SÉRIE BLOGFLIX: TEMPORADA 2 (PODE ATÉ TER, MAS TEM QUE SER ABSCONTO, EMBIOCADO)

Como bem diz dona Jandira: “Tem desfecho que não tem nem ganho, nem graça, nem feiura, só perda de tempo”.

Em tempo bem atrás, estava eu em um ponto de ônibus, quando fui surpreendido por um grupo de pivetes. Um deles arrancou o relógio de meu pulso e saiu correndo, sendo acompanhado pelos demais. Quando chegaram do outro lado da rua, um dos meninos falou para aquele que havia me surrupiado o relógio:

- Cara, esse relógio não vale nada, é coisa de camelô.

Com ar triste, o ladrãozinho pegou o dito relógio e o colocou delicadamente no passeio, próximo ao meio-fio. Olhou para mim, e seu olhar dizia assim: “Pode vir pegar seu relógio, pois vejo que você está em situação pior que eu”. E aquele olhar fez com que uma lágrima de desgosto escorresse pelo meu rosto.

As pessoas que estavam próximas, usando daquela atribuição que a Psicologia pode chamar de “solidariedade mórbida”, vieram me perguntar, todas com os olhos arregalados:

- Roubaram mais alguma coisa? Machucaram você? Tiraram algum pedaço? Deixaram você sangrando?

Como nada de excepcional havia acontecido, elas se afastaram, decepcionadas, dando razão ao que dizia Dona Jandira: tanta preocupação tinha sido uma perda de tempo.

De minha parte, depois de aparar a lágrima furtiva com lenço, atravessei a rua, peguei o relógio e o coloquei novamente no pulso.

Foi a partir dessa data que os ladrões me deixaram em paz, eu que já havia sido assaltado por sete vezes. É que eu me dava certos ares de importância, vestindo roupas um pouco sofisticadas, embora, no fundo e a bem da verdade, pouco mais valiam que um real furado.

Os ladrões me deixaram em paz porque passei a usar artigos de quinta categoria. Qualquer meliante (que palavra exótica!) ao olhar para mim, ia logo pensando: “Esse aí não está com nada!” Com isso, não melhorei minha situação financeira, mas parei de levar sustos ao andar pelas ruas da cidade.

Você está vendo, é difícil ser capitalista nesse nosso Brasil varonil: não dá pra ostentar nem produto de terceira categoria. Desse jeito, o melhor mesmo é adotar o regime comunista, dando razão de vez a esse povo doido que tomou conta do país.

Porque, a bem da verdade, ser capitalista nesse país tupiniquim é difícil até para as pessoas mais abonadas. Que o diga aquele apresentador de TV (ô loco meu!, aquele que falou certa vez:  “Sabe por que existe espingarda de dois canos? Pra matar dupla sertaneja!”), que tem mania de colecionar relógios, todos custando mais de milhão. Ele acaba de cancelar seu contrato com a emissora em que trabalhava há muitos anos. O que fez logo depois foi acertar com uma emissora concorrente, não pelo dinheiro, já que ele está podre de rico. Dizem as más línguas (fake news?) que ele até vai pagar para apresentar seu programa. Sua compensação? Exibir seus caros relógios. Porque, para o capitalismo, não basta ter: é preciso ostentar, deixando os outros babando de inveja. Arre! 

Etelvaldo Vieira de Melo

1 comentários:

Anônimo disse...

Excelente, Tel. Muito perspicaz!
Silvania

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