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Estimado
Leiturino: já observou você que, no Brasil dos últimos anos, virou moda xingar
as pessoas dizendo que são comunistas? No início, corriam soltos os palavrões
tradicionais; no entanto, vendo como pegava mal tal vocabulário, os extremistas
decidiram resumir tudo de chulo numa só expressão: “comunista”. Basta alguém
demonstrar uns dez por cento de sensibilidade social para que um outro
esbraveje: - Seu comunista safado!
Só
pode ser isso. Outro dia mesmo, estive lendo um fulano dizer que o Agnaldo
Timóteo, aquele que cantava Mamãe e Os Verdes Campos de Minha Terra, é...
comunista, só porque falou uma palavrinhas em defesa de Lula. Pensei comigo: -
Por tudo que está no céu, já não entendo mais nada!
Como
o tema está na moda, e não querendo passar por alienado, estou decidido a meter
minha colher no assunto. Como quase sempre, recorro aos préstimos de um expert.
O convidado de hoje é o Leovigildo Amendoeiras (Leo, para os íntimos). Suas
considerações:
Marx disse: “O
trabalhador só se sente a vontade no seu tempo de folga, porque o seu trabalho
não é voluntário, é imposto, é trabalho forçado”. Grande mentira! Fake news! Para comprovar,
basta observar os fins de semana. Já na sexta-feira, os trabalhadores são
tomados de tristeza, ansiando pela volta da segunda-feira. Foi por acreditar na
dignidade do trabalho, no seu valor e na alegria que proporciona, que os
legisladores, nossos amados políticos, fizeram no Brasil uma reforma,
aumentando o tempo de trabalho.
Definitivamente estou abrindo mão de me tornar
imprescindível. Isso foi depois de ler esta citação de Brecht: “São bons aqueles que lutam um dia; melhores,
os que lutam um ano; muito bons, os que lutam muitos anos. Para ser
imprescindível é preciso lutar toda a vida.” Ufa! Isso dá uma canseira
danada! Melhor é ser descartável.
Com língua ferina, Brecht comenta: “Melhor do que roubar bancos é fundar um. O que é roubar um banco
comparado a fundar um?”. Para mim, a diferença entre roubar um banco e
fundar um é que, ao fundar um banco, você passa a roubar de muitos, sem muito
risco de ser preso e ver “o sol nascer quadrado”. Roubar banco só é bom mesmo
na série A Casa de Papel.
Quando Brecht fala “todo
mundo chama de violento a um rio turbulento, mas ninguém se lembra de chamar de
violentas as margens que o aprisionam”, pensando bem, não está ele
contrariando o dito de que “o hábito não faz o monge”? Não está ele retomando a
velha tese de Rousseau de que o indivíduo é bom, mas a sociedade o corrompe?
Está bem: são violentas as margens que aprisionam um rio turbulento. Conclusão?
Já que é tudo culpa das margens, não se mexe na maioridade penal, embora tudo
leve a crer que alguém está determinando quem veio primeiro, a galinha ou o
ovo. Enquanto isso, a plebe pratica esporte radical de caiaque entre margens
violentas e rios turbulentos, fazendo valer o que dizia Mayakovsky: viver é muito difícil.
A propósito da galinha e do ovo, quem veio primeiro?
Sinceramente, não sei dizer: quando levantei a galinha do ninho, o ovo estava
lá debaixo dela. Isto não quer dizer que a galinha tenha vindo primeiro e
botado o ovo depois; pode ser que outro ovo tenha gerado a galinha e essa, por
sua vez, tenha botado outro ovo. Tanta elucubração pode dar em nada: mata-se a
galinha, bebe-se o caldo e do ovo se faz uma omelete. Assim, fica resolvido o
impasse, ficando tudo do mesmo jeito e tamanho.
- Leo, seu comunista safado, obrigado por suas
considerações. Finalizando, quer acrescentar algo, uma cereja decorando este
seu bolo de palavras?
- Estou me lembrando daquela máxima favorita de Marx: “Nihil humani a me alienum puto” (Nada do
que é humano me é estranho).
Etelvaldo Vieira de Melo
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