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Quando rompi a casca do ovo,
ainda sem enxergar, ouvi a voz
de meus pais:
- Pti, Pzi, Pti!
Na linguagem humana, isto quer dizer: Luz de Nossos Corações.
Senti outra presença ao meu lado. Imaginei que deveria
ser meu irmão, Psi, Pzi, Psi, Semente de Amor.
Durante 21 dias, deveríamos permanecer ali no ninho,
sob os cuidados de nossos pais. Logo, eu fui me dando conta das peculiaridades
do lugar onde estávamos. Papai e mamãe haviam escolhido aquela árvore de
lichia, uma planta bem avantajada, que apresentava uma copa fechada, ideal para
abrigar ninhos. Não era à toa que éramos ali, meu irmão e eu, já a terceira
ninhada. A árvore também apresentava a vantagem de estar rodeada de grama, no
quintal de uma casa, onde moravam um casal e uma filha. A mulher é quem mais
aparecia, cuidando das plantas, tendo o trabalho de regá-las todo dia, à tarde.
Isso era o que havia acontecido das outras vezes,
fiquei sabendo. Agora, havia um fato novo.
- Vocês
precisam ter muito cuidado para não caírem do ninho. O quintal está sendo
frequentado por um animal assustador e perigoso – falou papai. – Qualquer descuido, pode lhes custar a vida.
Senti um tremor tomar meu corpo, fazendo com que
agitasse as asas. Quis saber qual era esse animal.
- Ele se chama
cachorro. O que está aqui ainda é filhote. Por isso, ele se torna mais
perigoso, pois quer morder tudo o que vê pela frente. Todas as tardes, sua dona
o traz até aqui para que possa correr e brincar.
Dias depois, eu me arrisquei a olhar para fora do
ninho e avistei o animal. Sua dona estava sentada em um banco, sob um pé de
jabuticaba. Ela jogava uma bola pequena para o ar, enquanto falava:
- Vai, Thor,
vai pegar a bola.
E o cachorrinho saía correndo, abocanhava a bola e
vinha trazê-la, com o rabinho abanando.
Outras vezes, a dona dava-lhe um osso e ele se
entretinha, mordendo-o com dentes afiados. Pensava comigo: De fato, trata-se de
um animal bem perigoso!
Os dias passavam e, apesar da ameaça sob nossas
asas, dedicávamos aos exercícios para os primeiros voos. Mamãe é quem nos
repassava as lições de esticar e flexionar as asas, encolher os pés e alongar o
pescoço. Enquanto isso, papai cuidava de nos trazer alimentos, grãos de todas
as espécies, painço em especial.
Com o tempo, os exercícios passaram a ser mais
arriscados. Tínhamos que deixar o ninho e pular para os galhos vizinhos. Confesso
que procurava ser dedicada e atenciosa. Mas aconteceu um dia em que calculei
mal o salto para um galho e minha asa se embaralhou; acabei caindo lá das
alturas e nem sabia como voar. Bati de encontro à grama e senti que minha asa
havia se ferido.
Gemendo de dor, procurei me arrastar entre as
folhagens, procurando um lugar onde me esconder, pois sabia que estava na hora
em que o cachorrinho chegava para correr e brincar. Meus pais, tomados de
aflição, voaram até onde eu estava, olharam para minha asa tombada. Procurando
não manifestar qualquer tipo de preocupação, mamãe falou:
- Isso não há de
ser nada, Pti, Pzi, Pti. Logo você estará bem. Vamos ficar atentos o dia todo,
trazendo-lhe comida. Só peço para que não se exponha, na hora em que o cachorro
estiver presente.
Assim aconteceu de ter eu ficado escondida entre as
plantas, durante um bom tempo. A dona do cachorro logo notou minha presença e
fez o que podia para desviar a atenção do animal. Assim que ele ameaçava vir em
minha direção, ela o chamava, levando-o para longe de mim. O pior era que eu,
não conseguindo controlar meu nervosismo, ficava piando o tempo todo.
Mais tarde, meus pais vieram me visitar, trazendo
comida. Mamãe falou, quando se despediam:
- Amanhã,
vamos trazer um tio seu que teve um filho com o mesmo tipo de problema. Vamos
ouvir sua opinião.
Assim, no dia seguinte, pela tardezinha, meus pais
voltaram, acompanhados de meu tio. Ele olhou atentamente para minha asa
acidentada, que era a direita, levantou-a com seu bico, observou a ferida.
Depois, ele falou poucas palavras:
- Tenha
paciência, Pti, Pzi, Pti. Tudo há de se resolver.
Falando essas palavras, ele olhou para meus pais e
eu percebi como estava preocupado. Aparentando alegria, falei:
- Obrigada
pela visita, titio. Adeus, papai e mamãe. Peço desculpas por estar lhes dando
tanto trabalho.
- O que é
isso, filhinha do coração – falou mamãe. - Nada do que tivermos que fazer por você será custoso.
O tom de sua voz era emocionado. Ela desviou os
olhos e alçou voo, junto com os outros dois.
(Continua)
1 comentários:
Cliquei dez vezes no "continua" e não continuou. Ah, entendi que a estória (ou história? O caso é verdadeiro...,suponho) continua no próximo sábado. Vou ficar ansioso,pois a es(his)tória está muito bonita e emocionante...
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