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A
moita de bananeiras sempre existiu ali, no fundo do quintal, bem próxima de um
dos vértices formados pelo muro. Um dia, o homem teve a idéia de utilizar a
pequena clareira à sombra das grandes folhas, e foi para lá, com um banquinho
de madeira e um livro. Logo se convenceu de que não ia dar certo: por causa do
piso irregular, com algumas raízes à flor da terra, era impossível manter o
banquinho apoiado de modo uniforme sobre as quatro pernas. Além disso, havia o
desagradável odor de fezes do cachorro e dos gatos que viviam no quintal.
Melhor abandonar a ideia de ocupar o local.
Embora
não tivesse mais vontade de freqüentar a pequena clareira, ele gostava das
bananeiras. Por isso, fez cara feia quando lhe disseram que as plantas (isto é,
suas raízes) seriam arrancadas para uma reforma do quintal. Ele sempre passava
algum tempo observando as grandes folhas lisas, recortadas, e um dia tentara
reproduzi-las em desenho, mas faltou-lhe talento. Gostava também do delicado
sabor das bananas, que se apresentavam em cachos enormes, e aprovou o sabor da
salada de umbigo de bananeira, conforme receita de sua mãe. A vista do homem
custou a se acostumar com a ausência da moita no fundo do quintal. Ficou-lhe
uma sensação de perda, e depois ele descobriu por quê: em sua distante
infância, o homem só conhecia árvore de Natal de ouvir falar, e aquelas
bananeiras eram as árvores de Natal que agora ele podia ter – árvores
generosas, com os cachos da fruta substituindo as bolas coloridas.
O
projeto de reforma impôs também a derrubada de uma mangueira, outra árvore de
Natal, cuja idade ninguém jamais teve condição de calcular. Ela já estava lá
quando a casa foi construída, há mais de 40 anos. Suas mangas eram bem grandes,
dessas de comer em fatias, e não deixavam fiapos entre os dentes. No período de
safra, principalmente quando chovia, o homem costumava sentar-se numa velha e
confortável poltrona, na área com piso de ardósia sob os quartos da casa, para
contemplar os galhos açoitados pelo vento e acompanhar a queda das frutas. Este
prazer também não existe mais, porque a velha mangueira foi derrubada numa
manhã de dezembro, quinze dias antes do aniversário do homem e vinte dias antes
do Natal.
Abater
a grande árvore era o que faltava para dar prosseguimento à reforma do quintal.
A operação resolveu muitos problemas de uma só vez, pois a mangueira ocupava
grande espaço, lançava folhas inclusive na piscina de um vizinho e, quando
ventava, as folhas eram levadas para o telhado da casa colada ao muro do fundo.
Às vezes surgia também o temor de a árvore favorecer a escalada de algum
invasor até um dos quartos da casa. Ah, se os ladrões soubessem...
As
últimas safras da mangueira não foram abundantes e as mangas também não eram mais
as mesmas. Como as pessoas, as plantas não têm o privilégio da vida eterna, e a
queda de desempenho de humanos e vegetais é inevitável, principalmente se levam
uma vida ao deus-dará. A velha árvore nunca teve a visita de um engenheiro
agrônomo, nem mesmo de um estagiário de escola técnica rural. O tronco escuro,
rachado de cima a baixo, denunciava a falta de cuidado com a mangueira, que se
confirmava agora em cada manga.
Caso
as plantas tenham uma vida depois desta, a velha mangueira e a moita de bananeiras
devem se encontrar agora no mais bem-cuidado pomar da eternidade.
Ivani Cunha
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