Quando fiquei sabendo que o general
Eduardo iria dividir seu precioso tempo entre as agruras do Exército e os não
menores percalços do Ministério da Saúde, em insofismável demonstração de
altruísmo e amor à pátria, pensei com meus borbotões: - Coitada da covid,
lascou de vez! Agora, com nosso especialista em Logística, esse vírus
peçonhento vai saber o que é bom para a febre e para a tosse. Vai ser só o Edu
determinar a Hora “D” do Dia “H” para o bolota (do vírus) implodir de vez (o
vírus, não o Riocentro).
Outra coisa que a atitude do Eduardo
veio resgatar foi minha combalida crença no ser humano. Nos últimos tempos, com
muitos indivíduos, especialmente da classe militar, aderindo ao desgoverno que
está aí, a troco de “emprego” na máquina pública, ficou circulando nas redes
sociais o antigo ditado de que toda pessoa se vende, só é preciso saber por
qual preço. Ao ver a destemida coragem de Edu de pegar a danada da covid pelos
chifres, pensei: “- Esse aí não! Esse aí está agindo motivado pelo amor para
com seus compatriotas”. Com lágrimas nos olhos, desejei todo sucesso para o
ministro em sua empreitada (lágrimas que não eram de crocodilo e nem de jacaré
de papo amarelo, juro).
Também não deixei de reconhecer os
méritos do presidemente. Depois de duas tentativas de nomear médicos para o
ministério, viu que médico não está com nada mesmo, já que são poucos os que
aderiram à cloroquina e ao “tratamento precoce”. Na guerra contra a pandemia, o
certo mesmo era empregar um militar, com especialidade em estratégia, em
logística.
No início de sua empreitada, tomado de
ingenuidade, Dudu tentou negociar a compra de vacinas. No entanto, Ja-ir
advertiu-lhe:
- Alto lá, Pazu! A logística da vacina
tem de ser de faz de conta. O que queremos mesmo é atingir a imunidade de
rebanho. Para isso, o que você precisa implementar é a desova dos milhares de
comprimidos de cloroquina produzidos pelo laboratório do Exército. Além do
mais, meu amigo Trumpinho está enviando dos Estados Unidos uma remessa de dois
milhões desses comprimidos, com prazo de validade a expirar. Então, sua
logística deve estar centrada em fazer chegar esses comprimidos até os grotões
do país, talquei?
- Está certo, Boró. Um manda e o outro
obedece – falou Edu, com os olhos brilhando com a mais pura alegria.
E, assim, foi Dudu propalando o tal do tratamento
precoce, distribuindo o tal de “kit covid” [difosfato de cloroquina,
hidroxicloroquina e fosfato de oseltamivir (o tal tamiflu)] entre as populações
carentes e desinformadas.
O Barão de Itararé já dizia: “Tudo seria
fácil se não fossem as dificuldades”. E foi isso que aconteceu: a certa altura do campeonato, não sei precisar
por quais razões ocultas, Eduardo encontrou uma pedra no caminho de sua nova
empreitada como ministro. Depois de ter estado no estado do Amazonas e
respirado seus ares, foi surpreendido com a falta de ar nos leitos dos
hospitais. Junto com essa pedra da falta de ar, outras pedras começaram a
surgir no caminho de Edu, de modo que todo mundo começou a atirar pedras no
pobre coitado, fazendo lembrar aquela música do Chico, a Geni. Tantas pedras foram
atiradas, que Dudu não resistiu e teve que entregar o boné. Com isso, foi de
todo impossível ao general-ministro, ele que era tão competente em sua
logística, desferir um tiro de fuzil no danado do vírus, matando-o com uma bala
de prata.
Depois de ser exonerado, Eduardo
participou de um ato político com Ja-ir no Rio de Janeiro. Como o Estatuto das
Forças Armadas proíbe participação de militares da ativa em atos políticos, o
ex-ministro acabou sofrendo processo disciplinar, mas foi absolvido. Quer
dizer: o Exército ‘despuniu’ o punível, fazendo de conta, assim, que não era o
que tinha sido, compactuando-se com o ilegal e imoral. Fez valer a máxima de
que toda regra tem exceção e que, no Brasil de hoje, mais vale a exceção do que
a regra.
O inusitado disso foi que o Exército, ao
arquivar o processo, impôs sigilo de 100 anos, sob a alegação de que a apuração
continha dados pessoais. Assim agiu nosso histórico Exército, varrendo para
debaixo do tapete uma improbidade, seguindo o brilhante exemplo de Ja-ir, cuja
carteira de vacinação ficará em sigilo por um século também. Para se entender a
disparidade entre os tempos de sigilo no Brasil e mundo afora: A Agência
Espacial Brasileira (AEB) oculta pesquisas sobre foguetes por cinco anos;
papéis americanos sobre a ditadura brasileira foram mantidos ocultos por 41
anos e 11 meses. A depender dos militares aqui no Brasil, o trabalho de um
historiador é tarefa estéril, a não ser que ele tenha acesso aos tapetes das
repartições públicas e militares...
Ao fim de tudo, o general Eduardo, ainda
conseguiu uma “boquinha” na máquina amiga do desgoverno: o de secretário de
Estudos Estratégicos da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos da
Presidência da República (ainda bilocando entre duas repartições, tal qual São
Martinho de Porres). Como se pode observar, Du continua firme e forte na sua
especialidade de estrategista. Ele vai receber R$ 16.944,90 ao mês, valor que irá
se somar ao seu modesto salário de general do Exército. Essa é uma logística
pra ninguém botar defeito. Arre!
P.S. Considero compreensível alguém
procurar se ajeitar na vida, desde que não seja à custa de outras vidas. De
forma trágica, o Brasil bate recordes de mortes por conta da covid. E isso
acontece mais por conta da irresponsabilidade, da incompetência e do descaso
com que a doença é tratada, especialmente por quem deveria, através de exemplos
e atitudes, estar à frente no seu combate. Não é isso, caro Leiturino?
Etelvaldo Vieira
de Melo