um tatu.
- Trata-se de um tatu de
estimação, bem manso, como está vendo – explicou Belderagas, passando a mão no
couro do animal.
Fridundino se aproximou do
tatu e, de dedo em riste, falou bravo:
- Seu fdp cascorento. Por
sua causa, achei que estava ficando doido. Vai, Belderagas, desce todas as
garrafas de pinga da prateleira, que vou descontar o atraso e tirar a barriga
da miséria.
E assim ele fez, bebendo
todas.
Moral:
Ao tomar uma decisão mais radical, veja se não tem um tatu pelas proximidades.
Nota Complementar: Devido
ao aumento do consumo de bebidas alcóolicas, esta moral não vale para os tempos
de pandemia. Muita gente já está vendo tatu pela frente.
Etelvaldo Vieira de
Melo
1 comentários:
Boa tarde! É tem gente ficando barrigudo, de beber dentro de casa. Magda
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