Estava
assistindo a um casamento; ao meu lado havia um casal de conhecidos. Daí, como
é normal em tais circunstâncias , houve
muitos comentários e brincadeiras. Teve uma hora em que o conhecido falou, referindo-se
ao noivo:
- Está querendo colocar muita areia
em seu caminhão – querendo dizer com isso que a noiva era mais bonita do que
ele merecia.
Ouvindo aquilo, eu disse – o que
contou com o imediato apoio da esposa do analista de carga:
- Se eles se amam, que sejam bem felizes.
O mundo de hoje precisa disso: de felicidade. Quanto mais as pessoas forem
felizes, melhor será o mundo em que vivemos.
Estimado leitor: Hoje estou
precisando falar de um tema sério. No entanto, mesmo por razões médicas,
prometo usar de anestésicos, aqui e ali, para que a leitura não seja tão dolorida.
Peço-lhe desculpas pelo transtorno, ao tempo que lhe agradeço pela compreensão.
Vivemos este paradoxo: queremos ser
felizes, mas a felicidade alheia nos incomoda, como se ela pudesse diminuir a
nossa própria.
Creio que isto seja reflexo da
estrutura capitalista na qual a sociedade está fundada. A felicidade é tratada como
um bem que pode ser comprado; aliás, ela é vista como um somatório de bens:
quanto mais posses você tem, mais possibilidades terá também de ser feliz.
Talvez seja por isso que muitas pessoas
negam aos outros a oportunidade de terem bens, porque temem que, assim, a
própria felicidade fica diminuída. O capitalismo parece dizer: tenha, consuma,
e que os outros se danem; tenha, consuma, de preferência aquilo que o outro só
poderá desejar.
Talvez seja esta a razão da
implicância de certas pessoas, quando a viagem de avião se tornou acessível a
uma camada da população que não podia usufruir deste bem.
Tudo bem que o capitalismo seja assim.
Entretanto, é preciso um pouco de bom senso para que as desigualdades sociais
fiquem no limite do suportável. Era isso que apregoava um comunicador, “ó, meu!”,
lembrando (hoje ele já não fala mais isso): um pouquinho menos de desequilíbrio
social é uma questão de bom senso, de sobrevivência. Do jeito que as coisas
iam, as pessoas em melhor situação na escala social corriam o risco de viverem
confinadas. O perigo continua real e imediato, apesar de tudo, mas tem muito a
ver com as drogas e a violência decorrente. A paranoia com segurança se
alastrou e já atinge a população como um todo, deixou de ser privilégio das
castas mais abastadas.
Porque não dispomos de uma classe
política que saiba ler e dar uma resposta apropriada aos nossos anseios e às
nossas necessidades, verificamos uma explosão de acontecimentos de imprevisíveis
consequências.
Eu
poderia detalhar com exemplos de atos de intolerância religiosa, de racismo, de
misoginia (na figura da presidente do país), de homofobia. Faço registro de
três questões que me incomodam.
A
primeira faz lembrar aquele poema atribuído a Mayakovsky, mas que é de autoria
de Eduardo Alves da Costa: quando roubam uma flor de nosso jardim, pisam as
flores, matam nosso cão, roubam-nos a luz... matam nosso sonho e esperança.
Estou me referindo ao desencanto com um partido político que se fazia paladino
da integridade, da moralidade na vida pública; depois, com o tempo e o poder,
ele se mostrou como os outros, “farinha do mesmo saco” – fazendo uso de uma
expressão popular.
A
segunda: a constatação de que não temos uma classe política à altura do povo. Como
bem lembrava Millôr Fernandes, “deve
haver, escondida nos subterrâneos do Congresso, uma escola de malandragens,
golpes, perfídias e corrupção. Não é possível que tantos congressistas já
nasçam com tanto nourrau”. O que observamos neste Congresso é puro
fisiologismo, pura demagogia, puro oportunismo.
A
terceira e última questão mexe com aqueles que, através de redes sociais e
imprensa, extravasam sua indignação com vocabulário ofensivo. Ao invés de apresentarem
argumentos, partem para a agressão verbal. A ofensa desqualifica a crítica,
derruba a razão. É tanta gritaria, são tantos os palavrões, que cheiram a
fanatismo. É aí que mora o perigo, já que o fanatismo é via de mão única, sem
volta.
Por
esses dias, esbarrei, nas ruas da cidade, com um cidadão ostentando, dependurado
no peito, um cartaz com os dizeres: “Sou
culpado por não ter ensinado meu povo a votar”.
Queria
ter tido uma conversa com aquele sujeito, para que ele me explicasse como
votar. Ficaria feliz em aprender com ele a lição. Entretanto, penso que a questão
não é essa de que o povo não sabe votar. De A a Z, a escolha estará errada, com
essa estrutura podre e viciada de nosso sistema político.
Caso
aquele cidadão, respeitável e imbuído das melhores intenções, não apresentasse
argumentos convincentes, eu haveria de me posicionar ao seu lado, portanto um
cartaz com outra máxima de Millôr: “Cidadão,
não deixe de votar. A corrupção precisa de você”.
Etelvaldo
Vieira de Melo
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