A MALA, DE NOVO

 
Imagem: Dreamstime

Estudo recente, entre turistas brasileiros, do Instituto de Pesquisas Sobre Temas Aleatórios (em inglês, Institute for Research on Random Topics - IRRT) constatou duas coisas que azedam suas viagens: as bagagens e a burocracia nos aeroportos.

Dos 100% de prazer possíveis em viajar, 31,7% vão pro vinagre por conta da bagagem; 13,3% ficam com a burocracia; outros 20% podem ser creditados aos dissabores normais de qualquer passeio, enquanto que 10% ficam nos bolsos da Receita.  Ou seja: restam ao turista a miséria de tão somente 25% de prazer autêntico. Não é à toa que vale a pena sempre ser lembrada a famosa frase de William Shakespeare: “Não crio expectativas sobre viagens, pois as expectativas sempre machucam...”.

As bagagens, responsáveis por 31,7% dos dissabores de uma viagem, são constituídas de pai, mãe e filha. O pai é a mala de bordo, pequena e que não pode ultrapassar o peso de 10 kg. A mãe, que tem coração maior e, por isso, pode armazenar mais coisas, é a mala de porão e pode suportar até 23 kg. Já a filha (aborrecente) é a bagagem de mão; vai debaixo do assento do passageiro. As malas, por razões estéticas e funcionais, devem estar cobertas de capas, identificadas com etiquetas e decoradas com fitinhas, tudo para serem melhor reconhecidas lá no terminal de desembarque.

Quando o passageiro opta por levar tão somente a mala de bordo (pãe) e a bagagem de mão, o dissabor das malas cai drasticamente para 13,7%. Por um lado, isso é bom; por outro, pode criar alguns inconvenientes. Explico. Bom porque o passageiro deixa de desenvolver aquele distúrbio psíquico-somático chamado “malastrose”, capaz de provocar insônias e pesadelos no referido em questão por até três ou quatro meses após a viagem. (Em seus pesadelos, ele vai se ver arrumando malas sem nunca chegar ao fim; em outros, vai estar arrastando duas, três entre estações de metrô e trem, subindo e descendo escadas.) Reduzindo a bagagem, a correria nos aeroportos em buscas dos guichês se torna mais amena. Por outro lado, há o inconveniente do passageiro ter de passar a pão e água, isto é, sem ter o direito de exercer seu papel de turista bobo diante de lembrancinhas e bugigangas, que estarão salientes e saltitantes frente aos seus olhos, pedindo para serem compradas. Nem mesmo um agradozinho pra sogra o turista vai poder levar.

A burocracia no aeroporto é tanta que chega a consumir até quatro horas de vai-e-vem do passageiro, tudo para atender às exigências de embarque ou desembarque. Primeiro, vai o pobre coitado, arrastando suas bagagens para uma fila, fazer um tal de check-in na companhia aérea responsável pelo voo. Ali, ele se despede provisoriamente da mãe, que é jogada numa esteira, depois de etiquetada e aprovada - quando não apresenta excesso de gordura. Depois, puxando o pai pela mão e carregando a filha nos ombros, vai ele (correndo) enfrentar outra fila, em forma de zigue-zague, para passar por um detector de metais. Nesta hora, tem o passageiro de tirar quase tudo: tem que tirar o boné, moedas, celular, chaveiro, tudo deve ser colocado numa bandeja. Também tem que tirar o cinto, correndo o risco de sua calça cair e ele (o passageiro) ter de mostrar a cueca samba-canção ou ceroula. Depois (ainda quer mais?), corre desesperado (pois seu embarque já foi aberto) para receber a liberação de visto do passaporte, lá no guichê da polícia. Com o coração nas mãos, vai para a última fila, a de embarque. Nosso pobre coitado nem teve tempo de se assentar naqueles bancos de espera. Por outro lado, sequer circulou pelas lojas do Duty-free, ele que é um apaixonado pelas novidades eletrônicas. Depois de passar por um cone sanfonado, ele entra nas dependências do avião. A comissária de bordo lhe indica a poltrona, ele agradece, ela fala “prego”, ele fica sem entender o que ela quer pregar. Desorientado, acomoda seu pai no porta-bagagem acima de sua poltrona; a filha é deslisada para baixo de seu assento. Nosso herói se acomoda na poltrona, afivela o cinto, aguardando uma nova aventura. Enquanto isso, suas malas parecem dizer: - Você ganhou uma batalha, mas não a guerra. Aguarde só o retorno e vai ver o que é bom pra tosse. Prego!

Etelvaldo Vieira de Melo


2 comentários:

Anônimo disse...

Em tudo isso, Etevaldo, faltou a rigidez da poltrona que exige regime, fome e imobilidade durante o voo. Detalhe: a agonia será menor se o comissário de bordo for educado e estiver de bom humor. Com tudo isso 'lá nave va'.
Mauro Passos

Anônimo disse...

'la nave va'. (Mauro Passos)

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