De tanto ver triunfar as
nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça;
de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a
desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.
- Rui Barbosa
Afinal,
Bolsonaro tem ou não tem direito de ficar com as joias amealhadas durante o
período em que esteve presidente da república? Esta foi a pergunta que me fiz
logo que o TCU (Tribunal de Contas da União) “decidiu” que Lula poderia ficar
com o relógio ganho em 2005 e, por via de consequência - como gostava de falar
Aureliano Chaves - Bolsonaro também poderia ficar com as joias e os afins com
que foi brindado ao longo de seu longo mandato.
Outra
pergunta que me faço é esta: agora que já não é mais presidente, Bolsonaro
continua recebendo uns agrados dos outrora amáveis xeques árabes?
Uma
coisa que salta aos olhos e que merece consideração é a necessidade de se fazer
uma distinção entre pessoa física e representante de Estado. Um presente doado
a um representante de Estado, enquanto tal, pertence ao Estado. É isso que diz
a Lógica e diz também o bom senso. Se, depois de deixar a presidência,
Bolsonaro continua recebendo joias, caixas de leite condensado e Pix, aí já é
outra questão; tais agrados são seus de direito, uma vez que se esforçou tanto
para ser um mito de tanta gente.
Esta
última consideração esconde algo que aconteceu com os ilustres membros do TCU,
fugindo de suas atribuições e confrontando a própria Constituição, ao doarem um
“presente” para o amigo Bolsonaro, liberando-o para fazer usufruto das joias,
que eram do Estado. Elas eram tanto do Estado que, quando quis vendê-las lá nos
Estados Unidos, ele agiu como se fosse um autêntico ladrão, fazendo tudo na
surdina, acobertado por militares.
Se pelo
lado da Moral Bolsonaro não tem direito às joias, a questão fica em dúvida pelo
aspecto legal. Isso porque nem sempre o que é legal é moral, e o que é moral
nem sempre é legal. Pesquisando sobre o tema, vi que a proibição de
ex-presidentes se apropriarem de presentes, com a exceção daqueles considerados
personalíssimos, de consumo direto e de baixo valor monetário, foi do próprio
TCU, em 2016, com base na Constituição, o que fazia todo sentido. Agora o mesmo
TCU vem mudar a decisão, com o único objetivo de ajudar o amigo e mito
Bolsonaro. Será que esse pessoal não tem o que fazer? Se ele é um órgão que
auxilia o Poder Legislativo, analisando e julgando as contas dos
administradores de recursos públicos federais, não poderia fazer parte de suas
atribuições fiscalizar a destinação das verbas secretas e camufladas recebidas
por deputados e senadores, por exemplo?
Divagando
um pouco, eu me pergunto o que Rui Barbosa, criador do TCU em 1890, haveria de
dizer para seus atuais membros. Talvez esta: “... se foi para abusar da minha
alma prosopopeia, juro pelos tacões metabólicos dos meus calçados que dar-te-ei
tamanha bordoada no alto da tua sinagoga que transformarei sua massa encefálica
em cinzas cadavéricas”.
Já se
considerando dono das joias recebidas dos árabes, Bolsonaro diz que pretende fazer
rifa de uma delas e doar o dinheiro arrecadado para a Santa Casa de Juiz de
Fora, que o socorreu quando levou aquela famosa facada.
Aproveitando
a ideia, relaciono outras rifas que poderá promover, como forma de
agradecimento a todos aqueles que o ajudaram a chegar à presidência da
república:
-
Leiloar uma joia em favor do Agronegócio, para que comprem uma máquina de
beneficiamento de soja;
-
Leiloar uma joia em favor daqueles pastores, padres e religiosos, que tanto
contribuíram a seu favor nas igrejas e templos, pregando a mentira para os
fiéis devotos;
-
Leiloar uma joia em favor de um fiel devoto, amortecendo assim sua contribuição
com o dízimo pelo período de 7 anos;
-
Leiloar uma joia em favor de Sérgio Moro, Dallagnol e demais membros da antiga
Lava Jato, eles que tão bem ensinaram a máxima de que “os fins justificam os
meios”, levando Bolsonaro a usar da mentira de forma compulsiva;
-
Leiloar uma joia em favor dos banqueiros, como forma de pedido de desculpas por
não usar o sistema bancário formal, mas preferir fazer transações com dinheiro
vivo;
-
Leiloar uma joia em favor da classe dos militares, pelo irrestrito apoio ao
longo desses anos, para a compra de picanha, filé, caviar, uísque e outras
coisas mais;
- Enfim,
leiloar uma joia em homenagem aos ‘tios e às tias do Whatsapp’ (com o ganhador
sendo sorteado através dessa querida Rede), eles que se empenham tanto em favor
da preservação dos valores da Tradição, Família e Propriedade.
Nota:
Para cobrir os custos operacionais, haverá um desconto de 51% sobre o valor
arrecadado em cada rifa.
Pensando
melhor, acho que Bolsonaro não deve leiloar nada. Afinal, as joias são dele e
foram conquistadas com o suor de seu árduo trabalho. Depois, é preciso
considerar que ele e seus familiares praticamente quase não aumentaram o número
de imóveis adquiridos desde 1990, ainda permanecendo na casa dos 107, sendo 51
em dinheiro vivo. Está passando da hora de mais que triplicar tão modesto
número. Pode ir, Bolsonaro, que o TCU vai te dar cobertura.
Etelvaldo Vieira de Melo
2 comentários:
A crônica é excelente. Com sua ironia nos faz sorrir diante da verdadeira e triste calamidade bolsonarista. Sorrir prá não chorar.
Observação: na citação do R. Barbosa aparece "alma" prosopopeia. É isso mesmo ?
O Valor Econômico soltou a reportagem hoje.
“Maioria dos ‘filhos’ do Bolsa Família deixa de depender de programa, mostra estudo. Dois terços dos dependentes dos beneficiários não seguem no auxílio e quase metade consegue emprego com carteira assinada”
Essa reportagem mata na raiz uma das maiores mentiras que as ‘pessoas de bem’ espalham.
Em verdade vos digo: esses patriotários que exalam enxofre nas redes sociais todo dia, esses sim, vivem às custas do Estados, em seus cargos manipulados por políticos ou indicação, e nunca largam o osso e vivem às nossas custas até que o diabo os carregue!
Os beneficiários do Bolsa Família, na sua maioria, saem do programa, melhoram de vida e não se transformam em ‘dependentes do PT’, como costumam dizer os ‘informados’, pendurados nas tetas do Estado🤢.
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