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Estamos
novamente vivendo momentos conturbados, que vêm me tirar da alegria e do bom
humor com que procuro tocar o tempo que me resta.
Tento me controlar, tomando vários
chás de maracujinha, mas não adianta: chega a hora em que tenho de “chutar o
balde”, tantos são os desaforos e as mentiras que agridem meus olhos e meus
“zovidos”.
Tem um apresentador de noticiário
nacional, por exemplo, que – quando começa uma notícia e fica balançando a
cabeça num tique-tique nervoso – eu já sei: lá vem mais uma delação. Quanto
mais ele balança a cabeça mais “chumbo grosso” ele vai disparar.
Tem uma emissora que se autodenomina
cuidadora da cultura. Só se for da cultura golpista. Na segunda-feira, por
exemplo, ela tem um programa de entrevista, onde os entrevistadores são
escolhidos a dedo: todos rezam pela mesma cartilha.
Coitada dessa emissora: além de
perder os créditos, está sempre se dando mal. Em um programa, um dos destaques
é o presidente da Assembleia de São Paulo que, dias depois, se vê envolvido no
chamado “escândalo das merendas”. Num outro programa, entrevistam um político
que tem um passado sombrio: foi um dos líderes da tropa de choque de um
presidente defenestrado por corrupção. Eu gostei da vez em que o ouvi dizer,
referindo-se aos colegas da Câmara: Aqui não existe ninguém melhor do que eu!
Os outros ficaram calados, e eu tenho em consideração a máxima que diz: quem
cala, consente.
Esse entrevistado falou os maiores
absurdos, com todos os entrevistadores concordando com as cabeças e sorrisos.
Referindo-se ao PT, disse que tal partido nunca deveria de conquistado o poder,
que seu papel era de ser tão somente oposição. Engraçado é que seu partido, do
qual é uma das lideranças, foi até ontem integrante da base aliada do governo;
um de seus senadores foi agora preso por suborno, quando da CPI da Petrobrás.
Rasgou elogios a políticos que, a
gente sabe através de leituras, estão envolvidos em atividades escabrosas. Só
faltou mencionar que o Presidente da Câmara é um santo. Não deve ter feito isso
em consideração ao fato de tal presidente ser evangélico e não cultuar santos.
Tem mais. Acho um absurdo que partidos
da base aliada do governo, diante da ameaça de impeachment, abandonem o barco
do poder, tais como ratos. Até ontem, tiveram as benesses; agora, cantam de
oposição.
Nesta lista de desaforos, eu não
posso esquecer o que disse um estudioso da política brasileira: a elite
(paulista, no caso) é rancorosa. Ela nunca admitiu que pobres deixem a senzala
e possam ir para a Casa Grande. Para ela, lugar de pobre é na senzala, o que
pobre pode fazer é andar de ônibus, frequentar o ensino fundamental em escola
pública. Na senzala, ele pode ter o agrado de uma ou outra conquista da
técnica, mas não pode deixar de ser o que é: pobre, pária. Só falta mesmo um
representante da federação das indústrias dizer com todas as letras: Será que
pobre é tão ignorante que não sabe que vivemos numa sociedade de castas?
Você tem todo direito de questionar
minha postura. Mas peço-lhe para não fazer a inferência precipitada de que tomo
uma posição tendenciosa. Se você me conhece de leituras passadas, sabe que
critico até com mais intensidade o outro lado, porque foi justamente ele que
fracassou miseravelmente como paladino da justiça e da moralidade, foi ele quem
matou o sonho e a esperança de muitos de viver numa sociedade mais igualitária
e justa; critico a falta de ética no trato com a coisa pública, critico os
desmandos, as comprovadas corrupções, a incompetência administrativa, a subserviência
a uma política do toma lá dá cá, da troca de favores, da compra de votos.
Está tudo errado. Mais errado de
tudo é esse SISTEMA POLÍTICO, que faz com que seus integrantes tenham que
vender suas almas ao capeta para sobreviverem em seus mandatos.
De dois em dois anos se repete a
farra eleitoral, onde quase todo mundo ganha, menos o país com seus eleitores
perdidos, sem saberem a quem apoiar.
Ganham os empresários, que fazem
seus investimentos em candidatos a troco de benefícios futuros; ganham a
imprensa e os institutos de pesquisa de opinião, que conseguem manipular
facilmente os votos, tal a fragilidade do sistema eleitoral, com o dinheiro
sendo a principal moeda de troca.
Estou fazendo estas anotações às
vésperas da votação da Câmara sobre o encaminhamento ou não do processo de
impeachment. Dou os parabéns para a classe política pela agilidade com que
encara esse processo. Coitados de nossos pobres deputados! Abriram mão de um
descanso de final de semana em favor do bem maior da pátria! Depois da votação,
poderão voltar à rotina de “fingir que trabalham” – como bem lembrou um deles.
Minha conclusão acerca de tudo isso:
torço para estar enganado, mas não acredito. Como bem lembra uma passagem
bíblica: não se coloca remendo novo em pano velho. Nosso sistema político está
se desfazendo em podridão. Sem uma reforma séria, responsável e consciente,
continuaremos a ser esse arremedo de democracia, com as regras do jogo sendo
pisoteadas a troco de interesses menores.
Etelvaldo
Vieira de Melo
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