LENDO NAS ENTRELINHAS

VIDA E MORTE | DIVINO AMIGO - Reflexões
Imagem: divinoamigoreflexoes

Ao ler uma declaração de Nelson Teich em seu primeiro pronunciamento como ministro da Saúde do governo que está aí, no dia 16/04/2020, Eleutério se pôs a cismar, achando que havia qualquer coisa errada, mas sem conseguir atinar com o quê.

Depois de queimar um tanto de seu minguado estoque de neurônios, resolveu por bem fazer uma consulta on-line com o sobrinho Ingenaldo, recorrendo a um novo recurso disponibilizado pelo Zap-Zap.

Assim que estabeleceu a ligação, viu na tela de seu aparelho a figura de Ingenaldo, com seus óculos de armação azul.

   - Olá, Ingenaldo – falou.

   - Bênção, tio – retrucou Ingenaldo. – A que devo o prazer de sua ligação?

   - Primeiro, quero dizer que você está muito bem, apesar do confinamento. “Bem-zô-Deus”.

   - Obrigado, tio. O senhor também está com muito bom aspecto.

   - Quanto ao motivo de minha ligação – falou Eleutério – é o seguinte: preciso de sua ajuda, como estudante de Lógica, para decodificar, traduzir, ler nas entrelinhas uma declaração do atual ministro da Saúde em pronunciamento através da TV.

   - Qual?

   - É o seguinte: “Existe um alinhamento completo aqui entre mim, o presidente e todo o grupo do ministério. O que a gente está fazendo aqui hoje é trabalhar para que a sociedade tome, cada vez mais rápido, uma vida normal”. Foi o que disse Nelson Teich.

  - Primeiro, noto um erro gramatical muito feio, quando disse “entre mim, o presidente...”.

   - Isto também doeu nos meus “zovidos” ...

   - Outra coisa: na Lógica, a ordem dos fatores altera o produto, sim.

   - Como assim?

   - Veja bem: os atores da fala do ministro são três: mim (eu) – o presidente – o grupo do ministério. A ordem correta para nomeá-los seria: o grupo do ministério – mim – o presidente (em disposição crescente), ou então: o presidente – mim – o grupo do ministério (em ordem decrescente). No entanto, a relação é estabelecida assim: mim – o presidente – o grupo do ministério. Daí, podemos deduzir o seguinte:

   1º) O ministro se distancia dos demais membros do Ministério da Saúde (deveriam estar juntos);

  2º) Eles não são vistos pelo ministro como um time, uma equipe, mas como um grupo, um grupamento (percebe a sutileza da denominação?);

  3º) As conversas que irá ter com o grupo serão filtradas na sua relação com o presidente (que sempre se interpõe entre eles);

   4º) Frente ao presidente, sua postura será de submissão, dependência (uso de “mim” em vez de “eu”);

   5º) Tal dependência, chamada de “alinhamento”, é completa, total.

   - Quer horror! Mas, para que sua análise fique bem clara: qual é a visão do presidente sobre tudo isso?

   - O presidente pensa que a Economia, que os interesses econômicos se sobrepõem a tudo, que eles devem nortear todas as medidas a serem tomadas frente a essa pandemia do coronavírus. Na verdade, a medida que ele tolera no máximo é o isolamento vertical, para as pessoas mais idosas. Como o ministro está alinhado com as ideias do presidente, significa dizer que ele compactua com o isolamento vertical e com a retomada das atividades econômicas. A não ser que você queira acreditar que uma manhã de conversa pode modificar a maneira de pensar de alguém que tem a mesma ideia por mais de 60 anos.

  - Penso que o presidente não quer saber de nenhum tipo de isolamento, seja ele vertical, horizontal, perpendicular, oblíquo ou paralelo. Seguindo as orientações de seu guru americano Steve Bannon, ele quer mais é que tudo se exploda, especialmente os velhos, que tudo seja destruído, para que um novo país seja construído, nos moldes de Olavo de Carvalho, das milícias e do gado bolsominion. Mas eu quero perguntar uma coisa a mais, sobrinho: - quando o ministro faz referência ao “grupo do ministério” não está dando a entender que está falando dos demais ministros?

  - Também pensei nessa possibilidade. Considerando que o conjunto de ministros forma um grupo, ou grupamento, e que o conjunto das pessoas que integram um ministério forma uma equipe, ou time, quando o ministro fala “grupo”, ele pode estar, sim, se referindo aos demais ministros. Ele pode estar se referindo, notadamente, ao da Economia e, em especial, aos ministros militares.

  - Sendo assim, a leitura possível do fala do ministro é esta: - Quem dá a última palavra nessa pandemia são os ministros militares. Então, a frase que pode ser lida nas entrelinhas é: - Estou alinhado com o presidente, que se sustenta graças ao respaldo dos ministros militares.


  - Exatamente. É por esta e por outras que eu digo: estão os militares, há muito tempo, segurando a escada para Bolsonaro. O que acontecer daqui para a frente com o Covid-19 será sobretudo responsabilidade deles.

   - E a frase final da declaração: “O que a gente está fazendo aqui hoje é trabalhar para que a sociedade tome, cada vez mais rápido, uma vida normal”, como você avalia?

  - Bom, completou Ingenaldo. – Eu penso que falta modéstia, humildade para esse novo ministro. E também falta consideração, respeito, educação para com seu antecessor. Ele poderia dizer (e estaria ganhando dividendos): - O que a gente vai fazer a partir de hoje é dar continuidade ao brilhante trabalho desenvolvido pelo Dr. Mandetta e sua equipe, para que a sociedade tome, o mais rápido possível – dentro dos parâmetros da Ciência – uma vida normal”.

   - Nesses tempos difíceis, onde muitos pensam que o dinheiro vale mais do que vidas humanas, lembro a declaração da filha do presidente do Banco Santander em Portugal, Vieira Monteiro, morto com Covid-19: “Somos uma família milionária, mas o meu papai morreu sozinho e sufocado, buscando algo que é grátis, O... AR. O dinheiro ficou em casa”. Ao tomar posse no dia 17, o ministro Nelson Teich declarou: “Não importa se é saúde ou economia, não importa o que você fala, o final é sempre gente”. Importa sim, ministro, tudo precisa ser bem explicado, essa mistura de saúde com economia é venenosa, principalmente na boca e no coração de quem trata o dinheiro como se fosse deus e o ser humano como um produto descartável.  
 Etelvaldo Vieira de Melo

2 comentários:

Anônimo disse...

Pouco depois de postar esta crônica, recebi do amigo J.D.Vital um artigo do Dr. Google dizendo que a expressão "entre mim e você" está certa, enquanto é errado dizer "entre eu e você". Transcrevo o diálogo que tivemos, no intuito de corrigir meu erro.
- Entre mim ou entre eu - Pesquisa Google.
- Puta merda! danei.
- Problema não é seu, mas do professor Eleutério.
- E entre "você e eu"? Fica "entre si e eu"?
- Entre nós.
- Mas eu quero colocar "você".
- Entre mim e você. Mas eu não sou revisor de textos nem professor de Português. Apenas, seu leitor inveterado.
- Por deferência, quero citar "você" primeiro. Como fica?
- Kkkk
- Querendo ser fiel à verdade, vou transcrever nossa conversa no blog. Se gramaticalmente o texto merece reparos, você endossa o conteúdo, ou considera que não é bem assim? Porque entre mim e você tem que haver alinhamento.
- Estou completamente alinhado com você, ad semper per saecula saeculorum, amen!
- Nossa!
EVM

Unknown disse...

Etelvado continues com...

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