GAFANHOTO E O MESTRE PÓ

 

Tenho o costume de compartilhar semanalmente com meus afetos e alguns desafetos determinada mensagem. Desta vez, foi uma citação de Lao-Tsé (“Para ganhar conhecimento, adicione coisas todos os dias; para ganhar sabedoria, elimine coisas todos os dias”). Tal pensamento me proporcionou a seguinte reflexão: “Sapiência: Ter equilíbrio entre as adições e as subtrações. Que você seja sempre feliz nessa aritmética da vida”.

Algumas pessoas reagiram a esta mensagem, como por exemplo:

- Genésia Solaris: “Nossa! Excelente reflexão! Estou tentando fazer isso neste início de 2022.”

- Renevildo Ruzac: “Depois de aprender que é importante enxergar sempre a beleza das coisas, deixando a feiura de lado, estou vendo que também importa saber usar a matemática da vida com inteligência e equilíbrio.”

- DB Cristhaldo: “Eliminar a banha que é o problema, seu Lao.”

Ao que respondi: “Gafanhoto, a banha que sai é a mesma que entra. Como querer eliminar aquilo que você permite que entre?

- Profunda sapiência, - retrucou Cristhaldo.

Lendo esses comentários, lembrei-me de um manuscrito que guardo comigo, datado de 1827, um diálogo entre Gafanhoto e o Mestre Pó. Ei-lo:

 

- Mestre, o que é conhecer?

- Conhecer é você adicionar coisas ao seu saber. O resultado disso é chamado de conhecimento.

- E a sabedoria?

- Nem todo conhecimento se torna saber. Sabedoria é você descartar o conhecimento que não é saber.

- Quando o conhecimento deixa de ser saber?

- O conhecimento está a serviço da vida. Ele não tem um propósito em si mesmo, isto é, não procuramos conhecer por conhecer. O conhecimento deixa de ser saber quando perde o seu sabor.

- Quer dizer que sabedoria é o conhecimento saboroso?

- Podemos assim dizer. Mas a sabedoria não se constitui exatamente o ato de subtrair coisas. Esse ato é chamado de sapiência.

- Mestre, tenho uma certa dificuldade em entender o que é o conhecimento.

- O conhecimento é tudo aquilo que você torna seu, e é somente tudo aquilo que você pode tornar seu. Tornar seu no sentido de possuir, não simplesmente de ter.

- Pelo que estou entendendo, mestre, possuir vai muito além do simplesmente ter.

- Exato. Está aí a razão da infelicidade de muitas pessoas. Nem sempre o que você tem, você poderá possuir. O sábio descarta aquilo que não pode possuir.

- É por isso que o sábio é leve, já que não carrega coisas sem utilidade, não é isso, mestre?

- O conhecimento – tudo aquilo que você torna seu, volto a repetir – está a serviço da vida. Muitas pessoas acumulam coisas que quase nada atendem às suas necessidades. O resultado disso é que teremos conhecimentos supérfluos para vidas vazias.

- Mestre, o conhecimento pode ser confundido com informação?

- A informação fornece subsídios para o conhecimento, mas não é conhecimento. Conhecemos quando introjetamos, tornamos nossa a informação que nos é passada. Acontece muito hoje: pessoas que convivem com informações, vivem abarrotadas de informações, sem tomarem conhecimento, sem ciência e muito menos consciência.

- E qual o resultado disso?

- Pessoas informadas, e até mesmo bem informadas, sem, contudo, terem conhecimento das coisas.

- Correm o risco de viverem a ilusão de acharem que sabem, quando, na verdade, nada sabem, não é?

- Quando confundem a informação com o conhecimento, quando trocam o conhecimento pela informação, as pessoas correm o risco de moldarem suas vidas por explicações (razões) que não lhes são próprias. Abrem mão de suas individualidades, passam a ter comportamento de massas. Tornam-se indivíduos massificados, coisificados.

- Pelo que estou vendo, precisamos ter cuidado com as informações.

- O primeiro filtro para elas é o conhecimento, que é o ato de tomar ciência. O seguindo filtro é o ato de avaliar se aquele objeto de ciência atende às necessidades da vida. É isso que chamo de re-flexão, esse voltar-se do indivíduo para dentro de si mesmo. Quando o conhecimento atende a uma necessidade, e não simplesmente a um desejo, ele se transforma em saber, sabedoria.

- Obrigado, mestre Pó, por suas sábias palavras.

- Não tem de quê, caro Gafanhoto. Lembre-se: a vida sem reflexão não merece ser vivida. A reflexão é o oxigênio da vida. É por isso que ela se torna perigosa, ao permitir o pleno exercício da liberdade.

Etelvaldo Vieira de Melo


5 comentários:

Anônimo disse...

A sabedoria é infinita… nela, numa pequena parte se inclui o conhecimento e o modo de agir…. mas nos apossamos de um galho e pensamos que é a árvore inteira. Através do conhecimento da parte, não podemos nunca perceber a alegria do todo... daí o intelecto é um entrave… que deságua em infelicidade e quilos de remédios para suportar a falta de sabedoria. O intelecto nunca pode conduzir ao todo, pois ele é apenas um segmento, uma pequena parte.
Valéria

Anônimo disse...

Kkkk muito bom. Tô ficando famoso.
Que belo texto. Bem complicado, não só pro pequeno gafanhoto, distinguir o que informação, sabedoria, conhecimento, fake News e etc. e etc. com o advento da internet. Realmente, recebemos muita informação o tempo todo, e é necessário saber adquirir e eliminar o que nos faz leve e feliz.
Renê Uzac, o Renevildo

Anônimo disse...

"pessoas que convivem com informações, vivem abarrotadas de informações, sem tomarem conhecimento, sem ciência e muito menos consciência."
Uma excelente reflexão nessa trecho!
Eduardo Yamassaka

Anônimo disse...

Crônica maravilhosa. A gente precisa de sabedoria para que o conhecimento adquirido seja realmente algo que leve à felicidade individual e coletiva. Saber descartar o inútil. Abraços. Parabéns!
Marcos G. Soares

Geraldo Uzac disse...

Caro Téo ,- agora estou ficando íntimo - , o segredo é aprender a separar o joio do trigo. As redes sociais, e a mídia em geral, enchem as nossas cabeças de informações, na maioria das vezes, inúteis e sem conteúdo

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