Imagem: agoranotic.blogspot.com
Que
coisa! Passava Rogenildo pelo dissabor de ter de frequentar as aulas de um
cursinho pré-vestibular. Coitado, ele que não gostava nada de estudar! Seus
divertimentos preferidos eram dormir e assistir à TV, isso porque, naqueles
tempos, ainda não tinha sido inventado essa maravilha maravilhosa do
smartphone.
Quando
se levantava, o sol já estava no meio do céu, seus colegas de pensão se
preparavam para devorar o almoço. Aliás, era justamente o barulho desesperado
de talheres batendo em pratos que despertava nosso herói.
Os
colegas eram três e ficavam sentados à mesa de uma minúscula cozinha de um
barraco de três cômodos, mais um banheiro externo.
Rogenildo,
semidespertado pelo barulho de pratos e panelas, com a cara amarrotada pelos
lençóis e travesseiro, ficava por momentos postado no vão que ligava a cozinha
à sala, olhando pros colegas com olhar perdido, mais pra lá do que pra cá, e
fazendo caretas, pois, além de dormir e assistir à TV, ele gostava muito de
fazer caretas. E fumar, também ele gostava muito, o politicamente correto da
época. Como já disse, ele só não gostava em demasia do smartphone porque este
seria invento de tempos depois. Como já disse também, mas morrendo de medo de
ser taxado de repetitivo, Rogenildo passava pelo dissabor de ter de frequentar
as aulas de um cursinho pré-vestibular. O que não disse, digo-o agora, era o
segundo ano de cursinho, já que, no primeiro, havia sido premiado com uma
sonora bomba. E a segunda perigava vir. Porque Rogenildo gostava de muita
coisa, mas entre elas não estava estudar. E, aqui e agora, seria pertinente a
pergunta: - Como ele suportava as aulas do cursinho?
No
primeiro ano, até que tudo correu relativamente bem. Rogenildo dormia de duas
da madrugada até ao meio dia, quando era despertado pelo barulho de pratos e
panelas; depois do almoço, saboreando um cigarro, assistia a filmes pela TV; às
dezoito, ia se arrumar para as aulas; quando retornava, dava tempo para fechar
com a última sessão de cinema na TV.
Quando
foi renovar a matrícula, Rogenildo se esqueceu de um detalhe fatal:
matriculou-se na mesma escola! Ora, é sabido de todos que ele só se segurava
nas aulas por causa das piadas que os professores despejavam de tempos em
tempos. Rogenildo não desgostava disso, muito pelo contrário; eram elas, as
piadas, que o motivavam ir às aulas, depois de um cansativo dia de sono, TV,
cigarros e caretas.
Neste
segundo ano, tendo que ouvir as mesmas piadas e sem poder repassá-las para os
colegas de pensão, carregando o peso de uma bomba nas costas, ele se sente
muito, muito desmotivado para os estudos.
O
que fazer?
Conclusão,
a título de Moral:
Duas
alternativas são viáveis e tangíveis: - ou os professores de cursinho
pré-vestibular renovam anualmente seus estoques de piadas, para cuidar de
possíveis Rogenildos; - ou os possíveis Rogenildos, ao tomarem determinada
decisão, tenham o cuidado de verificar se ela já não foi decidida
anteriormente.
PS: Foi
Rogenildo quem me contou esta preciosidade.
Frequentando
as aulas do cursinho, ele se sentava ao lado de um cego que, por sua vez,
estava ao lado de uma garota.
Certo
dia, à noite, o cego se virou para a menina e perguntou:
- Posso
olhar pra ver como você é?
A garota,
mineira, desconfiada, cheia de dedos e ressaibos, murmurou:
- Uai...
acho que pode!
O cego
passou lentamente as mãos no seu rosto, tão somente. Depois, falou:
- Puxa,
como você é linda!
Rogenildo
disse que a garota, de fato, era muito bonita.
Aquele
cego foi capaz de ver com as mãos! Que coisa!
Etelvaldo Vieira de Melo
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