ESCRITORES SE REESCREVEM

-          Licença?
-          
-          Selvagem, ponto.
-          
-          A senhora quer me mandar embora?
-          
-          Nessa situação, agora é possível…
-          
-          Acho que a senhora vai me pôr na rua.
-          
-          … um animal completo.
-          
-          A lavadeira veio aqui buscar o derradeiro pagamento.
Falou que a senhora manda todas as domésticas embora sem motivo, como fez a ela.
-          
-          Muitas vezes? Melhor, todo mês.
-          
-          Tenho direito ao Aviso Prévio!     
-          
-          Pausa. Normal.
-          
-          Por que a Zefa foi despedida?
-          
-          Doença dos Trópicos...
-           
-          Cruiz! Da senhora?
-          
-          …da cara de coruja.
-          
-          Onde essa feiosa pegou isso?
-          
-          … no sertão nordestino.
-          
-          Entendo. Vou deveras para o olho da rua?
-          
-          Preciso pensar se...
-          
-          Então, pergunto ao senhor Pedro.
-          
-          Se… Ou o quê?
-          
-          Se a senhora cisma e manda a gente embora.
-          
-          Existe a palavra Importúnio, Houaiss?
-          
-          Pode xingar palavrão. Sei que estou amolando.
-          
-          …F,G,H,I. Ah! Não. Cometi o chiste freudiano: misturei importuno com infortúnio.
-          
-          Fico ou não fico? Fale, e deixo a senhora em paz.
-          
-          Vírgula, pode ser!
-          
-          Ingratidão. E a marmota piorou?
-          
-          Caballero, S. et al: A baleia sem cauda nunca adoeceu.
-          
-          …mas a senhora disse que sim.
-          
-          Ela nada, nada. Ufa! Escrever é perigoso.
-          
-          O que foi?
-          
-          Aspas. “Diga.”.
-          
-          Que a lavadeira teve.
-          
-          Zoonose do tipo…
-          
-          Grave. Verminose é lombriga. Vovó dizia…
-          
-          Acabou, estou farta. Fim, adeus e bênção.
-          
-          Poi Zé. Shuiiiff.
-          
-          Descanso, agora. Uai, Donana, tá chorando por quê?
-          
-          Recebo os benefícios? INSS, atrasados, fundo de garantia?
-          
-          Sim, é claro. Quando sair...
-           
-          Então, assine logo minha carteira. Sem nenhum motivo, ora! Deixe amanhã na área de serviço. Pô! Sniff, sniff.
Graça Rios

O TÉCNICO MANDOU

Ivani Cunha

ORFEU DEPOIS DO CARNAVAL

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Imagem: "Orfeu e Eurídice" (Rubens)
A história de Orfeu e de Eurídice é um dos mais belos relatos da mitologia grega.
Ele nos mostra, num primeiro momento, como o Amor é uma força poderosa, capaz de unir e abrandar, não somente as pessoas, mas até mesmo animais ferozes, plantas e rochedos.
Orfeu, filho de Apolo e da musa Calíope, recebe de seu pai, como presente, uma lira e aprende a tocar com tal perfeição que nada podia resistir ao encanto de sua música. Não somente os mortais, seus semelhantes, mas os animais abrandavam-se aos seus acordes e reuniam-se em torno dele, em transe, perdendo sua ferocidade. As próprias árvores eram sensíveis ao encanto, e até os rochedos. As árvores ajuntavam-se ao redor de Orfeu e as rochas perdiam algo de sua dureza, amaciadas pelas notas de sua lira.
Apesar de seu poder extraordinário, ele, o Amor, é confrontado com a Inveja, a Ambição, o Sofrimento e a Morte. Consegue superar tudo, porque é um deus todo-poderoso.
Orfeu casa com Eurídice. Esta, pouco depois do casamento, quando passeia com as ninfas, suas companheiras, é vista pelo pastor Aristeu que, fascinado pela sua beleza, tenta conquistá-la. Ela foge e, na fuga, pisa em uma cobra, é mordida no pé e morre.
Orfeu canta sua dor para todos quanto respiram na atmosfera superior, deuses e homens, e, nada conseguindo, vai procurar a esposa na região dos mortos. Apresenta-se diante do trono de Plutão e Prosérpina e, acompanhado pela lira, canta:
- Ó divindades do mundo inferior... Não venho para espionar os segredos do Tártaro, nem para experimentar minha força contra o cão de três cabeças que guarda a entrada. Venho à procura de minha esposa, a cuja mocidade o dente de uma venenosa víbora pôs um fim prematuro. O Amor aqui me trouxe, o Amor, um deus todo-poderoso. Imploro-vos: uni de novo os fios da vida de Eurídice.
Orfeu tem permissão de levar Eurídice consigo, com a condição de que não se voltaria para olhar para sua amada, enquanto não tivessem chegado à atmosfera superior. Num momento de distração, para certificar-se de que Eurídice o está seguindo, Orfeu olha para trás. Eurídice é arrebatada, morre pela segunda vez.  
No final do relato, temos Orfeu cantando seus lamentos e se entregando à dor da lembrança de sua amada. Quando é visto pelas moças da Trácia, essas tentam seduzi-lo, mas ele as repeliu.
Elas o perseguiram enquanto puderam, mas, vendo-o insensível, certo dia, excitada pelos ritos de Baco, uma delas exclamou: “Ali está aquele que nos despreza!”. E lançou-lhe seu dardo. A arma, mal chegou ao alcance do som da lira de Orfeu, caiu inerme aos seus pés. O mesmo aconteceu com as pedras que lhe foram atiradas. As mulheres, porém, com sua gritaria, abafaram o som da música, e Orfeu foi então atingido e, dentro em pouco, os projéteis estavam manchados de seu sangue.
O Amor, simbolizado por Orfeu e sua música, está presente no mundo de hoje, sim. Se prestar atenção, vai ver que Ele se faz presente nas famílias, nos grupos de amigos, nas palavras e nos gestos de solidariedade. Se prestar atenção, vai ver que Ele está ali nas redes sociais, espaços modernos de interação, de conversa e de busca de informações.
Sem precisar prestar atenção, vai ver que em todos esses lugares existe também a manifestação de algo, que não é belo, que não aproxima as pessoas, que não é de luz e que não dá colorido à vida. Trata-se de algo sombrio, que cria animosidade, preconceito, rivalidade, intolerância, ódio e morte.
Esse algo sombrio é o Egoísmo, cruel, exacerbado.  Ele está aí, sobretudo nas Redes Sociais (Facebook, WhatsApp, Instagran, YouTube, Twitter...), atirando pedras e mais pedras, gritando, esbravejando. E porque fala alto e grita, esbraveja, atira pedras, não demora, estará chegando o momento em que, com tantos gritos e pedras, vai esse outro, finalmente, abafar, sufocar, matar o Amor.
Então, estará instalada a barbárie. Viveremos o caos, sem Afeto, Ternura, Amor e sem Paz. Viveremos o Inferno.
Inventadas, talvez, para aproximar as pessoas, estreitando laços de ternura e afeto, as redes sociais acabaram por disseminar a intolerância e o ódio, espalhando mentiras, criando inimizades.
Etelvaldo Vieira de Melo

PAPAGAIO DISSE...

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- Licença?
-  … Ponto.
-  Dona Maria, a senhora quer me mandar embora?
-  Hum? Ss.
-  Acho que a senhora vai me pôr na rua.
-  Hein? Pergunta.
-  A lavadeira veio aqui buscar o derradeiro pagamento. Falou que a senhora manda todas as domésticas embora sem motivo, como fez a ela.
-  É? Eh?
-  Tenho direito ao aviso prévio!
-  Uai! Hífen.
-  Por que Zefa foi despedida?
-  Doença e...
-  Da senhora?
-  Dela. Reticências.
-  Doente de quê?
-  Já pôs a mesa?
-  Vou para o olho da rua?
-  Desculpe-me. Estou escrevendo.
-  Então, pergunto ao senhor Pedro.
-  O quê? Acento.
-  Se a senhora cisma e manda a gente embora.
-  Existe a palavra Importúnio, Houaiss?
-  Pode ser a mistura do que sinto agora. Eu me
-  importo com meu queixúnio.
-  …F,G,H,I. Ah! Não. Foi um chiste: importuno com infortúnio.
-  Fico ou não fico?
-  O almoço, Anica. Tenho fome.
-  Ela piorou?
-  Quem?
-  Zefa.
-  Não. Estava doente?
-  …mas a senhora disse.
-  Ufa! Escrever é perigoso.
-  O que foi?
-  Foi?
-  Que a lavadeira teve.
-  Tangolomango, tangolomango. Isso tem no Aurélio.
-  Grave, mesmo.
-  Quê, Ana?
-  Esse tal de angu com manga. Minha avó…
-  Pedro chegou. Atende à campainha.
-  Poi Zé.
- Tá chorando por quê, donana?
-  Recebo os benefícios? INSS, fundo de garantia?
-  Hã? Olá!
-  Amanhã cedo, busco a carteira, patroa. Sem motivo, ora.
Deixe assinada na área.
Graça Rios

EU TIVE UM REVÓLVER (2)

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Terá razão o leitor ou leitora que estranhar o título deste artigo, o qual pressupõe a existência de outro texto. Mas vai perder tempo, caso decida procurar pelo original “Eu tive um revólver”. Fiz uma crônica com este título para o extinto Diário de Belo Horizonte, no fim dos anos 90, e duvido que alguém tenha exemplares dessa publicação editada por uma empresa constituída pelo jornal Balcão.
Um solícito funcionário do arquivo do Balcão pediu tempo para fazer a pesquisa e alguns minutos depois informou que não havia no setor exemplar nenhum do DBH. Acho que a experiência desse jornal foi tão amarga para os empresários que eles decidiram apagá-la da memória. A publicação teve existência curta – menos de um ano –, apesar de o projeto ser muito bom, destinado à cobertura dos fatos dentro da capital, valorizando sobretudo os temas gerais, educação, saúde, comportamento, mais economia e política abordadas de forma que até os leitores das camadas menos cultas pudessem entender.
A redação do Diário de Belo Horizonte era constituída por alguns veteranos jornalistas com passagem por outras publicações, rádio, TV, assessorias de comunicação ou agências de publicidade. Esse grupo, formado em sua maioria por grisalhos sonhadores, chefiava editorias nas quais predominavam jornalistas recém-formados, dispostos a mostrar serviço e sempre atentos à avaliação de seus trabalhos. Não havia espaço no jornal para o volume de matérias que os repórteres ofereciam no fim da tarde, e logo o DBH começou a dar alguns furos nos outros jornais da capital ou apresentar os assuntos por ângulos diferentes.
Parecia que o projeto ia dar certo, mas não deu por deficiência na captação de publicidade. Todos sabiam que a empresa não continuaria bancando por muito tempo os salários e os demais custos da produção do jornal, embora contasse com o trunfo da oficina própria.
Um pequeno grupo concordou em continuar trabalhando no DBH, em troca de recebimento ocasional de parte do salário até o dia em que a publicação foi suspensa. Depois os atrasados foram acertados por acordo ou na justiça. Contei essa história triste de mais um jornal que nasceu e morreu quase sem deixar vestígios porque me lembrei da crônica “Eu tive um revólver”. Ela foi publicada na fase terminal da publicação. Falava de uma arma que eu comprei para proteger minha casa, construída em meados da década de 70, numa rua deserta, sem asfalto e sem água encanada, do bairro Planalto. Uma noite, um marginal escondeu-se no matagal do lote vizinho e de lá atirou uma pedra na janela da sala para conferir se havia alguém na casa. Desistiu de seus planos porque as luzes foram acesas, mas é provável que ocorreria o pior se ele descobrisse que havia uma pessoa sozinha lá dentro. Por isso, comprei o revólver, um Rossi, calibre 22. Pequeno, mas pesado. Escolhi para o documento de posse da arma uma foto em que aparecia com o olhar sombrio e o bigode com as pontas retorcidas para baixo. Não era preciso dizer que eu estava disposto a reagir a qualquer tentativa de invasão da casa.
Felizmente, não foi preciso usar o revólver e eu me convenci de que seria perigoso manter aquela arma dentro de casa. Qualquer cidadão que nunca deu um tiro deve desconfiar de que suas chances diante de um marginal armado são mínimas. E sempre há o risco de uma criança descobrir o revólver no guarda-roupa.
Um policial gostou do revólver e o levou por preço justo. Escrevi sobre o alívio que senti ao vender a arma e para me redimir da péssima ideia de comprá-la.
Apoio a campanha de desarmamento da população, embora trema só de pensar que agora mesmo algum marginal esteja comprando uma arma muito mais poderosa que as utilizadas pelos nossos policiais. Eu queria escrever apenas sobre isso, mas acabei falando sobre um jornal que não existe mais e só ficou na memória de algumas pessoas. Para os ex-proprietários, a lembrança de um fiasco, por que só deu prejuízo. É claro que eles não consideram o papel que esse jornal teve na formação de tantos jovens jornalistas e na alegria dos velhos profissionais, como eu, que tiveram a oportunidade de se renovarem com essa convivência.
Ivani Cunha

MATAR OU CORRER

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ADVERTÊNCIA: Este texto pode ocasionar, como efeito colateral, náuseas e boca amarga. Sugestão de consumo: quando da leitura, ingerir, concomitantemente, uma bala jujuba (que poderá ser enviada, via e-mail, sem custos adicionais).
Amigos e conhecidos me orientam: - Escreva sobre acontecimentos e pessoas que lhe estão próximos, evitando falar de política.
Tento fazer isso, já que falar de política é quase como jogar conversa fora, produzir algo que logo será descartado (e que dificilmente irá despertar interesse dos leitores do futuro, aqueles que estão nas “nuvens”). Logo, não é meu interesse ser produtor de sucata.
No entanto, é preciso considerar que, vez por outra, terei que contrariar tal recomendação, dissertando justamente sobre esse tema proibido.
É o que acontece hoje, quando falo da tal “flexibilização do porte de armas”. Acho importante refletir sobre tal assunto porque ele traz no seu bojo uma série de armadilhas, contra as quais devemos nos precaver (ia escrever “precatar”, mas achei o termo um tanto quanto pedante).
É sabido que a “flexibilização da posse de armas de fogo” (eufemismo que quer dizer: - Liberou geral) é um decreto presidencial de 15/01/2019, uma das primeiras providências do governo Bolsonaro (não seria Bolonsaro?), mostrando que se tratava de uma de suas prioridades.
Assim que o decreto foi assinado, a ANIAM (Associação Nacional da Indústria de Armas e Munições) desta forma se manifestou: “Dentro das limitações do decreto, o presidente da República, Jair Bolsonaro, foi muito feliz nas medidas estabelecidas, cumprindo com o que foi prometido em sua campanha eleitoral”.
Querendo mais, algumas outras associações torceram a cara, julgaram pouco, pedindo não só a liberação da posse de arma como também o seu porte. No entanto, sabemos que tal pretensão só pode ser decidida pelo Congresso, com o presidente impedido de dar mais um chamegão com sua caneta BIC.
O decreto presidencial fixa algumas exigências para que pessoas com mais de 25 anos de idade possam fazer registro de até 4 (quatro) armas. Entre elas, está a de que o requerente disponha de cofre ou local com tranca, para dificultar o acesso por parte de crianças, adolescentes ou pessoas com deficiência mental (esta é uma exigência típica da qual a gente pode falar: - É coisa para inglês ver”).
Por esses dias, já tivemos uma prova de como isso é conversa fiada: - na manhã do domingo, dia 17/03, uma menina de 10 anos, em São Caetano do Sul, SP, pegou a arma do próprio pai, cometendo suicídio.
Outra balela do decreto presidencial: ele só vale para moradores de cidades em que os índices anuais de homicídios superem a taxa de 10 a cada 100 mil habitantes, ou seja, ele vale para 4 entre cada 5 brasileiros.
Como cereja para decorar esse bolo indecoroso, sua excelência disse: - Este decreto foi feito por muitas pessoas de bem para que o cidadão de bem tenha sua paz dentro de casa”.
Uma coisa que me incomoda nessa fala: eu me tenho como cidadão de bem e não acho que essa tal flexibilização irá me trazer paz, muito pelo contrário. Para corroborar esse pensamento, cito as palavras do coronel reformado José Vicente da Silva, da Polícia Militar de São Paulo, para quem o decreto vem aumentar os casos de homicídios e latrocínios em todo o país. Ele diz: - O acesso ás armas é um instrumento de morte. Arma de fogo não é instrumento de defesa para assustar. É um instrumento para matar. O instrumento de combate à violência é o trabalho policial”.
O que assusta em tudo isso é a forma irresponsável com que o destino de vidas humanas é decidido. Não estou falando de maneira hipotética, não! Os fatos, as mortes, estão aí acontecendo e irão acontecer muito mais, respaldados por uma propaganda eleitoral, onde os candidatos vitoriosos faziam pose como se estivessem atirando.
Frente ao massacre de Suzano, um senador da República pelo PSL de São Paulo, Major Olímpio, teve o desplante de dizer: “- Se tivesse um cidadão com arma regular dentro da escola, professor, servente, um policial militar aposentado, ele poderia ter minimizado o tamanho da tragédia”.
Tanto descalabro no trato com vidas humanas mostra que o Brasil, em vez de ser conhecido como República Federativa do Brasil, deveria se chamar República Federativa dos Caranguejos. Estamos andando para trás, para os tempos de faroeste. Pelo andar da carruagem, breve teremos como disciplina nos currículos escolares a prática de tiros, com direito a exemplos concretos de tiroteios envolvendo professores, funcionários e alunos.
Vai chegar o tempo também em que pastores tidos “evangélicos” (e que deveriam seguir e pregar o preceito bíblico de “não matar”) irão provar do veneno que recomendam para os outros: irão assistir a tiroteios dentro de suas próprias igrejas e templos. (Estou me referindo a pastores porque muitos deles se manifestaram em noticiários, declarando apoio ao decreto de flexibilização; padres, médiuns e pais-de-santo, caso pensem assim, da mesma forma terão o meu repúdio.)
No início do texto, chamei a atenção para as armadilhas que o tema acarreta, prometendo fornecer subsídios de defesa. Ei-los:
1) Como fica difícil fiscalizar as casas dos portadores de armas para ver se dispõem de cofres ou trancas, sugiro às autoridades o emprego de tornozeleiras eletrônicas nas referidas armas, a fim de monitorá-las, sem contudo obstruir-lhes o uso. As tornozeleiras poderão ser adquiridas junto aos procuradores da Lava Jato, eles que adoram esses artefatos e os têm de montão.
2) Caso algum Leiturino disponha de fundos de reserva ($$$), recomendo que faça deles uso, instalando uma fábrica de capacetes e coletes à prova de bala. Como estamos voltando à época do faroeste, o capacete poderá ter o formato de chapéu, para que tudo fique de acordo com o figurino do Velho Oeste.
3) Para aqueles que julgam que estamos chegando ao estágio de “matar ou morrer”, que já não é mais possível abrir mão do porte de arma, minha sugestão é no sentido de que adquiram jogos de videogame sobre o tema. Eles serão úteis, ensinando várias técnicas de tiro. Eu mesmo disponho de dois muito bons: “Red Dead Revolver” e “Call of Juarez Guslinger”. Quem quiser emprestado, é só me enviar o pedido.
JUSTIÇA ACIMA DE TODOS. VERDADE ACIMA DE TUDO
 Etelvaldo Vieira de Melo

A BELA DA TARDE

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Imagem: urbanarts.com.br

Não acho ajuste espácio-temporal normal canal legal nem para parar.
Então? O que venho aprontando?
EstudoInglêsnaUniversidadeescrevoumlivrorevendo outrosvisitoamigosvooàterapiamédicodentistacinemacoocafé dirigindotesesexecutosemdóalgumsambanoÓrgãoalmoçocomosnetosjogandopalitoslecionoPortuguêsFrancêsassistoàaulade Informáticacabelereiromanicurepilatesboutiques y otras cositas más. Em suma, vivo matutandoescrevinhandotraduzindo visitandoterapizandosarandocomendojogandosambandoensinandoaprendendocoandocomendosonhandoenfeitandotrabalhando

como fêmea burra.

Recentemente, apaixone i-me pelo irresistível Lord Stress. L’homme doux também caiu de amores por mim em tempo integral. Consequentemente, preciso urgente organizar as roupas do Temp(l)o para o
Casamento.

Se não, vejamos:
1.     Preciso  me lembrar de que  humano possui necessidades básicas do tipo.
                                                         (Se tal for real, a que horas, aonde, por quê?).

2.     Nunca jamais hei de novo dormir/acordar simultaneamente na mesma Bat-hora, conforme sói acontecer.
Deixarei de chegar, pois, correndo suando inventando maqueando junto ao mestre de língua estrangeira que estou atrasada porque me vi sonhando que passeava pelo éter em uma quick quick slow slow aeronave, voando num Malásia/ Dubai direto para a presente prova.

3.     Meus livros + outros serviços, noves fora zero. Bem, já discuti com o editor, ontem à meia-noite em um hotel quase honesto, tudo para que não se preocupe em me pagar até sua última função de livreiro. Razão: Ganhei anteontem na loteria. Caso dispense o trabalho fiel desta astronauta das Letras... Quem sabe, posso agarrar um emprego bombom neném no baby universo Pluto.

4.     Por fins $ afins, alugarei uma nuvem do Computador Colossus para dormir até o relógio se cansar de transar com Preguiça, a Deusa Eternal.

Aí, my loved boys and girls, talvez com certeza quiçá considerando, fique organizado o espaço/ horário da StarWoman no além (céu?), não El?
Graça Rios

EM BUSCA DE CONEXÃO

Sim, parece exagerado atribuir à corrida de rua o poder de melhorar a atuação de nossos cérebros, mas vale tentar. Outros benefícios ocorrerão com certeza.
Ivani Cunha





SEMEADORES DE BONDADE DE DE PAZ

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Para J.D. Vital
Os atores Marcos Nanini e Marieta Severo são tidos por seus colegas de profissão como pessoas extremamente generosas. Traduzindo o que entendo por isso: eles são cuidadosos com atores menos experientes, dando-lhes apoio e incentivo, sempre usam de palavras amigas mesmo quando fazem uma crítica.
Vivemos em um mundo tão hostil que chegamos a considerar que a felicidade do outro pode nos tirar pedaço. Daí, não desejarmos a felicidade de ninguém, especialmente daqueles que estão próximos da gente. O sucesso de um conhecido chega a nos provocar náuseas.
Assim, estamos lançando olhares de mau agouro para as pessoas próximas, torcendo por seu insucesso.
Sei que esse comportamento doentio é um efeito colateral do sistema capitalista. Ele, o Capitalismo, prega: nossa felicidade (ou seja, a posse de bens) depende também da infelicidade do outro (que não pode ter os bens que temos).
Outro aspecto relevante a ser considerado na composição do caráter do homem moderno, e que se constitui o reverso dessa medalha de busca da felicidade: trata-se de alguém carente de afeto e que, por isso mesmo, está sempre buscando uma afirmação.
Essa carência de afeto, via de regra, acaba se tornando algo doentio, um mal crônico, porque tal indivíduo raramente vai encontrar pessoas generosas que lhe dê a mão (vale enfatizar, o capitalismo é como a filosofia existencialista, onde o outro é o inimigo a ser derrotado e que, no mínimo, quer nos roubar o ar que tem que ser nosso). É nesse contexto que figuras como Marcos Nanini e Marieta Severo aparecem como honrosas exceções.
Se o outro me nega afeto, o que faço? Em vez de lhe dar afeto para torná-lo melhor, respondo na mesma moeda, buscando me afirmar, mostrando que não sou um qualquer, mas alguém cheio de competências e de posses.
É então que as pessoas se afastam de vez umas das outras e o diálogo morre, deixa de existir (dialogar é interagir, é troca de favores, ajuda mútua).
Você, arguto Leiturino, pode perguntar:
- Mas hoje não vivemos a era da comunicação e da interação através dos smartphones e das redes sociais?
Ledo engano, respondo. Se houvesse comunicação e interação entre as pessoas, o mundo estaria bem melhor do que está, sem essa onda de intolerância e de ódio a que assistimos atônitos, a se espalhar nas redes sociais. Exemplos mais recentes: australiano comete ataques em duas mesquitas na Nova Zelândia, que deixam 49 mortos e 58 feridos; aqui entre nós, em Suzano, dois ex-alunos invadem uma escola e matam 5 estudantes e 2 funcionários, antes de cometerem suicídio. (Alguém já observou que ZAP é o contrário de PAZ.)
Seguindo essa temática, devo ainda dizer que, perto de casa, na avenida principal do bairro, mora uma pessoa que, de terça a sábado, estando o tempo de acordo, invariavelmente fica sentado num banco em frente à sua casa (na segunda, ele reserva seu tempo para serviços internos e externos). Ele já é de certa idade e, sendo diabético, teve que amputar os dedos dos pés. Daí, anda com certa dificuldade.
Ter alguém disponível, com quem você pode “jogar conversa fora”, é bom demais, não é mesmo? Mesmo que seja para falar mal da vida dos outros. Ariano Suassuna diz que está aí um dos grandes prazeres da vida, esse de falar mal dos outros. Mas entenda: falar mal sem maldade, só para “desopilar o fígado”, amortizar um pouco sentimentos de inveja e de frustração. Enfim, algo inócuo.
Pois bem, esse vizinho (que estava me esquecendo de apresentar: Adelbrando) sempre tem alguém sentado perto dele, quase sendo preciso marcar com antecedência um horário para um bate-papo. Às vezes, passo pelo outro lado da avenida e o cumprimento. Ele responde, demonstrando satisfação. Muitas vezes, sou eu quem senta a seu lado para longas conversas.
Quando desando a falar mal de alguém, Adelbrando me olha com condescendência, não comenta nada, mas sinto que ele entende que estou fazendo aquilo não por maldade, mas por pobreza de caráter, pelo prazer de fofocar sem maiores consequências.
Se não bastassem tamanhas qualidades, esse vizinho amigo tem mais uma: quando quero desfazer de algo, vendendo por um preço módico, é ele quem faz a intermediação, já que conhece quase todo mundo. Assim, já consegui me desfazer de um tablet e de um aparelho celular. Por esses dias vou procurá-lo, para ver se sabe de alguém que queira adquirir quatro portas completas (novas) e mais uma pia de cozinha por R$1.000,00. Como brinde, estou oferecendo um vaso sanitário. Vou falar para o Adelbrando que ele pode repassar tudo por R$1.200,00, ficando com R$200,00 como comissão, caso queira – o que duvido, sendo ele uma pessoa muito correta.
(Como o negócio não foi efetivado, caso tenha algum interesse, Leiturino, pode se comunicar comigo. Estou aberto a negociações.) (Às vezes, escrevo coisas, mas depois fico morrendo de medo de ser levado a sério. Outras vezes, escrevo coisas, mas depois fico morrendo de medo de não ser levado a sério.)
Ao desfecho deste texto, faço referência a J.D. Vital, que, dia 19 de março, faz aniversário. Vital é uma pessoa extraordinária, que tem uma história de vida belíssima, é um amigo e tem um grande coração, sendo extremamente generoso.
Semanas atrás, numa das postagens do blog, reclamei das condições desfavoráveis que enfrentava na Internet. Recorri, então, à famosa compaixão de Dalai Lama para lançar a “Corrente da Generosidade, do Afeto e do Sucesso”. Usei o exemplo de uma modelo que exibia seu corpão e recebia em troca 18 milhões de seguidores (enquanto eu tenho um público em torno de 130 pessoas por semana). Observei:
 - Se eu for exibir meu corpão sarado no blog, aí é que ele vai afundar de vez.
A reportagem mereceu alguns comentários. Vital me enviou um, dizendo assim, veja se pode:
- Um striptease seu seria uma recompensa que atrairia mais leitores que as promessas do dalai-lama. Eu juro!
Todas essas lembranças de Marcos Nanini, Marieta Severo, Adelbrando e Vital nos mostram que ainda existem pessoas empenhadas em espalhar tolerância, empatia e generosidade. Em vez de prestar atenção nos intolerantes, naqueles que só se preocupam em agredir, atirar pedras, precisamos olhar para esses outros jardineiros, dar-lhes as mãos para que, juntos, espalhemos sementes de bondade e que irão colorir, embelezar a vida, transformando esse mundo em algo realmente humano para nós e nossos filhos.
Etelvaldo Vieira de Melo

    

MARIA JOANA

  

 Entre nuvens, vai a donzela

 (como se mouca).

 Molda orelhas

move franjas

                                                          morde bocas

 (como se louca).

 Entre névoas, esvai-se a estrela                                                                   
 (como se oca)

 Torce corpo

 troca pernas
                                                         
                                                   cheira muito                    
      (como se pouco).
                                                                              Graça Rios

                                                                                                                             

                

NOMES IMPRÓPRIOS

Assim como no samba do crioulo doido, os narradores de partida de futebol -- pelo rádio e pela TV -- não se contentam com o que todo mundo vê e, assim, atribuem a qualquer jogador um recurso, neste caso, exclusivo do goleiro.
Ivani Cunha

PADIM CIÇO

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Imagem: culinaria.culturamix.com
Quando jovem, morei com alguns colegas no que chamávamos “República”. Toda tarde, invariavelmente, éramos assaltados por uma “fome canina” (expressão do tempo em que cão levava vida de cachorro). O que fazíamos, na maioria das vezes, era nos reunir em torno do fogão da casa para preparar o que chamávamos de “Padim Ciço”: aquele famoso mexido, feito com sobras do almoço, misturadas com ovo.
 Talvez por causa da fome, aquela “gororoba”, feita com raspas das panelas, tinha um sabor especial. Quando íamos dormir depois, estávamos tomados por um sentimento de beatitude e paz.
Algo semelhante acontece comigo nos últimos anos, por causa do compromisso de produzir semanalmente um texto para publicação no blog. Como nem sempre disponho de um texto acabado, tenho que recorrer a fragmentos, raspas de produções passadas. Juntando alguma coisa daqui e outra dali, tento produzir algo que faça sentido. Se sinto que a liga não funcionou, o produto vai para a lixeira.
O texto de hoje é algo assim. Espero que goste desse “Padim Ciço”, que essa gororoba lhe desça bem. E que, depois, mais tarde, vá dormir tomado de sentimento de beatitude e de paz.
UM VIZINHO
A rua onde moro é pequena, só tem um quarteirão. Por isso, ali todo mundo conhece todo mundo. Sendo assim, sei que, a seis casas acima da minha, quase na esquina com a avenida principal do bairro, mora um senhor, sua esposa e um filho. (Havia também uma filha, mas ela casou e foi morar em outra cidade. O filho, já um rapaz, infelizmente padece de problema mental.)
Esse senhor, que vamos chamar de José Fatiota, trabalhou a vida toda com contabilidade. Está agora aposentado. Por isso, pode se dedicar a fazer coisas que lhe dão prazer, junto aos desprazeres que a idade e o tempo acarretam.
Assim, ele se dedica à música: aprendeu a tocar flauta e, nos últimos tempos, formou uma banda, junto com dois amigos, onde “ataca” de baterista.
Outro dia, indo fazer uma tradicional visita ao Sacolão Gigante (“gigante no tamanho, mas baixinho no preço”), tendo que me sujeitar ao tradicional cumprimento do baixinho seu dono (“como vai, patrão?”), passei em frente ao bar de um libanês, bar que fica na avenida, quase na esquina da rua de casa. Foi então que vi José Fatiota e seus dois parceiros se preparando para uma “música ao vivo”. Pensei com meus botões: - Na volta do sacolão, vou parar aqui um pouco para prestigiar o vizinho.
Quando voltei, fui sentar no banco de uma guarita de ônibus, quase em frente ao bar. O que ouvi, devo confessar, me deu “calo nos ouvidos”. Achei a banda bem fraquinha: o vocalista cantava parecendo ter engolido um prego, o guitarrista não entusiasmava, o repertório era pobre. Quem se salvava mesmo era José Fatiota, dando uns repiques na bateria, acordando de susto a plateia.
Depois de “ouvir” umas três músicas, rumei para casa com sentimento de frustração. Afinal, botava fé no Zé, achava que sua banda tivesse um pouco de qualidade.
Foi quando passei em frente ao portão de sua casa. Vi que seu filho estava junto ao muro, cantando e dançando feliz, embalado pela música que ali chegava bem límpida.
Eu, que já pensava em espalhar aos quatro ventos a ruindade da banda de José Fatiota, engoli em seco e pensei:
- Nunca devemos considerar que nossos juízos possam ser absolutamente certos. Afinal, a beleza das coisas está nos olhos de quem vê (ou nas “zorelhas” de quem escuta).
Etelvaldo Vieira de Melo